Como seria de esperar, quer as rescisões, quer a mudança de gestão do departamento de futebol profissional, fariam sempre desta pré-época um árduo caminho pleno de hesitações e lentos avanços na definição do plantel para a próxima época. Houve pelo menos 3 treinadores (Jorge Jesus, Mihajlovic e Peseiro) a fazer apreciações quanto ao que podia ser projectado e pelo menos 3 vezes, o departamento de scouting e vários empresários foram colocados perante “visões” distintas quanto às necessidades a serem procuradas no mercado.

Tudo isto já seria difícil e demorado, mas ainda pode acrescer ao desafio as tais dificuldades de tesouraria, a não entrada na Champions e a natural desconfiança com que potenciais jogadores olharão para o projecto Sporting. Ainda assim, podemos fazer uma análise quanto ao que serão as necessidades e dúvidas que estão em cima da mesa de quem quer que esteja a tentar dar uma equipa competitiva a Peseiro.

Na baliza, a saída de Rui Patrício abre uma cratera de incerteza lógica. A rápida contratação de Viviano pode ter sido uma boa movimentação de mercado, mas ao mesmo tempo que devemos apoiar este experiente guarda-redes italiano, temos também de acompanhar essa atitude com a compreensão que dificilmente este italiano estará ao nível de um dos melhores keepers do mundo. Haverá competências novas em Viviano melhores que Patrício, mas haverá muitas mais onde sentiremos que o internacional português poderia no seu lugar ter feito muito melhor. E já agora, se era para descer um pouco o nível de fiabilidade, teria preferido uma aposta num jogador mais jovem, onde pelo menos tivéssemos a esperança que os erros cometidos levariam a uma aprendizagem e a uma evolução, com vista a valorizar e a capitalizar uma transferência mais tarde.
Como alternativas, Salin e Max são mais que suficientes e a tal entrada de André Moreira é apenas um insulto a quem não deseja ver o Sporting transformado num dos muitos cavalos de pau do carrossel do Sr.Mendes.

Na defesa, o sector menos afectado pelas rescisões, há muitas decisões a serem tomadas. Coentrão saiu e na minha opinião será um erro querer repetir o empréstimo ou a cedência do defesa português. Aquilo que foi uma boa solução no Verão passado, face à aposta firme no ataque ao título, não faria hoje qualquer sentido. Além do problema de uma intrincada gestão da condição física, o alto valor da sua massa salarial, faz de Coentrão mais problema que solução. Neste momento, na posição de lateral esquerdo, há Jefferson, Jonathan Silva e Lumor. Três jogadores que não oferecem garantia alguma de poderem ser bons titulares, sendo que os dois últimos são claramente para encontrar colocação, caso exista disponibilidade financeira para contratar um lateral esquerdo para ser titular, ou Acuña ser fixado nessa vaga.

Na lateral direita o quadro é oposto a quase todo o plantel. Há soluções (e boas) a mais. Gaspar foi contratado com a perspectiva da venda de Piccini o que ainda não aconteceu e muito dependerá se esse negócio for retomado ou não. No caso de não vir a acontecer, parece restar Ristovsky como o elo mais fraco e o jogador a sair, o que para mim seria um erro. O macedónio revelou sempre uma atitude competitiva e uma disponibilidade física acima da média e pese embora o pouco tempo dado por JJ, respondeu sempre com boas exibições. Por outro lado, Bruno Gaspar, parece ser o jogador certo na altura certa da sua carreira e seria absurdo dispensar o atleta sem pelo menos testar as suas capacidades ao longo de toda a pré-época.

No sector central da defesa, Coates e Mathieu ficando, são sempre os naturais titulares, mas há vontade (mais ou menos) expressa do uruguaio de sair e apesar de, pessoalmente achar que salvo a contratação de um excelente central para a posição isso ser um erro, não há que hesitar se surgir alguma proposta tentadora quer para o jogador que para o Sporting. Restam 2 vagas e para outras 4 soluções: André Pinto, Marcelo, Domingos Duarte e Demiral. Não serão precisos grandes dotes de adivinhação para concluir que os dois primeiros terão vantagem, mas imagino que não sendo Peseiro o treinador, facilmente Domingos Duarte ocuparia o lugar de A.Pinto, um jogador infelizmente algo vulnerável a lesões e que parece não conseguir agarrar o lugar, mesmo tendo as oportunidades para tal. Muita atenção a Marcelo, esse sim, já a prometer fazer repensar a premissa que escrevi no princípio deste parágrafo.

No meio campo há muito, mas mesmo muito trabalho a fazer. E urgem algumas decisões quanto a quem e como substituir. Saindo William Carvalho, a verdade é que as soluções que existem não são ainda sequer próximas do valor do internacional português. Petrovic e Palhinha, são por motivos diferentes, produtos demasiado inacabados e se no caso do português ainda há a perspectiva caminho a fazer, no caso do sérvio…sinceramente, andamos a gastar o nosso latim. Pelo meio de uma réstia de esperança pelo regresso de Battaglia, fica a certeza que o Sporting precisa de adquirir um novo 6 com algum estatuto e de dispensar Petrovic, que é bom rapaz, mas na verdade não será jogador quer para o estatuto do Sporting, quer para as dinâmicas de jogo da liga portuguesa.

