É um fenómeno relativamente recente mas com que todos aprendemos a lidar com facilidade. Um pouco por todo o mundo digital, páginas e páginas de comentários alimentam discussões acesas sobre os mais diversos temas da actualidade (alguns tão ridículos que nos limitamos a rir) quase sempre regados pelos mais criativos insultos, quase sempre sem muita razão de qualquer uma das partes. Mas sempre encarei este fenómeno como uma das fantásticas possibilidades que a tecnologia nos trouxe: a nossa opinião tem um espaço, a opinião de outros tem outro e podemos discutir todas as nossas divergências seja com quem for, em que parte do mundo for, na língua que quisermos.

No futebol não é diferente. E por isso, em Portugal e pelo mundo, espaços como este ganharam nova importância no nosso quotidiano, passaram a fazer parte do nosso tempo livre, das nossas pausas no trabalho, no fim de noite em que não dá nada de jeito na televisão. Na Tasca e em muitas outras plataformas do universo leonino, sportinguistas espalhados pelos cantos do mundo podem comentar o que bem lhes apetecer, ler o que quiserem e, claro, discutir forte e feio com alguém que pensa diferente. Por isso é que isto resulta, por isso é que aqui voltamos sempre e por isso é que de alguma forma contribuímos para um clube melhor e para a revitalização da vida activa do Sporting.

Desde que frequento este espaço (e mesmo antes da sua transformação) voltei a ser sócia do Sporting, tive e deixei de ter Gamebox (algumas vezes confesso), participei nas minhas primeiras eleições enquanto votante, escrevi dezenas de textos sobre os mais diversos temas, fiz amizades e inimizades, almocei entre tasqueiros, provei a ginja do Max, apanhei um escaldão numa tarde quente no Jamor e apresentei até família ao nosso querido e ilustre núcleo digital. Pelo meio, claro, discuti, “gritei”, até devo ter insultado alguma vez, as dezenas de pessoas que por aqui passam que pensam de forma absolutamente diferente da minha. Sabendo sempre que este é um espaço que não pertence ao mundo real, no qual não devo alimentar ódios nem perseguições, que serve apenas para o alimento do meu sportinguismo.

Só que infelizmente (e aqui existem diversos factores que contribuem para o fenómeno) o universo leonino, em particular o universo digital, é hoje um espaço de insulto gratuito, divisão profunda e absoluta perseguição. Não vi nunca este nível de degradação nos nossos rivais ou em qualquer clube que conheça (nem mesmo em clubes com temas efectivamente fracturantes, como lutas pela independência). A facilidade com que bloqueamos, escorraçamos e perseguimos. A facilidade com que alguém é rotulado, criticado, humilhado publicamente com temas da vida pessoal. A facilidade com que nos expomos ao ridículo de reforçar as coisas em que acreditamos a qualquer oportunidade, para que não nos metam na caixa dos “brunistas” ou dos “croquetes” ou dos “ratos”. A quantidade de vezes por dia que somos confrontados com o desconforto de alguém nos insultar, porque cometemos o erro de falar do clube que apoiamos.

Não é normal, não tem de ser desculpabilizado, não tem de fazer parte do nosso dia-a-dia. Nestes meses, a quantidade de sportinguistas com que deixei de conversar sobre o Sporting, apenas para não alimentar uma discussão. A quantidade de comentários que deixei de fazer, a quantidade de barbaridades que deixamos passar em branco, todos os dias, para resistirmos ao constante confronto. A quantidade de pessoas que dedicam horas, dias, anos ao Sporting com muito pouco retorno que são destruídas em cinco minutos, ameaçadas de pancada ou perseguidas nas redes sociais.

Achamos sempre que não devemos alimentar o troll. Que ignorar alguém tão desesperado por atenção é a melhor solução para um problema que se arrasta há demasiado tempo e que claramente subiu de tom desde a última AG. Nada mais falso. Calar aqueles que se dedicam ao ataque constante e pessoal, retribuir o favor de apontar a sua profunda estupidez e lutar por um Sporting mais tolerante, menos sectário e dogmático é essencial naquilo que é a vida a curto prazo do clube. Até o mais positivo e compreensivo dos sportinguistas se sente afastado, desligado e profundamente irritado com aquilo que se transformaram os seus adeptos.

*às quintas, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa