Esta é mais uma semana em que escrever não é fácil. E quando tenho bons motivos para o fazer, foi uma notícia de ontem que me levou a mais uma vez agarrar na pena.

Nesta semana de tragédia, lembrei-me da minha meninice. Nasci numa vila da Serra de Aire e Candeeiros, centro do país.
Onde os meninos de 10, 11, 12 anos ajudavam aos rescaldos dos incêndios como podiam para que os nossos Bombeiros, que eram os nossos vizinhos, pais, tios e irmãos pudessem acudir a outros incêndios, e por vezes até bem longe de nossa casa.
Lembrei-me a espaços de um incêndio que nos encurralou durante uma semana. Podiamos sair e entrar na vila, mas nem sempre o podiamos fazer quando queriamos.

Ora nesses dias um amigo meu ouviu dizer que estavam a precisar de víveres nos bombeiros. Ele tinha recebido há pouco uma nota de 50$00, da madrinha e apesar de terem em casa dele algumas necessidades, pediu-me para ir ao super com ele comprar leite. Fomos numa bicla que pedimos emprestada com um suporte robusto e sei que carregamos leite a sério. Dali fomos aos nossos bombeiros e entregamos tudo.

O incêndio passou e uns dias depois ele entra por minha casa adentro aflito. Foram a casa dele e falaram com os irmãos e os bombeiros querem falar com ele e ele não quer ir sozinho, tem medo e vergonha. Lá fui com ele, e vi uma corporação de bombeiros formados na praça em frente ao quartel, com cheiro de queimado ainda no ar, a homenagear um puto que só fez o que achou bem. Vi naqueles rostos duros dos nossos bombeiros um olhar de gratidão que ainda hoje não esqueço. Naquele tempo recuado comecei a aprender os Valores da Solidariedade e da Recompensa.

Nesse ano mais tarde, estava nas aulas do Professor Vigário, entra de roldão na aula o editor do jornal local. Falou com o nosso Professor e queria que fôssemos todos ali perto ver uma coisa extraordinária. Num tojo, que estava numa área duramente atingida pelo fogo, estava a florescer num raminho, a deitar umas flores tardias. Nessa tarde aprendi o Valor da esperança.

Foram estas as lembranças que me trouxe uma notícia deste pavoroso incêndio de Pedrógão Grande. Entre todas as vítimas haviam crianças, famílias inteiras. Um dos meninos era da nossa família oval, jogava no Belenenses Rugby, nos U08.
Que no seu paraíso consiga ter um campo relvado para fintar e rir e correr e fazer amigos, como só no rugby fazemos.
Um abraço aquela família.

Partilho com todos eles o meu verde ramo de vivo pinho.

*às quintas, o Escondidinho do Leão aparece com uma bola diferente debaixo do braço, pronto a contar histórias que terminam num ensaio