A terra foi novamente invadida por asteróides, vulcões entraram simultaneamente em actividade, mares invadiram o que restou de solo seco e no final do dilúvio sobraram seis pessoas. Um casal que assava frangos numa churrasqueira de Moscavide, um carteiro alcoólico e a sua parceira da zona da Ribeira, um sócio do Clube de Golf do Estoril e uma trabalhadora d’um call-center da Linha de Sintra.

A esses seis humanos ficou incumbido o dever de reconstruirem a humanidade. Séculos depois, lampiões e os tripeiros voltam a trocar títulos de futebol a cada dois anos e os Sportinguistas continuam a sua extenuante inimizade entre facções elitistas e populares. É o ADN natural (natural porque existe) de um banana. Um banana não evolui, estagna, porque é frágil e sempre que confrontado com mudanças reage e depois volta à sua forma original.

O problema do Sportinguistas reside precisamente aqui, tem um espírito rebelde mas depois de se revoltar, volta, por vontade própria, a estabelecer limites para a sua liberdade. É, no mínimo, embaraçoso. Os últimos 80 anos de história (no seguimento da década dourada de 50) são uma prova inequívoca disso mesmo.

Como entender então esta colectividade, para além dos chavões habituais relacionados com a génese fratricida? Como poderemos nós calcular as aparentes (e pelos vistos, objectivamente reais) diferenças entre um Sportinguista, um lampião, tripeiro, culé ou madridista? A distinção poderá estar concretamente na intenção com que cada indivíduo adepto acredita na comunidade imaginária a que pertence. Tirando as reais ligações familiares entre adeptos do mesmo clube, a ligação que une estas pessoas a outras que torcem pela mesma equipa (mas não ligadas por sangue) são meramente subjectivas. Da mesma forma que um jogador de futebol que coloca o hashtag #naçãoleonina num post de Instagram passa a ideia de que somos todos uma grande e feliz família, sai ao fim do ano, azedo com o facto de ter jogador pouco e ainda usa o Correio da Manhã para criticar o clube anterior. Tudo parece real, até continuar a ser falso.

Quando escrevi que o clube deveria ser gerido por um núcleo duro, referia-me à fracção de sócios que há muito já atravessaram o Rubicão, o ponto sem retorno, onde nenhum tipo de propaganda e manipulação será tomada em conta. A diferença entre este núcleo duro e a elite revanchista que tem tomado o clube de assalto é que nós pensamos única e exclusivamente na saúde e no futuro da organização. Sem jogos de bastidores, sem esquemas encapotados, e a existirem, que seja para manter a soberania do Sporting Clube de Portugal sobre quem continua confuso. As pessoas que ainda não perceberam, vão entendê-lo brevemente.

Daí ser importante discernir que estas pessoas confusas são as que merecem ser salvas, mas porque ainda fazem parte de um sistema que as doutrinou e ensinou a sentirem medo e a acolherem quem nos quer fazer mal como os seus salvadores, devem ser irremediavelmente avaliados com precaução. Diria mais, até deixarem cair a ficha, devem ser tratados como inimigos, porque como já se provou por inúmeras vezes na história do clube, foram os seus maiores inimigos. Alguém que me explique como é que o projecto Roquette quereria a prosperidade do clube, quando no fim o que sobrou foi um 7º lugar e as folhas para insolvência? Se a leoa tinha leite, porque não mantê-la saudável? Para eles o clube não passa de uma puta barata que há-de chegar ao fim da sua quilometragem. É assim que os chulos funcionam. Não têm amor e se pudessem vendiam a coroa de Cristo.

Este texto não é sobre escolhas, essas têm sido feitas, ano após ano, década após década, de forma subconsciente. Não quero saber em quem vão votar, ou que planos têm para as próximas crises em Alvalade, vocês continuam a ler estas passagens porque no vosso íntimo gostavam de descobrir porque tomam as decisões que têm tomado ao longo dos anos nas assembleias, no estádio, nas roulottes e nos grupos secretos do Facebook.

Continuam a ler porque gostavam de uma resposta clara sobre a razão por que Dias Ferreira – que tem sempre a claridade para nos elucidar e guiar – continua a dizer que o Sporting foi sempre assim na sua história, caracterizado por lutas fratricidas. Os profetas intemporais, que sempre nos deram soluções que nunca resultaram em nada, e continuarão, infinitamente, a queixarem-se.

Também continuam a ler porque gostavam de saber a resposta à pergunta da advogada do ex-líder da Juventude Leonina Fernando Mendes, quando disse “sigam o dinheiro”. Ou porque João Benedito tem os mentores dos cartazes e flyers da 2ª Circular na sua lista. Ou por que razão os causadores do episódio de hooliganismo no Porto, em plena presidência de Bruno, estão embutidos na lista do Varandas.

A mim não me interessa saber as vossas intenções de voto ou se almoçam em Setúbal durante a semana. É igual. Tal como noutros anos, noutras décadas, noutros acontecimentos, vocês já tomaram decisões. Decisões iguais às que nos levaram até este ponto. A única coisa que me interessa é o futuro, e sei que a única maneira de lá chegarmos é juntos. Os Sportinguistas, através do seu livre-arbítrio (será) chegaram aqui, e pensam que o programa existente terá necessariamente que ser trocado por outro. Porquê, não se sabe ao certo, talvez a resposta se encontre escondida entre as 20 mil horas de ataque dos media ao clube. Mas, no fundo, quem sabe efectivamente no que está a escolher? Quem nos diz a nós que João Benedito não será o próximo Luís Filipe Vieira? Melhor, Varandas o próximo Godinho Lopes sob efeito de metanfetamina?

O telefonema desgarrado de uma sócia do Sporting à SIC, há uns meses, pode muito bem tornar-se no mais eficiente exercício de futurismo que vimos nos últimos tempos dedicado ao fenómeno do dirigismo desportivo. E sobre isto recai igualmente outro dado: a vontade de uma fracção de sócios confusos em sentirem que seria propício a Bruno de Carvalho que se ausentasse por um determinado período de tempo das lides desportivas, mas que tentasse novamente a sua sorte na presidência do clube passado um período de nojo (quatro, cinco, seis anos).

Esta é claramente uma causalidade daquilo que este Presidente deixou embutido nas mentes dos Sportinguistas, e por isso, não vá o diabo tecê-las, mais vale ainda tê-lo como alternativa futura do que afastado para sempre, deixando o clube perpetuamente nas mãos da classe elitista corrupta vigente.

Concorde-se ou não, a destituição de Bruno de Carvalho resultou nisto: depender de decisões do sistema judicial português para acabar com o caos em Alvalade. Os tribunais portugueses não são isentos e as suas decisões para casos quentes são fruto de pressões das classes políticas e de poder.

Não tenho respostas proféticas para dar, sonhos para vender, ou sequer confiança para oferecer.

Boa sorte, Sportinguistas. Bem precisam. Outra vez.

ESTE POST É DA AUTORIA DE… Trolha
*às quartas, a cozinha da Tasca abre-se a todos os que a frequentam. Para te candidatares a servir estes Leões, basta estares preparado para as palmas ou para as cuspidelas. E enviares um e-mail com o teu texto para [email protected]