Esta é uma análise sobre o que tem sido a nossa viagem ao longo das 84 épocas da Liga, desde os nossos “tempos áureos” até à actualidade, comparando os registos dos 3 grandes rivais, e, com a preciosa ajuda da história, tentar decifrar o presente: estará o Sporting a viver um ciclo conjuntural negativo, que naturalmente tenderá a inverter-se, e que se repete, periodicamente, nos 3 grandes? Ou estará a escavar-se um fosso cada vez mais profundo entre o Sporting e os seus rivais, numa tranjetória de divergência?

Com este contributo, tentam-se dar pistas para responder a esta questão, na convicção que, quanto mais estrutural for o nosso problema, maiores e mais profundas terão que ser as mudanças, para que possamos inverter o curso da história ao reencontro da glória.

Este estudo não é mais do que um conjunto de análises assentes numa abordagem metodológica simplificada, e por isso subjectiva, que visa tornar minimamente comparáveis períodos distintos, quer na quantidade de jogos por época, quer na quantidade de competições, quer no grau de profissionalização da indústria do futebol.

1 – Diferença pontual em ciclos de 5 anos
Neste critério, foram considerados ciclos de 5 anos (que correspondem ao maior período consecutivo de vitórias em campeonatos, alcançado pelo FCP), de forma a perceber quantos pontos, em média, têm separado os 3 grandes, em cada ciclo de 5 anos. Para que tal leitura fosse comparável, foi utilizada a seguinte metodologia:

– Uniformização do registo de 3 pontos por vitória para as 84 épocas.
– Com base no número de pontos por jogo alcançado pelos 3 grandes, época a época, foi uniformizado o número de jornadas para 34, de forma a poder ter uma base comparável de pontos por época, para a totalidade do período em análise.

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Nota: foi atribuído domínio, quando a equipa com melhor performance obteve pelo menos 5 pontos de vantagem, em média, anualmente, para o ciclo em análise

Nota: o período de 34/39 integra 6 anos, para facilidade de interpretação dos dados.

Conclusões:

– A concentração de pontos dos 3 grandes (indicador para o nível e competitividade da Liga) não decresceu longo dos 84 anos. Inclusivamente, acentuou-se desde 2010. O padrão mantêm-se desde 1934: 3 crónicos candidatos, e por duas vezes, vitória de um outsider.

– Em ciclos de 5 anos, apresenta-se normalmente um clube destacado (dominante). Tal aconteceu em 11 dos 16 ciclos já completos, com o SLB e FCP a dominar 5 ciclos cada, e SCP apenas 1, sendo 5 ciclos caracterizados por equilíbrio (entre 2 ou 3 grandes).

– O Sporting, desde o quinquénio 1950-54 que não tem um ciclo de equilibro ou dominância na Liga. Desde então, num total de 12 ciclos completos (60 anos), o Sporting apenas em 2 ciclos obteve uma média pontual inferior a 10 pontos, relativamente ao primeiro classificado nesse ciclo, chegando a ter, no ciclo 2010-2014, uma distância média de 20 pontos/época para o clube dominante.

– No actual ciclo, ainda incompleto, o Sporting (que corresponde ao “Sporting de JJ”) obteve a melhor média de pontos desde o ciclo 1950-54. Apesar do ciclo estar incompleto – e sendo expectável que a média desça já este ano, é muito provável que venhamos a registar o melhor ciclo dos últimos 60 anos. No entanto, FCP e SLB registam médias pontuais superiores, com o SLB a apresentar, neste ciclo, a pontuação média recorde da sua história (ex-aequo com o ciclo 70-74).

2. Médias pontuais dos 3 Grandes: Os 10 All Time Best e os 10 All Time Worst

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Conclusões:

– O FCP é, entre os 3 grandes, o que tem piores épocas em termos pontuais, sendo que 4 das suas piores épocas tiveram lugar antes de 1950. As épocas negras do Sporting foram essencialmente nos anos 60, e mais recentemente, a época de 2012/13. Note-se que SLB apenas teve 15 épocas com registos abaixo de 2 pontos/jogo que compara com 21 e 30 épocas, no caso de FCP e Sporting respectivamente.

– Em termos de épocas com melhor performance, o SLB apresenta o melhor registo, e divide o Top 10 com o FCP, com o Sporting a figurar apenas com um registo, em 8º lugar, na longínqua época de 46/47 (a primeira época dos 5 violinos).

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Conclusões:

– Analisando os títulos de campeão nacional, sobressai o domínio do Sporting nas décadas de 40 e 50, do SLB nas décadas de 60, 70 e 80 e do FCP nas décadas de 90 e 2000. A actual década está a ser disputada, taco-a-taco entre FCP e SLB.

– O Sporting tem vindo a baixar progressivamente o seu score de títulos em cada década, tendo conquistado apenas um título por década nas últimas 30 décadas, sendo que, na atual década ainda não foi conquistado nenhum título.

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Conclusões

– Ao contrário do número de pontos por jogo, que se tem mantido estável, no agregado dos 3 grandes, observa-se uma trajectória descendente no número de golos marcados, de cerca de 3.5 golos/jogo nas primeiras épocas, para 1.9 golos/jogo no virar do milénio, tendo este rácio recuperado, desde então, paa valores de 2.0-2.1 golos/jogo.

– O Sporting foi dominante nas primeiras décadas da competição, e, no que toca a golos marcados, foi mais prolífico do que os seus rivais, ficando para a história os únicos 3 registos superiores a 4.5 golos/jogo nas épocas 37/38, 39/40 e 46/47 (4.8, 4.8 e 4.7 golos/ jogo respectivamente), com um denominador comum chamado… Peyroteo.

– Tal como em outros critérios, o Sporting entrou também em perda nesta variável, sendo de forma consistente e nos últimos 50 anos, o ataque menos produtivo dos 3 grandes.

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Conclusões:

– O FCP, após uma década terrível, em que o Belenenses assumiu um protagonismo de “4º grande”, atirando o FCP para fora do pódio por 9 vezes, tornou-se mais competitivo ao ponto de, nos últimos 43 anos, ter ficado sempre no pódio. No total, 17 épocas fora do pódio.

– O SLB ficou apenas por 5 vezes fora do pódio, 3 das quais, na década passada. Aliás, à excepção dessa década, o SLB não ficava fora do pódio desde os anos 40.

– O Sporting tem 25 épocas fora do pódio, o que equivale a quase 30% das épocas. Mesmo na década gloriosa de 50, em que o SCP realizou grandes proezas, ficou fora do pódio por 3 vezes. Curiosamente, e inversamente ao SLB, foi na década passada que conseguiu alcançar uma das suas melhores marcas, com apenas uma época fora do pódio, à semelhança dos anos 40.

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Com este índice, o desafio foi tentar capturar a performance de cada um dos 3 grandes, tendo em conta, não apenas a conquista de campeonatos, mas também de outra competições que, ao longo destes 84 anos, foram surgindo (nacionais e internacionais), bem como a regularidade competitiva (vice-campeonato e 3ª posição). Assim, com base numa ponderação por cada evento foi construído um Índice de Performance Global representado no gráfico abaixo

Conclusões

– Depois de uma década de 40 desastrosa, a performance global do FCP tem vindo a crescer sustentadamente, tendo sido a equipa dominante dos anos 90 e 2000, reforçada com o êxito internacional. Na actual década, a tónica é o equilíbrio com o SLB.

– SLB foi um adversário competitivo e à altura do Sporting nos anos 40 e 50, tendo dominado o futebol nacional nos anos 60 e 70. Na presente década há sinais de melhor performance e de inversão um ciclo negativo de 20 anos.

– O Sporting, sendo a equipa de referência da década de 40 e 50, vê-se prejudicado pelo facto (i) do baixo número de competições naquele período, (ii) pela irregularidade da sua performance, ficando várias vezes fora do pódio e (iii) pelo número de Taças de Portugal arrecadadas pelo SLB.

– Ainda em relação ao Sporting, é visível uma trajectória descendente neste índice, desde a década de 40, com uma ténue recuperação na década passada, sem no entanto por em causa a hegemonia do FCP nesse período.

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Os 5 violinos marcaram a fase dourada de glória do Sporting. Apesar de terem coincidido todos eles apenas em 3 épocas – 46/47, 47/48 e 48/49, o período dos violinos estendeu-se por 22 anos, desde que o primeiro violino se estreou até que os últimos violinos encostassem as chuteiras. E de facto, registam números impressionantes especialmente quando comparados com a realidade leonina “extra violinos”.

Com efeito, o contraste é notório: o “Sporting dos violinos” ganhou mais de metade dos títulos de campeão nacional que o Sporting alcançou até hoje. E, apesar de terem o SLB como um rival com quem ombreavam, levaram a melhor com um registo de 10 campeonatos em 22 épocas (quase 1 título em cada 2 épocas). O Sporting sem violinos contabiliza 62 épocas (quase o triplo das épocas do “Sporting dos violinos”), com apenas 8 títulos conquistados, isto é, um título em cada 8 épocas.

NOTAS FINAIS
Os vários critérios analisados neste estudo – alguns mais objectivos, outros mais subjetivos, poderão ter as mais diversas interpretações Os factos analisados, que abrangem uma série longa de dados, podem ter explicações muito objectivas e especificas. Relevo no entanto, que estas tendências de longo prazo parecem robustas, e mesmo utilizando outros métodos ou opções valorimétricas, não se observam alterações de fundo ao quadro apresentado.

Partilho, no entanto, a minha interpretação: o estudo aponta, no meu entendimento, para um Sporting que tem, continuadamente, e desde há 7 décadas, vindo a registar uma trajectória de divergência, contrariada, de forma cada vez mais esporádica, por episódios de sucesso. Ao contrário, os rivais, aparentam registar ciclos negativos e positivos, alternando períodos de dominância no futebol nacional. Esta perda de competitividade do Sporting contrasta com a crescente profissionalização e globalização do futebol.

Uma nova trajectória requer alterações profundas na forma de pensar o Sporting. O futebol já não se resume a um deporto, mas sim uma indústria extremamente competitiva; os participantes nesta indústria já não são os clubes, mas sim as sociedades anónimas desportivas que os clubes criaram. Os jogadores são marcas. A concorrência é global. O Sporting tem urgentemente de se alinhar com esta realidade, de ter uma estratégia empresarial, de ter um plano estratégico, capacidade de antecipação e de criação de vantagens competitivas, que passam pelo reforço das nossas competências, pela modernização da nossa gestão, pela refundação do nosso governance e pela atracção de parceiros que nos complementem, para partilhar know how, partilhar risco e aportar músculo financeiro – factores essenciais para o sucesso, num ambiente de forte competição. A bem de um Sporting vencedor.

Texto escrito no site Tertúlia Sporting por Manuel Reis, Sócio nº 5691