Muitos perguntarão por estes dias “será que o meu clube está metido nisto?”. Não sou vidente, mas consigo responder facilmente a esta. Sim. Em Portugal parafraseando Paulo Fonseca “não há anjinhos”. Todos fazem tudo, a todos. Há muitos anos que se sabe (mesmo para um gajo como eu que está de fora, bem de fora) o quanto se pratica o vale tudo na tentativa de levar vantagem para os jogos mesmo antes de entrar nas 4 linhas. É certo que as formas de coacção, trocas de favores, aliciamento ou favorecimento estão mais refinadas, mas por mais requintados que sejam os métodos, a verdade é que o futebol em Portugal ainda é terreno para os chicos-espertos e pouco recomendável para as almas impolutas que se retraem na hora de meter a mão na imundice.

A minha dúvida não é “se” é praticado o jogo da mala, mas sim há quantos jogos nesta edição Liga é que começou a ser praticado. A minha dúvida não é “quem” o está a praticar (estão todos) mas talvez “quem começou primeiro”. E sim, acho que é vergonhoso que se implemente este tipo de “incentivos”, sim…também acho que corrompe a verdade desportiva e…sim acho que quem opta por este tipo de intervenção deveria sofrer pesadas consequências (perda de pontos, castigos exemplares aos dirigentes, descida de divisão, etc). Mas chegados aqui batemos de frente no problema essencial do futebol português: quem dá o primeiro passo? Quem se atreverá a dizer “eu estou disposto a prejudicar o meu clube rejeitando este tipo de métodos, mesmo que saiba que vou ser gravemente prejudicado”? Quem porá a sua cabeça de dirigente (que dependem de resultados como qualquer agente no futebol) no cepo, para um bem comum, sabendo que provavelmente será um gesto inglório e destinado ao fracasso?

A questão do “jogo da mala” como de todos os outros “joguinhos” que apodrecem o nosso desporto-rei é que para que acabem terá de mudar não uma ou duas coisas, não uma ou duas pessoas, mas…tudo. Tudo e todos teriam de ser mudados. O calendário de provas, os modelos competitivos, o número de clubes em cada escalão, as regras para contratação e uso de jogadores estrangeiros, o estatuto de equipa profissional, o modelo de tributação dos profissionais de futebol, a deteção e desenvolvimentos dos árbitros, o estatuto de profissionalização dos árbitros, a transparência da escolha e relatórios dos observadores, as regras para o financiamento das SADs, a responsabilização dos dirigentes das SADs, os limites para o endividamento das SADs, enfim…podia apontar mais 30 áreas onde o nosso futebol está na pré-história, mas (como já ouço desde miúdo) “tudo vai demorar uma eternidade” até ser feito. A razão é clara, numa organização de excelência, num modelo de eficiência, num desenho que promova o mérito e não os “esquemas”…não há dinheiro a ganhar pela porta pequena, não há “prémios” paralelos e o caciquismo (pedra de toque do poder em Portugal) tende a dar lugar ao rigor e transparência…com perdas claras para os “amigos e familiares” da maioria dos dirigentes do futebol português.

Gosto que o Sporting seja bandeira de mudanças estruturais no futebol português, mas não sou hipócrita ao ponto de dizer que acho que BdC deva submeter o Sporting ao erro de se atirar para as “chamas” da virtude, sem que isso traga alguma coisa de bom a médio ou a longo prazo. Para todos os que correm a levantar a bandeira da “imaculada brancura” relembro que estamos em Portugal e que os nossos rivais são Luis Filipe Vieira e Pinto da Costa. Querer limpar merda com fitinhas de seda é capaz de ser complicado. Se alguém tiver ideias geniais que se chegue à frente, eu já perdi a esperança de isolar o meu clube numa redoma de virtude. As “redomas” encaixam-nos no 3º lugar, causam orçamentos deficitários, afastam os adeptos do estádio de Alvalade e sobretudo não provam absolutamente nada a ninguém. A mudança devia ser feita, mas como? Contamos com quem para mudar? Como se eliminam hábitos de décadas e esquemas que atravessa gerações? Olhamos para outros países e podemos até reparar que em assuntos estruturais os Governos obrigaram os clubes a mudar, mas mais uma vez…estamos em Portugal e contar com os políticos para trazer virtudes a alguma coisa coisa é como chamar um alcoólatra para gerir uma adega.

Meus caros, isto não está fácil. Especialmente para quem quer fazer “o bem”, “o certo”…o futebol português é ingrato e os adeptos são dos mais ingratos de todos. Com a mesma mão que pedem títulos acenam negativamente aos “jogos das malas”. Infelizmente uma e outra coisa andam, por excesso, de mãos bem dadas. Repito o desafio: como mudar?

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca