Consta que uma das maiores canções da história de música terá nascido de uma confusão. Kathleen Hanna, amiga de Kurt Cobain, escreveu a frase “Kurt Smells Like Teen Spirit” e o dito Kurt, ao não perceber que ela se referia a um desodorizante, agarrou aquela frase como sendo uma espécie de hino revolucionário. Nada de mal, bem pelo contrário. Kurt, na companhia do baixista Krist Novoselic e do baterista Dave Grohl, reuniram uma carrada de adolescentes e gravaram um vídeoclipe (sim, escrevia-se assim, vão lá ver o Top+) que terminava numa tumultuosa loucura pré-adulta e dava ao mundo uma “malha” de todo o tamanho.

Devo, ainda, dizer-vos, que Kurt surge nesse vídeoclipe envergando as cores verde, preto e branco, mas isto é apenas um pormenor saído da cabeça deste gajo que tem a mania de ligar cerca de 73% das coisas que vê ao Sporting. E que, ontem à noite, viu um bocadinho do Sporting que deseja há meses, para não dizer há anos, porque este gajo que vos escreve também tem a mania que há-de ver o Sporting ganhar a tudo e todos com uma equipa formada por miúdos que cresceram a vestir a verde e branca e sabem perfeitamente o que significa envergar o Rampante ao peito (e o primeiro palerma que vier dizer que jogámos com o Tondela pode ir conferir contra que equipas tivemos os seis empates e as quatro derrotas que tornaram este campeonato num rotundo falhanço).

Mas voltemos à música. Um gajo ajeita-se na plateia, calcula o espaço que vai ter para sacudir a cachola quando for golo, imagina se estará bem posicionado para uma moshada, mas não espera ver, de uma assentada, Podence e Matheus juntarem-se a Gelson na tarefa de infernizar a vida a quem os quiser parar e impedir de oferecer golos a Bas Dost. E ainda há o extra Bryan Ruiz a jogar a 8, deixando todas as despesas defensivas para William que se quiser acompanhar o ritmo do concerto vai ter que ser uma espécie de membro dos Body Count. I feel stupid and contagious; Here we are now, entertain us…

E, sim, é verdade que a primeira parte não é fantástica, mas, porra, há nervo, há genica, há rapidez no último terço de terreno, até porque Podence decide encarnar o espírito de Slimani e pressiona toda e qualquer bola que esteja a mais de dez centímetros da linha de fundo adversária. E será o pequeno avançado a ter um belíssimo movimento de corpo que o liberta e lhe permite cruzar atrasado para o primeiro sorriso de Bas Dost. Antes disso, apenas de bola parada o Leão havia criado perigo, num livre de Bryan Ruiz batido como deviam ser batidos todos os livres marcados por Bryan Ruiz. E depois disso, só de bola parada voltaria a cheirar a golo, desta feita com Paulo Oliveira a responder de cabeça a um canto e a ver a bola subir um palmo para lá da barra.

Veio o intervalo e ao primeiro minuto já Podence inventava uma desmarcação de Bas Dost. O holandês falharia a tentativa acrobática de chapéu e gritava de raiva para o céu e, passados quatro minutos, voaria de cabeça em direcção à bola para responder a um cruzamento de Matheus Pereira, numa combinação que teria dado um golaço. Dost já não se lembrava há quanto tempo não lhe metiam tantas bolas de golo, a equipa fez questão de recordar-nos as paragens cerebrais que têm valido golos e agruras ao longo da época. Toma lá, contra a corrente do jogo, o golinho do Tondela.

O que vale é que, com sangue novo em campo, a reacção foi pronta. Matheus Pereira mandou às urtigas aquela inibição de fintar quantos gajos quiser (sim, o puto é capaz de fazer isso) e deixou Bas Dost na cara do redes. O holandês, como exemplar assassino profissional, teve a calma suficiente para esperar, esperar e marcar com desprezo antes de voltar a sorrir (aproveitem e vejam a alegria de Matheus ao colo do Thunder. Mas vejam várias vezes, mais a chegada do Podence e do Gelson, todos em redor do goleador. E depois venham chamar-me “formação lover”, bitches!)

No meio desta alegria dos mais novos, Rui Patrício puxou dos galões e saltou meia baliza para ir buscar um livre que foi o último espirro do Tondela. A partir daí, que são cerca dos 58 minutos de jogo, só deu Sporting, com os gaiatos endiabrados e, a espaços, alimentados por fantásticas mudanças de flanco pela canhota de Bryan (entretanto eu imaginei que Adrien estava naquele lugar e pinguei o boxer. Our little group has always been; And always will until the end…).

Jaílson já nem conseguia dar porrada a quem quer que lhe aparecesse pelo caminho (quatro lances para amarelo, só na primeira parte) e, tal como no vídeoclipe, os pré-adultos viravam do avesso o cenário e davam um tão desejado tom grunge ao nosso futebol. Vem um penalti claro sobre Gelson e mais um golo de Bas Dost. Depois é o holandês a ser empurrado e toma lá o quarto, e já com Francisco Geraldes em campo ganha-se mais um penalti claro, que o holandês viria a desperdiçar por achar que o facto do redes se chamar Cláudio Ramos lhe dava o direito de rematar três vezes para o mesmo sítio (ainda assim, volta a ser do Sporting um poker na Liga – 2007 Carlos Bueno, 2010 Liedson – e Bas Dost volta a ganhar terreno na corrida ao prémio de melhor marcador europeu).

Eu não sou a Kathleen Hanna, amiga de Kurt Cobain, mas arrogo-me no direito de escrever Sporting Smells Like Teen Spirit, não só porque o aroma foi outro, antes esperando que quem de direito interprete esta frase como um manifesto revolucionário e que saiba dar ao mundo um conjunto de canções que fiquem para a história. E, pelo menos até ao próximo sábado, vou acreditar que este foi o jogo em que começámos a preparar a época 17-18. Sonhar não custa, ainda por cima quando me lembro que o álbum seguinte dos Nirvana se intitulou In Utero. A mulatto, an Albino, A mosquito, my libido, yeah!