Sei que hoje é o dia que muitos e muitas de nós ainda reflectimos nas eleições, ainda nos deleitamos com a vitória de Domingo ou simplesmente rimos do combate de boxe que o nosso Presidente ontem venceu. Mas existe sempre tempo de pensar nas pequenas lutas que o futebol ainda vai travando, para além da corrupção, dos fundos e dos problemas de financiamento dos clubes.

Com tanta agitação no nosso país, tive oportunidade ler a declaração de Eva Carneiro, antiga responsável do Departamento Médico do Chelsea, sobre os mais recentes acontecimentos em torno da sua carreira. Dizia Eva que em alguns jogos da época passada, enquanto assistia os seus jogadores, ouvia cânticos sexistas vindos da bancada, dando a entender que a médica, para além de uma profissional, faria também outros “favores” aos homens que compunham o plantel blue. Eva acha estranho que a FA apenas agora, depois de uma polémica com José Mourinho, a venha defender em público, quando sofre de sexismo em todos os campos de futebol há muitos anos.

Na notícia onde constava toda esta informação, dei-me ao trabalho de ir ler os comentários que o jornal online tão gentilmente aprovou. Apenas homens comentavam e faziam piadas como: “anda cá que eu mostro-te as injustiças” ; “devias tratar os jogadores do Chelsea devias” e ainda “ela de certeza que rodava todos”.

Sabemos que o futebol é um mundo de homens, e que Eva Carneiro é apenas uma pequena agulha num palheiro de histórias de descriminação em torno deste desporto, mas é um assunto que continua a preocupar em pleno século XXI.
Não são só as faltas de oportunidades dentro dos clubes, como dirigente ou jogadora, mas também no jornalismo desportivo e nos órgãos que gerem o futebol. Quando um jornalista desportivo comete um erro, insulta-se o seu carácter, quando é uma mulher o primeiro insulto é uma insinuação sexual. Felizmente, são algumas as mulheres em Portugal que continuam o seu trabalho no mundo do futebol , com uma seriedade invejável e com um trabalho de fundo respeitável. A elas não se dá margem para falhar, para ser apanhadas em trocas de favores com clubes ou que se atrevam não ser o máximo de isentas.

As escolas de formação não pensam no futebol feminino, as escolas de treinadores não tentam cativar treinadoras, o dirigismo em Portugal e na Europa está entregue a homens de gravata que não conseguem resolver os problemas da forma eficaz que todos gostaríamos. E com isto não pretendo afirmar que uma mulher à frente da FIFA tudo estaria maravilhoso, simplesmente considero que deveria existir uma maior abertura desse e outros organismos.

Nesse sentido, gostaria de ver o Sporting associado a uma mudança de paradigma no nosso futebol. Seja o nosso clube a criar escalões jovens para raparigas, sejamos nós a convidar mais mulheres jornalistas a estar presentes nos nossos congressos e iniciativas. Estabeleçam-se quotas de presenças femininas nas estruturas dos clubes profissionais, formem-se agentes internacionais para acompanhar jogadores e preencham-se os paineis de comentário com mais mulheres/adeptas.
Em pleno ano de 2015, situações como as de Eva Carneiro continuam a explodir um pouco por todo o mundo e só não existem mais, porque o mundo do futebol está fechado para todas nós.

No café ainda se espantam quando uma mulher discute futebol, ainda iniciam uma conversa supondo que uma rapariga prefere os jogadores pelo seu nível de beleza ou que simplesmente não liga a bola. Isso mudou há muito, mas apenas o futebol parece não ter notado. Até quando?

*às terças, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa