Creio que nunca escrevi um texto sobre Carrillo. Pois bem, nem é tarde nem é cedo, vai ser agora.

A alcunha de Carrillo é “La Culebra”, a serpente. Suponho que a alcunha tenha sido atribuída com base no seu estilo de jogo. O que, provaelmente, o criador dessa alcunha não sabia é o quão acertada ela era também em relação ao seu carácter. Antes de mais, deixo já clara uma coisa: Eu não estou minimamente chateado por perder o peruano para o Carnide. E estou a ser absolutamente honesto. O resto do texto será a explicação disso.

Sobre a novela da sua renovação, já todos sabemos mais ou menos o que se passou um função do comunicado emitido pelo clube. De forma resumida, o Sporting tentou, a certa altura até conseguiu chegar a acordo com o jogador, inclusivamente até o treinador interviu, mas o jogador não quis continuar no Sporting. O que para mim importa reter é que o Sporting fez tudo o que lhe era possível para renovar (seja no dinheiro posto em cima da mesa, seja na importância desportiva que lhe deu para o futuro ao meter o treinador ao barulho). Agora, se no meio existiram conflitos, se o Casareto não vai à bola com a voz de bagaço de BdC, se o Presidente não grama agentes carecas, se a coisa foi discutida aos gritos ou se andaram todos de mãos dadas a cantar o Kumbaya, na minha opinião, é irrelevante. O que estava em questão eram duas coisas: primeiro, um pré-acordo feito antes de Janeiro (o que configura uma ilegalidade) e, segundo, a incapacidade financeira do Sporting em suplantar esse pré-acordo. Ou seja, aquilo que nos falta a todos, incluindo o Sporting: o vil metal.

Também não vou mandar o Casareto para o buraco de onde saíu quando nasceu. Ele queria mamar a sua parte e, aparentemente, conseguiu. E também nem vou fazer o mesmo com o jogador. Quis ganhar mais, e foi para onde lhe deram mais. Que sejam os dois felizes, excepto em tudo o que vá contra os objectivos do Sporting. Everything is cool!

E, para que não me acusem de estar a mentir ou a querer branquear alguma coisa, digo já aquilo que achava do jogador: Talento enorme, potencial ilimitado. Tinha tudo para se tornar no melhor jogador do Sporting, sobretudo com um treinador como Jesus. Então, porque raio não estou chateado? Por várias razões. E é aqui que mando a emoção e os sentimentos para o galheiro (pelo menos em parte) e prefiro analisar a questão com racionalidade.

Começo pela questão financeira, que é dividida em duas partes: Primeiro, quanto nos custaria manter o jogador. E segundo, quanto poderíamos ganhar com ele no futuro. Sobre os custos de renovação, hoje já sabemos quanto vai ganhar no Carnide. Para apenas igualar a oferta do rival, o Sporting teria de pagar 4M/ano brutos (não incluo os custos de intermediação). Sabem qual o jogador que ganha esse valor no Sporting? Esse mesmo, ninguém! Sabem quanto ganha o jogador mais bem pago do clube? Não sei ao certo mas anda à volta de metade desse valor. Sabem qual é o único activo do clube que ganha perto disso? O treinador. Portanto, em termos de política salarial, renovar com Carrillo significaria mandar para as urtigas toda uma estratégia salarial previamente definida. É verdade que fizemo-lo com o treinador, mas ao menos esse era um bicampeão com um currículo recheado e, unanimente, considerado um dos melhores treinador a nível mundial. Depois, quanto ganharíamos com ele numa futura transferência? Bom, a não ser que alguém perdesse a cabeça e oferecesse acima de 40M pela totalidade do seu passe, diria que estávamos destinados a ganhar, no máximo, cerca de 15M pelos nossos 50%, partindo do princípio que não seria difícil encontrar um clube que desse 30M pelo passe completo. Ou seja, fazendo dele o maior da nossa aldeia (seja desportivamente ou financeiramente) estávamos destinados a ganhar mais ou menos o mesmo que ganhámos com…CR7 com 17 aninhos de idade e acabadinho de sair do forno. E se não o vendessemos ao final de uma época, os tais 4M/ano teriam de ser descontados dos tais 15M referente à nossa fatia do negócio. E no ano seguinte, já seriam 8M, assim sucessivamente até ele sair. Ou seja, para ganharmos o máximo possível com Carrillo teríamos de renovar já oferecendo 4M/ano e vendê-lo no final deste ano por um mínimo de 30M dos quais só veríamos a cor de metade! Foda-se! Grande investimento! Mais valia jogar o Euromilhões…

A seguir, quero analisar aquilo que eu chamo de custo de oportunidade. A não renovação de Carrillo e o seu afastamento permitiu a estabilização de João Mário como titular indiscutível, de Gelson como primeira alternativa e Matheus como jogador definitivamente do plantel principal. Se Carrillo renovasse e continuasse a jogar, João Mário seria, no máximo, ou o seu substituto ou o substituto de Adrien e não teria a evolução fantástica que está a ter e que faz dele um dos melhores jogadores da equipa. Por sua vez, Gelson acabaria por ter o papel que Matheus está a ter, jogando apenas nas sobras em detrimento de ser uma das nossas armas mais utilizadas vindas do banco. E, o coitado do Matheus, estaria a definhar na B. É tudo uma questão de oportunidade. Este é um caso onde o azar de um é a sorte de outros. Sobretudo de João Mário. E destes temos o passe completo, ou a maioria dele. Financeiramente, faz mais sentido apostar em JM do que em Carrillo. Ganha menos (e muito menos depois da eventual renovação do peruano), tem um talento em nada inferior e podemos lucrar mais com uma transferência no futuro. Como diria Jesus: “É good bisnéssing!

