Mandaria o bom senso que, depois de tantos e tantos arranques entusiasmantes, os Sportinguistas refreassem o seu estado de alma. Impossível, pelo menos para todos aqueles que vivem o futebol como ele deve ser vivido: uma coisa de gaiatos(as), que insiste em deixar-nos fora de nós ao longo de uma vida. Felizmente, pese tudo o que se vai fazendo nos bastidores para alterar este lado genuíno da bola, a maioria dos adeptos leoninos continua a borrifar-se no bom senso e fez questão de demonstrá-lo colocando cerca de 40 mil vozes nas bancadas para receber a sua equipa.

Lá em baixo, na relva que continua a ser um espinho encravado na pata de qualquer Leão, essa equipa apresentou-se e fez questão de regressar a Alvalade com uma exibição capaz de deixar a sonhar os mais exigentes. Claro que ainda há muito a afinar, mas, caraças, se ao fim de um mês de trabalho já há tanto pormenor que nos deixa de água na boca, é impossível não imaginar que algo de bom está guardado para este grupo de trabalho. E trabalho foi máxima seguida por todos os jogadores utilizados. Ver-nos a pressionar alto uma equipa como a Roma, experiente e habituada a defender para melhor atacar, já é motivo para um gajo sorrir; ver-nos a fazê-lo e sendo capazes de manietar os italianos ao longo de praticamente todo o jogo, é motivo para sorrir muito.

De quando em vez é impossível um gajo não desviar o olhar para a linha, onde Jorge Jesus não escolhe nomes na hora de dar puxões de orelhas, numa espécie de busca pela perfeição que é impossível não passar para dentro de campo. Os extremos respondem de pronto procurando, invariavelmente, o jogo interior e deixando os corredores laterais abertos para as subidas de Jefferson e de João Pereira. O brasileiro parece peixe na água, face a este sistema, e até dou por mim a imaginar que um César Prates, na banda contrária, seria um menino feliz com tal convite a jogar em profundidade. Mas João Pereira e Esgaio saberão crescer nesta exigência que se estende a toda a equipa. Se os extremos cortam para dentro, os médios centro têm que ser capazes de perceber todo o jogo. A tal dinâmica. Queremos bola e queremos ser nós a decidir o que fazer com ela. E, sem ela, todos se movem num bailado táctico ao qual ninguém se esquiva. Se Slimani tiver que ir à linha centrar, vai. Se um dos avançados tiver que passar um jogo inteiro a colocar bombas entre o médio defensivo e os centrais adversários, passa. E se tivermos que passar 90 minutos a insistir, passamos.

Foi mais ou menos o que aconteceu, sendo que, felizmente e justamente, não foi preciso esperar tanto tempo para ver o marcador funcionar. Já com Mané em campo, entrado para o lugar de Ruiz ao intervalo (boas indicações ao fim de três ou quatro dias de trabalho), a equipa ganhou velocidade e irreverência. Aquele arranque da esquerda para o centro, colocando, depois, Slimani na cara do guarda-redes, é jogada que merece ser revista muitas e muitas vezes e que deixa no ar a ideia de que o crescimento do 36 poderá estar a atingir ponto de rebuçado. Depois veio Montero, para mim merecedor do lugar ao lado do argelino, num troca de colombianos que deu à equipa maior elasticidade e velocidade de pensamento entre linhas adversárias. E o golo, numa bela cabeçada de Slimani, a que se poderia ter seguido o segundo, desta feita numa cabeçada de Fredy. O colombiano não marcou, mas meteu na velocidade de Carrillo; o extremo lançou o pânico no coração da área e, num remate de ressaca, Mané acabou com as dúvidas quanto ao vencedor do jogo.

Tempo de substituições, tempo de um Sporting ainda mais jovem e ainda mais assente na formação (foi você que pediu um belfodil?). Paulo Oliveira já não tinha Naldo ao lado (que grande lambada deu o brasileiro nos abutres de serviço), mas tinha Tobias. Semedo fazia pela vida na posição seis, acompanhado por um Wallyson que será a sombra de Adrien. E Gelson, o pequeno Gelson, entrado em campo como se o campo fosse dele e mostrando ao mundo a marca que fez de jogadores como Cristiano ou Nani ídolos de milhões. E aposto que, já mais calmo, Jesus pensaria para consigo que é do caraças poder optar entre o lado adulto de um Ruiz e a agitação destemida de jogadores como Mané ou Gelson, sem esquecer as capacidades únicas de Carrillo. Opções, muitas. E boas. E ainda falta William Carvalho, que dará a esta equipa uma dimensão extra.

É… mandaria o bom senso que, depois de tantos e tantos arranques entusiasmantes, os Sportinguistas refreassem o seu estado de alma. Que se lixe o bom senso! Este Leão cresce de semana para semana e os nossos sorrisos são cada vez mais rasgados! É mau? Mau é só voltar a ter Sporting no dia 9 e não acreditar que estamos a dar os primeiros passos para o regresso às grandes conquistas!