Privado de repentistas e com Bas Dost a sair lesionado, o Sporting fez-se valer do carácter para ir em busca do golo. Acuña, Coentrão, Mathieu e William lideraram as tropas num jogo de crença, paciência e competência, frente a um Guimarães que abdicou de jogar na segunda parte e bem mereceu sair de Alvalade a ver o Sporting na liderança do campeonato

golo mathieu

O jogo prometia emoções fortes, começando pela presença de Daniel, um Sportinguista emigrado na Bélgica a quem foi detectado um cancro terminal e que pediu ajuda para regressar a Portugal. Daniel daria o pontapé de saída na partida frente ao Vitória de Guimarães, lembrar-nos-ia que existem batalhas bem mais duras e importantes do que as disputadas no relvado e teria direito a celebrar, em família, aquela que escolhemos, uma vitória arrancada a ferros.

E na história desta vitória, quase que podemos saltar o primeiro tempo. Ritmo baixo, um Guimarães a sair duas ou três vezes com perigo e o Sporting sem acelerar o suficiente no último terço de terreno. A equipa tinha muita posse de bola, é verdade, mas ela nem chegava a Bas Dost. E quando estava nos pés de quem podia levá-la para a frente, era lenta, lentamente, pese algumas tentativas de descida de Coentrão e de Ristovsky. William falhava demasiados passes, Acuña parecia tudo fazer em esforço, Bruno Fernandes bem procurava brechas sem encontrá-las e Rúben Ribeiro surgia em ritmo de peladinha na praia (com a agravante de voltar a ficar claro que não pode ser opção para a direita).

Não admirou, por isso, que o resultado ao intervalo fosse um bocejo e um empate a zero e que Jorge Jesus não esperasse mais para mexer na equipa. Montero veio a jogo, RRibeiro ficou no banho, mas dois minutos depois o técnico era obrigado a nova mexida: lesão de Dost e Doumbia lá para dentro, formando pela primeira vez dupla com Fredy. O costa-marfinense trouxe genica, o colombiano dava mais jogo entre linha e nos entretantos toda a equipa tinha encostado o adversário lá atrás.

William começava a espreguiçar-se e via Doumbia bem colocado, uma e outra vez. Primeiro por alto, numa bola a que Dost chamaria um figo (percebes agora porque é que se diz que não deves ir com calmeirões apanhá-los?), depois numa belíssima abertura que o 88 não teve arte para desviar da rápida saída do redes. Faltava meia hora para os 90 e o Guimarães abdicava de jogar. Douglas, o redes, atirava-se para o chão uma e outra vez, numa lesão que se curou por milagre lá mais para a frente, as faltas, umas atrás das outras, partiam a tentativa do Sporting acercar-se da área.

Bruno César era a última carta de JJ que tirava, e bem, Battaglia do jogo. Por esta altura, Acuña tinha passado dez minutos a defesa esquerdo, trocando de posição com Coentrão. William tinha engolido o meio campo. Ristovsky já era mais extremo que defesa. Mathieu pegava na bola uma, duas, três vezes e ia por ali fora, cabeça levantada, dizendo à equipa para bater na muralha até a derrubar. Na bancada, os nervos disfarçavam-se com apoio, muito apoio, porque 20 minutos é toda uma eternidade de crença para quem não desiste mesmo quando faltam 20 segundos.

Dizia-vos eu, que o Acuña tinha passado dez minutos a defesa esquerdo, trocando de posição com Coentrão. Pregou um ferro ao Raphinha, fez aquela cara de quem não está nem feliz nem triste e avisou o pessoal que tinha recarregado a bateria. E lá foi ele, por ali fora, vendo o seu remate para golo ficar prensado no pé de João Aurélio, vendo o remate de Bruno César bater no poste e os 42 mil presentes em Alvalade levarem as mãos à cabeça.

Pedro Martins puxava pela sua, a cabeça, e metia Rincón à direita para estancar aquele caudal canhoto leonino. O homem entrou para distribuir porrada, mas veio a tempo de ver o que o povo gosta: puta de remate de Acuña, numa meia volta de fora da área que levou a bola pingona a fazer efeito chiclete e quase a oferecer a Alvalade um retrato do golo do ano. Estava mexido, o ovo, naquele seu tango desajeitado que ele acreditou ser o ritmo da noite: foi à linha levantou um nada a cabeça e cruzou como mandam as regras; na molhada encontrou el ruso, também conhecido por monsieur Mathieu, que rematou de primeira como se de um ponta de lança de tratasse e fez o mundo leonino gritar o merecido golo com 84 minutos de espera, celebrando a liderança do campeonato e a certeza de que o Sporting volta apenas a depender de si mesmo para poder ser campeão.