Onde antes havia Adrien e no ano passado a solução andou entre Battaglia e Bruno Fernandes (conforme a necessidade defensiva da equipa) agora há “apenas” Bruno Fernandes. Mas tal como escrevi muitas vezes, usar Bruno numa missão de box-to-box é um desperdício de talento e aptidões. Na minha opinião, Bruno Fernandes será sempre melhor como maestro da equipa, numa missão sobretudo atacante, do que preso na missão de perseguir a ocupação de linhas de passe demasiado recuado para oferecer assistências e golos à equipa. Mesmo com a entrada de Nani, vejo como muito mais útil (ao longo de uma época inteira) Bruno como 10, do que 8. Além do mais, insistiria com Wendel como o melhor homem para essa posição. JJ quis dar-lhe o curso, mas pelo que já vi, faltam ainda fazer muitas cadeiras e espero que Peseiro seja capaz desse tipo de ensinamentos. Quem via Wendel no Brasileirão, não pode achar que “aquele” jogador não se adaptaria ao Sporting. É preciso acreditar no jogador e ajudá-lo a colocar todo o potencial no rectângulo de jogo.

Misic, Bruno Cesar, Geraldes e Mattheus Oliveira são casos a definir, especialmente conforme as entradas que ainda podem existir. Misic e Mattheus parecem claramente pertencer a uma 3ª linha de soluções o que recomendaria uma venda ou empréstimo. Bruno César e Geraldes serão mais úteis e garantida que seja a sua real utilidade no modelo tático do treinador, ficariam sempre bem no plantel, mas em circunstâncias bem diferentes. O brasileiro dará sempre profundidade às opções, o português deveria ser trabalhado (à semelhança de Wendel) para de uma vez por todas ser encontrada a melhor forma de servir a equipa, o moço é inteligente e receberá bem as adaptações que lhe forem pedidas, aproveitando bem o seu talento, que para já parece particularmente desaproveitado, tantas vezes por preconceito dos próprios treinadores.

Nas alas, a perda de Gelson é evidente que faz mossa. Não sejamos inocentes nem injustos de pensar que o internacional português é facilmente substituído. Por vezes somos tentados a analisar um jogador pelos erros que comete e não pelas coisas únicas que dá a uma equipa e isso é bem verdade numa certa sobranceria com que muitos avaliavam as prestações deste jogador. A sua capacidade de aceleração e espontaneidade, aliadas a uma predisposição para estar sempre disponível para construir jogo não serão fáceis de substituir e mesmo constatando o potencial de Raphinha e Matheus Pereira, o nosso jogo pelas alas não terá a mesma fluidez, pelo menos até fases mais adiantadas da época.

Nani é ainda uma incógnita. Na sua última passagem foi sempre solução para uma das alas, mas o seu jogo desde que saiu do clube, oscilou para zonas mais interiores. Já sem a velocidade e poder de explosão que o caracterizavam, ainda assim não deve ter perdido a técnica e a experiência traz naturalmente mais discernimento na decisão. Fica a dúvida se está pensado como 10, como ala ou mesmo como apoio ao ponta de lança, mas de alguma forma penso ser difícil que, face às soluções já presentes no plantel, venha ter facilidade em ter a titularidade caso o seu nível de disponibilidade física tenda a ser o mesmo que nas duas últimas épocas. Sobram Mané e Jovane Cabral. Para mim, só um dos dois ficará no plantel e nessa decisão terá papel fundamental a recuperação efetiva de Mané.

Não desdenharia uma nova contratação, de um elemento de impacto mais forte no estatuto da equipa, precisamente para uma das alas. A razão é simples. Nani, Raphinha, Mané, Jovane e Matheus têm, por razões diferentes, muitas incertezas depositadas quanto à mais valia que darão à equipa, principalmente se imaginarmos o nível de exigência ao longo de uma época inteira.

No sector avançado do plantel estão também as maiores incertezas. Dost ainda não é seguro que regresse, Rafael Leão ainda não é seguro que não possa regressar. Entende-se o compasso de espera, mas a construção de uma equipa não pode esperar muito mais pela definição de, pelo menos um, homem golo. Montero não é essa solução (cada vez mais um 9 e meio) e Castaignos ou Doumbia (peço desculpa aos eternos optimistas) também estarão longe de o ser. Haverá muitas mais razões para transferir estes dois avançados do que fazê-los permanecer na equipa e rezo aos deuses do futebol que apareçam clubes que nos deem valores justos por ambos, o suficiente para adquirir a tal solução que poderá substituir Dost num cenário de não regresso do holandês ou ser o seu suplente no caso inverso.

No apoio ao ponta de lança, lugar em que “encaixei” previamente Montero, não é razoável existirem mais que duas soluções e nem vejo como fundamental terem de ser especificamente encontradas só com esta valência. No caso, amplamente mencionado na imprensa, de chegar Vietto, a posição ficaria fechada, o que também sucederia com o regresso de Rafael Leão.

Em resumo, há ainda demasiadas zonas cinzentas na definição de que tipo de equipa vamos ter em 18/19, mas à partida parece-me que vamos descer genericamente de valor (pelo menos potencial), isto comparando com o ano anterior. Salvo alguma capacidade súbita de investimento, vamos ter de elevar o que eram alternativas ao estatuto de titulares e no caso de alguns regressos não serem confirmados, a dependência pelo acerto do scouting em encontrar bons substitutos, irá ser total. E nesta contabilidade nem sequer me meto na capacidade do treinador em fazer crescer a equipa ou melhorá-la através melhorias tácticas ou outras metodologias de treino e trabalho mental. É que se fosse por aí, teria de rever muitas das considerações que fiz e talvez essa revisão, em muitos parâmetros, não fosse feita exactamente por alto. Tal como não devemos “dourar” este novo plantel, convém também não fazer de Peseiro mais do que ele é.

estágio-peseiro

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca