26 de Outubro de 2013. O Sporting, então treinado por Leonardo Jardim, prepara uma visita ao Dragão de onde sairia derrotado por 3-1. Os adeptos leoninos reconhecem que o jogo foi perdido em pormenores (o penalti parvo de Maurício, o segundo golo sofrido assim que se conseguiu o empate), muitos deles fruto na inexperiência de uma equipa em formação. Há um sentimento de frustração, mas há a crença de que o futuro tem tudo para ser verde e branco, nomeadamente nestes jogos grandes, algo que viria a comprovar-se daí para a frente.

26 de Outubro de 2013. Esta foi, também, a data em que mudávamos de casa. O Cacifo dava lugar à Tasca e na caixa de comentários surgiam frases como «O novo ponto de encontro de velhos conhecidos!». Passaram três anos e ao longo destes três anos de vida a que se juntam outros cinco celebrados no Cacifo, a Tasca foi e continua a ser precisamente isso: um ponto de encontro. De pessoas que comungam uma mesma paixão, de pessoas que cantam juntas por um grade amor, de pessoas que sofrem em conjunto, que se revoltam em conjunto, que festejam em conjunto. De velhos conhecidos, que mesmo que apenas se conheçam pelo nick se sentem próximos. De velhos conhecidos que vestem a mesma camisola e, vindos dos quatro cantos no mundo, se reúnem num local que não poderia ter um nome mais certeiro: a Tasca.

E o que fez da Tasca um local especial foi, precisamente, essa capacidade de ultrapassar as barreiras do universo virtual e esse sentimento de estarmos entre iguais. Iguais capazes de respeitar as diferentes opiniões e de perceber que sem pluralidade de pontos de vista estamos mais longe de sermos o tal clube tão grande que todos desejamos. Mas infelizmente, nos últimos tempos, essa salutar forma de viver o Sporting tem sido colocada em causa e tem, por diversas vezes, tornado o ambiente que aqui se vive demasiado pesado para quem apenas pretende vir beber um copo com velhos conhecidos. E, como observador atento (e preocupado), encontro dois motivos principais para aí termos chegado:
uma tendência crescente de tentar fazer passar a ideia de que quem faz uma crítica é porque está contra a direcção;
e a incapacidade de deixar questões pessoais do lado de fora da porta.

Comecemos por esta última que, curiosamente, nasce do facto da Tasca conseguir juntar pessoas “no mundo físico”. Nas roulotes, nos cafés, em restaurantes, em futeboladas. E é normal que quanto mais nos damos com pessoas, mais próximos estejamos para o bem e para o mal. A questão, aqui, é a capacidade de deixar as fricções, as (in)directas, as ofensas para outros palcos que não este. A Tasca é de todos, repito, de todos, e precisamente por isso temos que ter a capacidade de perceber o que é de todos e o que não é. Que temos que ter a capacidade de fazer um pouco de introspecção e assumir que se contriuiu para esse ambiente pesado, invariavelmente desagradável, ao invés de apontar o dedo ou esperar que o dono do Tasco sirva de árbitro e assuma castigos exemplares sobre os “mal comportados”. Que temos que ser crescidos e saber responder com argumentos e não com insultos.

Mas se as questões pessoais são, como a própria designação indica, apenas de alguns e devem ser resolvidos e ultrapassados por quem de direito, a liberdade de expressão sempre foi o mote de funcionamento deste cantinho Sportinguista. E o que se vai sentido, cada vez mais, é uma espécie de regresso à célebre expressão que rotulou de terroristas os sócios e adeptos que manifestavam de forma mais veemente a sua discordância em relação à actuação da direcção. Tanto ou tão pouco, que nem faltam insinuações de que a Tasca serve para se reunirem aqueles que gostam de criticar a direcção e estão mortinhos por desacreditar o trabalho feito.

Peço desculpa se vou ferir susceptibilidades, mas essa ideia é uma aberração. Tal como o é tentar amordaçar alguém utilizando expressões como “tu deves é ter saudades do Godinho!”, utilizando adjectivações depreciativas como “sportinguense” ou, pior, partindo para a ofensa gratuita e apelidando os críticos de “filhos da puta”. Tudo isto é miserável. Tudo isto é inaceitável, e tudo isto só serve para nos colocar ao nível de um clube pequeno, tão pequeno como os mais pequenos da Europa.

Eu aceito que se faça uma defesa total de todas as decisões que vão sendo tomadas, desde a modalidade de jogos de vídeo ao futebol. Agora, tal como existe esse direito de aqui vir, diariamente, defender esse ponto de vista, tem que existir a capacidade de aceitar o contraditório sem partir para rotulagens e comparações de Sportinguismo. Mas porque raio hei-de eu ser mau Sportinguista por dizer que discordo da opções tácticas do treinador? Por criticar a exibição contra o Tondela? Por não justificar totalmente o empate em Guimarães com a arbitragem? Por dizer que não gosto de determinadas contratações, que as acho um esbanjamento de dinheiro e que preferia ter alguns dos miúdos emprestados entre nós? Por afirmar que gostava que alguns dos capitães que saíram nas modalidades tivessem ficado? São só alguns exemplos simples. Mas podemos passar aos mais “controversos”.

Serei eu menos Sportinguista, por não aplaudir o facto da nossa comunicação ter passado a focar-se no benfica, incluindo nas horas que antecedem jogos? Serei eu menos Sportinguista por considerar que esse não é o melhor caminho para unir-nos a longo prazo? Serei eu menos Sportinguista por dizer-vos que estou cansado desse registo, que o acho parecido como que já foi usado do outro lado da segunda circular e que me incomoda esta aproximação de estilo?

Se calhar sou. Mas prefiro correr esse risco e continuar a defender que o que nos une é falar do Sporting, mais do que falar do benfica. Prefiro correr o risco de continuar a acreditar que a promoção do clima de guerrilha funciona por espasmos, ao passo que a promoção do lado emocional é algo intemporal. Prefiro ir aplaudindo o óptimo trabalho que blogues leoninos fazem no descascar das inverdades alheias, mas seguir o rumo que se iniciou em 2008 e que mudou de nome há três anos.

Basta, aliás, olhar para o nome Tasca, para ter a certeza que este terá que continuar a ser o caminho: fomos nós, todos, que escolhemos o nome pelo qual esta casa é conhecida. E fomos nós, todos, que fizemos dela uma casa conhecida como aquele lugar onde não se mede Sportinguismo pelo simples facto de que não há mais Sportinguistas do que aqueles que aqui estão. Pelo simples facto de sermos velhos conhecidos, mesmo quando nunca chegámos a ver-nos pessoalmente. É essa a magia da Tasca, feita com uma varinha de condão verde e branca que nos contagiou há mais ou menos anos, tantas as idades e gerações que aqui se cruzam. Criam-se amizades, damos as mãos por causas solidárias, passamos tardes loucas a partilhar vitórias nas modalidades enquanto esperamos pelo futebol, damos por nós preocupados com o facto de um simples nick não comentar há demasiado tempo.

Uma preocupação genuína, tão genuína como o sentimento que nos une. Repito: que nos une. Aqui e lá fora, porque caso ainda não tenhas pensado nisso, a pessoa que insultas, desrespeitas ou diminuis no seu Sportinguismo pode ser aquela que, na bancada, no café, no raio de um concerto que calhou ao mesmo tempo de um jogo, abraças quando sabes que o Sporting ganhou. O teu Sporting, o meu Sporting, o nosso Sporting. O Sporting que começou a juntar-nos em 2008 e que aqui nos junta há três anos. Todos os dias.