Por outro lado, há o equilíbrio salarial dentro do plantel e relação de meritocracia/salário que se exige em qualquer organização. Se ao Carrillo, que em 5 épocas fez apenas uma decente, lhe fosse dado aquilo que nunca nenhum jogador recebeu no Sporting, o que diria William? Diria: “Eh, lá! Calminha aí que aquilo que o Carrillo fez no ano passado também eu já fiz no meu ano de estreia com Jardim! Onde estão os meus 4M?” O que diria o Rui Patrício? Diria: “Foda-se! Então ando aqui eu anos e anos a safar a equipa e a meter Taças de Portugal no museu e não há cheta para mim? Onde estão os meus 4M?” O que diria o Adrien? Diria: “O quê? Ando aqui eu a segurar o meio campo há 3 anos, sou capitão e o jogador mais regular do clube e para mim não cai nada? Onde estão os meus 4M? O que diria João Mário? Diria: “E o que eu estou a fazer este ano? Não conta para nada? Onde estão os meus 4M? O que diria Slimani? Diria: “أنا هداف . أين هي بلدي أربعة ملايين ” Pois é. Digam o que disserem mas oferecer 4M/ano ao peruano seria um dos piores actos de gestão do clube não só pelo seu valor actual como pelas repercussões que poderia ter na negociação de futuros contratos. Estariamos, potencialmente, entre duas situações: ou voltávamos aos bons velhos tempos do Godinho onde gastávamos 50M/ano com pessoal ou, na incapacidade de oferecer valores semelhantes a outros jogadores importantes, seria uma autêntica debandada de jogadores de Alvalade. Mas desta vez, a debandada seria dos capitães e jogadores que nos são muito queridos. Eis como uma simples decisão de renovar com um jogador poderia ser o catalizador de uma situação muito, muito complicada. O equilíbrio de um plantel faz-se com a perfeita noção e aceitação de que os melhores jogadores ganham mais. E, por mais que me queiram convencer, Carrillo não era o nosso melhor jogador. Foi, durante uma temporada, tal como foi William. O valor real de um jogador vê-se na sua regularidade e consistência. Nesse sentido, para mim os melhores jogadores são: Rui Patrício, Adrien e Slimani. Porque são aqueles que, durante o maior período de tempo, mantiveram o seu rendimento sempre constante num nível alto. E logo a seguir é que vem o William, João Mário e Carrillo. O melhor jogador do plantel não tem, necessariamente, de ser o jogador mais valioso ou mesmo o mais talentoso. Mas tem de ser o mais influente, aquele cuja ausência representaria um rude golpe nas aspirações do clube. Ora, esta temporada está a provar o que escrevi acima. Carrillo, sendo o nosso jogador mais valioso, não é o nosso melhor jogador. E por isso, nunca na vida mereceria ser o mais bem pago. Tão simples como isto.

Por último, há a mensagem que se envia. Se no fim deste imbróglio todo o peruano saísse por cima a rir-se com 4M, seria a validação de que chantagear o clube compensa. E não seria preciso esperar muito tempo para ver outros a fazer o mesmo. Não façamos confusões, a qualquer momento, qualquer jogador do Sporting pode receber uma chamada de um Orelhas ou de um Bufas a prometer milhões. O que ele faz a seguir é o que define o perfil de jogador que queremos para o Sporting.

Agora, se me perguntarem se gostava que ele renovasse eu respondo um rotundo sim! Mas não a qualquer preço. Se me disserem que era possível renovar há 2 anos atrás e continuar a ter um grande talento a um custo aceitável, eu digo talvez. Se me disserem que a direcção terá sido incompetente, até posso aceitar. Mas, por favor, não façamos do Carrillo uma virgem imaculada que foi injustiçada pelo ditador coreano. As palmas batem-se com duas mãos. Infelizmente, quando se trata de renovar com jogadores eles continuam a ter a faca e o queijo na mão. É uma relação de forças absolutamente desigual e vai continuar a ser enquanto não existirem regras claras sobre intermediação.

Portanto, a minha solução é bem simples: Que se pegue nos 4M que se ia dar ao Carrillo e divida-se irmãmente entre: Rui Patrício, William, Adrien e João Mário. Eles é que são o presente e o futuro do clube e são estes que temos de acarinhar. Quanto aos chulos, de quando em vez aparecem sempre uns. E falando em chulos, com a saída do Carrillo é oficial:

JÁ NOS LIVRÁMOS DE TODO O ENTULHO DO GODINHO!

* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!