O Sporting está a atravessar uma autêntica guerra de legitimidade interna. Os dois Orgãos Sociais com mais poder, o Conselho Directivo e a MAG entraram em rota de colisão assumida e não há tréguas à vista. Tudo acabará evidentemente por ser decidido pelos tribunais, nem que seja à custa de providências cautelares, que servirão de árbitros a todo este novelo de interpretações estatutárias.

Seja quem for que saia por cima, o Sporting já perdeu. Perdeu coesão. Perdeu foco na sua missão desportiva. Não deixo de ficar apreensivo quanto ao resultado de qualquer dos cenários, muito particularmente quanto à governabilidade e estabilidade do clube nos tempos futuros, seja para BdC ou qualquer outra presidência. Duas coisas me parece cada vez mais claras:
1/ a MAG está declaradamente a ser suportada por facções que querem a queda deste CD;
2/ O CD não vai ceder um palmo na sua intenção de adiar o mais possível uma oscultação eleitoral.

Perante estas duas posições, cabe a cada sócio entender bem o que estará em causa agora e nos tempos futuros e quero deixar aqui, mais do que considerações e julgamentos (completamente inúteis face à minha incompetência jurídica para analisar os factos), pistas para que qualquer um faça as reflexões que entender ser capaz.

1/ A MAG entende que o CD perdeu condições fundamentais para prosseguir o seu mandato
Os argumentos que apresentou (parcialmente) são vagos e resultantes de uma interpretação e não de factos. Em termos financeiros, a gestão do CD não merece reparos de monta, portanto sobra a gestão desportiva e o famigerado “estilo de comunicação do presidente”. Parece-me absolutamente ridículo apontar o caso Cashball como um argumento, já que denúncias e investigações não são o mesmo que provas de culpa. Aliás, quanto a este caso, é preciso salvaguardar alguma prudência, sabendo que senhores como Cesar Boaventura estão por detrás e talvez bem pela frente da origem deste processo.

Quanto ao “estilo de presidência”, podemos achar contraproducente a uma estratégia eficaz, podemos até achar que não beneficia em nada o Sporting, mas não pode ser, até que alguém prove o contrário, intencionalmente lesivo para a gestão do nosso emblema. A avaliação de incapacidade não pode ser suportada por “forma” ou “estilo”, mas sim por actos lesivos e gestão completamente equívoca.

2/ O CD alega a ilegitimidade da MAG para tomar decisões, uma vez que se manifestou demissionária
Quando alguém se assume como demissionário, releva publicamente que não tem condições para prosseguir as suas funções ou competências. Seja por discordância ou por outra razão qualquer, a verdade é que todas as suas ações a partir do momento dessa assunção, se tornam questionáveis. Eu vi, ouvi e não foi apenas uma vez, o Presidente e a Vice-Presidente da MAG assumirem que a MAG se tinha demitido em bloco. Se o fizeram ou não, parece-me mais relevador de algum zigue-zague e desnorte do que algo que possamos compreender como estratégico. Acima de tudo gostaria de saber as razões porque se (iam) demitir e as que levaram ao retrocesso dessa decisão.
Este braço de ferro com o CD, será sempre questionável até que assumam a totalidade dos argumentos que apoiaram todas as suas decisões.

3/ O CD está a fugir do escrutínio dos sócios?
Parece-me claramente que este é um CD que não tem propriamente receio de ser validado pela massa associativa. Depois de 2 eleições e 2 AGs extraordinárias, teremos de olhar a questão por outro prisma. O do tempo. As últimas semanas têm sido ricas em polémicas, denúncias, ameaças, desafios ao poder e legitimidade deste CD. Parece-me óbvio que BdC e seus pares não querem ser julgados pelo momento actual, entendendo profundamente afectados por uma massiva ofensiva da Comunicação Social que disseca o emblema em tudo o que pode explorar uma pequena janela de polémica. O receio parece fundado e apesar de achar que os sócios sabem ler o interesse do clube apesar “dos momentos”, é um esforço que poderá ser aceitável, mas dependente do futuro dos acontecimentos e da capacidade de resolver os vários problemas que se irão deparar quanto ao início e preparação da época de futebol profissional.

Continuo a achar que seja em AG ou em eleições, o Sporting deverá promover uma oscultação aos sócios. Tem de existir algo que reforce o CD e as suas decisões perante as batalhas árduas que se avizinham. Não ser “obrigatório” é um argumento que fará descansar muito poucos adeptos.

4/ Qual o grau de responsabilidade de elementos externos face ao momento actual?
Acionistas, oposição interna, comunicação social, empresários, banca, patrocinadores, Governo, Liga, FPF, a lista de “interessados” no que acontece ao Sporting nos próximos tempos é vasta e é completamente visível que, uns mais outros menos, têm exercido pressão sobre todos os elementos dos órgãos sociais do clube. E aqui devemos separar estas forças em dois grupos: os que querem uma alternância de poder no Sporting para o fortalecer e os que querem o mesmo para o fragilizar. O drama de tudo isto é que trabalham, sem o saber (espero), em conjunto.

Devemos no entanto tentar distinguir um ponto importante: o quanto do que estamos a viver é instigado, promovido e ampliado por terceiros? E com que interesse principal? É nesta consideração que devemos entender o que verdadeiramente interessa valorizar. O que verdadeiramente interessa a cada um julgar, através da ida e volta de comunicados. Restringemo-nos a factos e às poucas verdades que conseguimos identificar.

NOTA: no momento em que estava a acabar este post, é confirmada a rescisão de Rui Patrício. Estou completamente desolado e sem conseguir explicar como é que chegamos a este ponto. Depois de ler a motivação para a rescisão, fico com a ideia clara de que todos os valores começam a perder peso perante o dinheiro. O respeito, a honra, a lealdade e principalmente a integridade vão saindo do vocabulário do futebol, dando lugar à oportunidade e à ditadura do momento. O passado e principalmente o futuro parecem não interessar a nada nem a ninguém. Não perde só o Sporting, mas todos os adeptos e principalmente, todo o desporto.

Se antes já não havia amor à camisola, hoje parece já nem haver gratidão com os adeptos. Mascarar uma rescisão com a diabolização de um presidente dá um jeitão e mesmo “pondo-nos a jeito” valorando a liderança do presente, não consigo deixar de acreditar que cada vez menos merecemos sofrer ódio quando tudo o que damos é idolatria e sentido de pertença a algo maior do que nós. Estou cansado de ter de escolher entre x e y, entre uma parte do Sporting e outra, entre ganhar bem e perder sempre, entre defender o clube com o receio de estar a defender quem o lidera, de escolher entre facções do meu clube ou clubes de interesses. Acho anedótico como achamos que tudo se resolve com a queda de um e a ascenção de outro, tanto quanto acho patético que se defenda tudo à base de inimigos externos que raras vezes nos atingem de forma tão dolorosa como acaba de fazer o nosso Capitão.

O Sporting perdurará. A fé nos valores que o desporto deveria promover, essa decaí a uma velocidade estonteante.

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca