Leio e ouço tanta boca imunda e mente com agenda a falar do “caso Carrillo” que não posso deixar de mandar a “minha” posta sobre o assunto, até porque o caso já chegou a tal estado de putrefação que me sinto, digamos, autorizado a fazê-lo.

Ora, meus caros amigos (e não me estou a referir às tais bocas imundas) o caso Carrillo não nasce com a aproximação do fim do contrato do rapaz peruano. Não…a coisa vem de muito mais longe. Assim que BdC toma posse e ao ver o espartilho de percentagens de passes dos jogadores do plantel de futebol profissional, primeiro deve ter jogado as mãos à cabeça, depois deve ter tomado um calmante e só uns dias depois deve ter tido coragem para olhar (sem taquicárdias) para o problema. Pouco era do Sporting e a parte que nos pertencia não era propriamente o sumo da coisa. Os bons jogadores, os promissores, as vedetas estavam bastante “hipotecadas” nomeadamente a fundos e a empresas de gestão de carreira (ou seja aos seus empresários). Podia-se mesmo dizer que o Sporting jogava com uma equipa “emprestada” por terceiros.

BdC e direcção acharam por bem tentar inverter esta tendência, devolvendo o que fosse possível ao clube e travando a fundo a ascensão de poder dos tais terceiros junto da equipa profissional. O verniz com os fundos estalaria com Rojo, o dos empresários iria pelo mesmo caminho com Bruma e Ilori. Foram 2 pontos fracturantes, sobretudo pela exposição pública e política que o clube fez nas suas tomadas de posição. O Sporting tinha definido uma linha, e do lado oposto ao seu colocaria todos os que impediam a autonomia e independência de gerir a equipa, segundo os seus próprios interesses. Isso soou a “guerra” aos ouvidos de muitos dos poderosos “traficantes” de jogadores, de muitos dos que tinham (e vão tendo cada vez mais) os bolsos cheios das “comendas” dos senhores Zahavis, Canyons e afins.

Contam-se pelos dedos de uma pata de camelo os casos de renovações sensatas e atempadas de jogadores do Sporting com algum peso na equipa. A verdade é que a factura da “guerra” iria chegar e todos, repito…todos sabíamos que mais tarde ou mais cedo a vontade dos empresários em “dar uma lição” a BdC acabariam por provocar um desfecho bastante semelhante ao que acontece agora com Carrillo. Aposto que a Direcção do Sporting também teria tido esta consciência e acredito profundamente que tenha fechado os olhos muitas vezes ao sentar-se na mesa de negociações…engolindo o orgulho a bem do interesse da equipa e da importância de Carrillo nos esquemas de Marco Silva ou Jorge Jesus. Em vão o fez e se é verdade que o peruano não tem um contrato ao nível de muitas das figuras secundárias do plantel…isso sucede precisamente porque foi do interesse de Zahavi e empresário. Imagino a quantidade de dinheiro paralelo que deve ter sido “oferecida ao jogador” como compensação da “avareza” do Sporting. Infelizmente são “truques velhos” que ainda resultam, gestos que ficaram célebres na agiota relação entre os Dons e os camponeses sicilianos.

Imaginem que são um bandalho (relax…é só um roleplay) da pior espécie. Têm 50% do passe de um jovem jogador titular de uma boa equipa europeia, aqui e ali também titular da selecção do seu país. Detalhe importante, estão a cagar para a vontade do jogador. Decidiriam apoiar uma renovação? Uma venda onde 50% do valor iria para os cofres do clube. Ou fariam tudo por tudo para deixar o contrato expirar, podendo depois lucrar 100% de uma transferência onde nem clube nem jogador vão cheirar a fatia mais grossa (e mais secreta) do bolo? Eu não tenho dúvidas nenhumas e dá-me vontade de rir quando alguém opina que a “vontade do jogador” pode ter um papel a desempenhar neste processo. Mas qual “vontade”? A que preferiu um contrato menor durante 5 anos? A que nunca abriu a boca livremente e de forma assertiva para dizer que queria ficar no Sporting? Juras de amor de jogadores no twitter ou facebook valem zero no meu  medidor de sportinguismo. E arrisco dizer mais, Carrillo e família já tem a cabeça feita para o que está a acontecer há mais de 2 anos. É esta colaboração estreita com os “papás” empresários, usando o clube apenas para seu benefício e cumprindo o papel que lhe foi desenhado à risca que me leva a dizer que…o Sporting tem pouco a ganhar com “escravos” como Carrillo e muito menos com traficantes como Zahavi. Enquanto BdC não baixar as calças para reatar a antiga relação de estupro continuado…o Sporting não vai ter vida fácil com nenhum jogador que pertença à mafiosa elite de “manda-chuvas” do mercado de jogadores mundiais.

Na verdade gostaria de dizer que um dia esta batalha será ganha. Mas acredito tanto nisso como acredito que os corruptos vão ser presos e os ladrões apanhados. Não tenho nem um pingo de fé na governância e justiça do futebol. A FIFA e UEFA são cada vez mais “assembleias de equilíbrio” que fecham os olhos como podem à destruição da base do futebol – a isenção e o equilíbrio. Hoje em dia cria-se um clube gigante em 2 épocas e arruinam-se emblemas históricos ainda mais depressa. Os clubes que apoiam e apadrinham as fortunas fáceis vencem mais jogos, os opositores vão perdendo, ruindo e calando a indignação. O Sporting felizmente está no lado mais justo, mais nobre e mais honesto da questão e isso será sempre imperdoável. Os políticos sabem-no, os jornalistas sabem-no, a polícia sabe-o e os adeptos de outras cores “brincam” com a moralidade e assobiam para o lado, como se não tivessem a perfeita consciência que estão completamente coniventes com o estouro monumental que o futebol dará daqui a algumas épocas. Sim…esta bolha de mafias um dia já não terá o suficiente. Neste ano, apenas a subida dos contratos televisivos ingleses animou o mercado…e contrariou a tendência de quebra de volume de transferências. Os clubes têm cada vez menos dinheiro para gastar, as TVs estão cada vez mais desconfiadas da mais valia do futebol e só a intervenção do poder político facilitou novos contratos milionários em muitos países. Aliás, deve merecer reflexão que tantos emblemas europeus não tenham encontrado marca patrocinadora para as suas camisolas. Sporting, Porto e Braga em Portugal são só um exemplo.

Mas voltando ao “caso” em questão, a estratégia dos “donos” do jogador é agora o estímulo ao conflito. Na pessoa de BdC encontram um alvo fácil para mobilizar a opinião pública dos adeptos adversários. Já são múltiplas as declarações a jornais que apontam a sugestão de BdC como o “impedidor” da renovação. Ainda bem que ao contrários de muitos outros adeptos, os sportinguistas não comem gelados com a testa. BdC será, só, o mais interessado na renovação de Carrillo…porque ao contrário de outros presidentes, este, quer o que todos os adeptos do Sporting desejam: o crescimento do clube e não o alargamento dos bolsos dos parasitas do futebol. Colocando o presidente do Sporting contra o jogador (até arrastando os restantes atletas para o mesmo fictício conflito) os Zahavis garantem uma fonte interminável de interesse jornalístico, quiçá convencem até o jogador desse mesmo cenário. E aqui meus amigos reside o centro de toda a questão – a profunda incapacidade de um ser humano para gerir a sua liberdade. Carrillo terá mais dinheiro que eu e vocês todos juntos…mas essa riqueza vem com um contrato associado. Não faz, diz ou vai para onde quer, mas sim para onde lhe mandam. É discutível se qualquer um de nós não terá “amarras” semelhantes, mas há uma ligeira diferença…a nossa “carreira” apenas nos beneficia a nós ou ao nosso empregador (se este existir)…não engorda contas de terceiros. Aqui reside o panorama de todo um novo sentido de escravidão. Um panorama que as federações internacionais ou nacionais fazem gosto em atacar pela superfície, proibindo apenas a divisão de passes com terceiros (TPOs), gesto etéreo sabendo que os empresários já controlam os clubes.

Não sei se já deu para entender, mas tenho 0% de esperança numa boa resolução para o Sporting do processo de Carrillo. Não adivinho o futuro, mas consigo ler levemente o passado e tenho uns vagos vislumbres do presente. E tudo me dá a entender que serão os amigos de Zahavi que levarão Carrillo e que este terá zero % de peso na decisão do clube futuro. O sportinguismo do peruano é completamente irrelevante e o jogador vestirá com “amor incondicional” a camisola do porto ou benfica, estimulando uma facada feroz nos adeptos leoninos, que por entre assobios e impaciência, também souberam adorar, vibrar, estimular e compreender o “soneca” sul-americano. Não tenho dúvidas que estaremos próximos do Futre da mais recente geração e do Moutinho da anterior. Não sou hipócrita, dói que se farta e faz-nos acreditar um pouco menos na capacidade de gerir o que é nosso em nosso proveito. Faz-nos acima de tudo desconfiar de quem idolatramos. Carrillo acelerará uma profunda reflexão no espaço leonino sobre o que permite que os nossos símbolos sejam desviados com tanta facilidade para os nossos rivais. Muito do que está aqui escrito será debatido e existem soluções que podem ser adoptadas pelo clube para minorar casos futuros. Mas interessa que o clube saiba antecipar a implementação destas soluções…antes que o debate caia na rua, ou pior, em painéis de debate que mais não desejam que escancarar as feridas abertas. A intelligentia leonina deve ser posta a carburar, pois imaginar que isto é só um caso, uma coincidência de factos e personalidades…só levará à sua repetição constante. E eu não quero ter vontade de insultar um jogador sob contrato do meu clube ou ver uma criança a chorar por ver o seu ídolo com a camisola de um rival. O nosso orgulho também passa pelos jogadores. O nosso amor também abrange os atletas. A nossa fé também tem a sua santeira oficial. “Idolos zero” é apenas mais uma relativização absoluta que vai contra a forma do ser humano (gregário e profundamente hierarquizado) se estruturar socialmente.

 

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca