1 – Como nasceu o teu Sportinguismo e quais os momentos do Sporting com que mais vibraste, JHC? Descreve um deles.
Ao contrário de outros amigos Sportinguistas, o meu Sportinguismo não foi herdado dos meus pais (não tinham simpatias clubísticas) mas do meu tio materno, grande Sportinguista e homem com elevado sentido de justiça. Não consigo dissociar o respeito que sentia pelas causas e valores que defendia do facto de hoje ser do Sporting. Estou convencido que nunca tive escolha!
Para mim o Sporting é muito mais que um Clube. É um modelo de princípios e valores ao qual me sinto “vinculado” e me revejo. É quase uma religião! E é algo a que me associam constantemente, na minha vida social e familiar. Ninguém desconhece a minha cor!

Sou do Norte e o dia mais feliz da minha vida, enquanto Sportinguista, foi o da conquista do Campeonato de 1999/2000 em que vencemos o Salgueiros por 4-0. Estava com amigos sportinguistas e não tínhamos dinheiro suficiente para todos os bilhetes e por isso decidimos ver o jogo num café onde nos juntamos a outros Sportinguistas que também não conseguiram entrar. Após o primeiro golo do André Cruz, corremos para o Vidal Pinheiro na esperança de entrar para ver o final do jogo. Confesso que só com o golo de Dusher me convenci que o título já não fugiria! Foi um final de tarde e uma noite inesquecíveis! Aliás todo esse dia foi uma aventura. Se no Porto foi uma autêntica loucura, consigo imaginar o que terá sido em Lisboa!
Outro momento marcante para mim foi a conquista do 1º Título do Andebol em 2016/2017! Não senti nenhuma outra conquista nas modalidades como esta!

2 – Como tens visto o Sporting desde que te lembras de ser Sportinguista, ou seja, qual a tua opinião sobre o passado e o presente do clube?
As primeiras recordações que tenho enquanto Sportinguista são de Damas, Keita, Manuel Fernandes, Jordão e Fraguito, mas era muito novo. Em 77 emigrei com a minha família e só ao regressar a Portugal, quase década e meia depois, voltei a viver e sentir o Sporting. Foi como recuperar a minha identidade.
Mas durante essa ausência deixei de ter notícias da vida do Sporting. O pouco que sei do Sporting antes de Sousa Cintra foi através do que li e ouvi de amigos e do meu tio.

Em relação ao passado recente, penso que o Sporting, pela sua forma de estar no desporto, foi dos 3 grandes aquele que menos proveito tirou da criação das SAD. Não soubemos aproveitar os campeonatos conquistados no início do século e deixamos sair Manolo Vidal e Augusto Inácio quando deveríamos ter cimentado um projecto a longo prazo. Das direcções de José Roquette à Godinho Lopes, apenas no mandato de Soares Franco vi uma verdadeira intenção de “governar a casa” com os recursos disponíveis. Ganhamos Taças e Supertaças, revelamos valores da formação, mas ficamos mais pobres em património. E quem veio depois conseguiu sempre fazer pior. Em resumo, direcção após direcção, deitamos ao lixo carradas de dinheiro, vendemos património, fechamos modalidades, hipotecamos passes da nossa formação, tudo na esperança de sermos campeões, e chegamos a 2013 falidos.

Em relação ao presente do Clube estou bastante apreensivo. Não com os protocolos chineses ou com os saneamentos televisivos das vozes críticas, mas com a falta de transparência e incapacidade desta direcção em administrar um Clube com a grandeza do Sporting. Cada dia me convenço mais de que Frederico Varandas não estava preparado para assumir o cargo. Olho para este CD como olho para Gudelj, chegam sempre atrasados à “bola”.

Não previram as dificuldades da emissão do EO e este ficou aquém do necessário. Para conseguir pagar o anterior EO gastaram parte da “almofada Rui Patrício”. E como não conseguiram os 60 milhões, necessários segundo os cálculos da anterior direcção para cumprir os compromissos de tesouraria e atacar o mercado de inverno, tiveram de despachar dois dos nossos principais activos a custo zero para poupar salários, ao mesmo tempo que quebraram a promessa eleitoral e se socorreram daquele que diziam ser o “último recurso” a utilizar, o contrato de patrocínio que herdaram.
Poderia continuar a discorrer sobre outros erros ou os meus receios quanto à RF e à recuperação de uma percentagem significativa da SAD com a compra das VMOC, mas não vale a pena sofrer por antecipação. Espero que esta direcção seja capaz de concluir com êxito a operação. Não acredito mas torço para que o consiga.

Desportivamente acredito que venceremos a Taça de Portugal e ficaremos em 3º lugar. De Marcel Keiser não espero muito mais. Estamos constantemente a defender a utilização de Doumbia no lugar de Gudelj e a utilização de Francisco Geraldes para descansar Wendel ou Bruno Fernandes, sem sucesso. Já se torna cansativo. No final da época o treinador será o Calcanhar de Aquiles de Varandas. Um projecto para o futebol assente na formação, como prometeu Frederico Varandas na campanha, não rima com Keiser.

3- Qual a tua perspectiva de futuro do clube? Como gostarias que fosse?
Durante a campanha eleitoral retive uma ideia do candidato Rui Jorge Rego, “o Sporting não pode estar sempre a espera de ir à Champions”. Esta é a grande questão a ter em conta para garantir o futuro do Sporting: Como ser sustentável e competitivo sem receitas extraordinárias como a venda de jogadores e prémios da UEFA?
A nível de gestão, foi aqui que Bruno de Carvalho cometeu o grande erro, na minha opinião, ao colocar todas as fichas na entrada na Liga dos Campeões.
Apesar dos lucros e do crescimento das receitas em todas as rubricas, o investimento feito no plantel de Jorge Jesus foi brutal e o falhanço dos objectivos resultou num constrangimento financeiro que iria obrigar a um grande desinvestimento com a venda de jogadores e redução da massa salarial do plantel. Isso mesmo antecipou Carlos Vieira em entrevista.
Apesar disso acredito que Bruno de Carvalho conseguiria levar o barco a bom porto caso o ataque à Alcochete não tivesse acontecido. É um excelente negociador e os jogadores que rescindiram estavam valorizados e tinham mercado. A forma como a Banca aceitou negociar a reestruturação financeira e o valor final das VMOC, na altura mais conturbada da vida do Sporting, é demonstrativo da confiança que tinham naquela Direcção.

Respondendo a pergunta em concreto, quero que o Sporting continue a respeitar a sua matriz fundadora. A defender os valores desportivos e a inclusão, a promover o ecletismo, a formar atletas e homens, a liderar todas as batalhas pela verdade, crescimento e valorização do desporto em Portugal. Não só é nosso desígnio como é uma obrigação enquanto Maior Potência Desportiva Nacional.

Quero um Clube moderno, competente e exigente consigo mesmo e com quem gere o o desporto em Portugal.
Não restam dúvidas que no estado actual em que se encontra o futebol português as probabilidades de sermos campeões são diminutas. Para o Sporting ter sucesso é preciso primeiro limpar toda a porcaria que cobre o desporto em Portugal. É preciso denunciar os esquemas, expor os erros de arbitragem, relembrar processos adormecidos a espera da caducidade. É isso que espero desta e de futuras direcções. Uma voz activa e não silêncios estratégicos.

4 – Se fosses candidato quais as principais medidas que aplicavas (Financeiras-Projecto Desportivo -Futebol e Modalidades)? O que achas do sistema eleitoral ? Quais seriam as tuas bandeiras como candidato?
Houve uma proposta estatutária de Bruno de Carvalho para limitar o endividamento da SAD em cada exercício. Avançava com essa proposta de forma a evitar que as direcções, presentes e futuras, pudessem pôr em causa a sustentabilidade do Sporting, como aconteceu durante a direcção de Godinho Lopes.

Na minha opinião as modalidades estão muito bem entregues nas mãos de Miguel Albuquerque, do Eng.Gilberto Borges, de Carlos Galambas, da Mariana Cabral, do Ernesto Pereira e de tantos outros profissionais de excelência espalhados pelas 55 modalidades do Clube. Não alteraria nada na actual estrutura mas prepararia o futuro investindo na formação dos atletas em fim de carreira para manter a identidade dos projectos e preservar esta Cultura Sporting que habita as modalidades.

Em relação ao sistema eleitoral já ouvi uma quantidade de teorias e argumentos, desde que o actual modelo protege o acto eleitoral de votos comprados, até de que serve para impedir a perda de uma regalia dos sócios mais antigos. Para mim o justo será sempre um sócio um voto. Acho que esta é uma grande falha no Sporting, esta diferenciação dos sócios que nada tem de democrática. Há muitas formas de premiar a antiguidade dos sócios com ofertas de bens e serviços do Sporting, convívios com atletas ou outros tipos de homenagens que garantam este reconhecimento.

Para o futebol não vejo outra solução desportiva e financeira que não passe pela formação. Ainda para mais quando temos o conhecimento para descobrir e potenciar talentos. Esta seria a minha bandeira e o plantel principal teria obrigatoriamente de incluir um jovem da formação em cada posição, excepção feita aos casos em que não tivéssemos a dada altura talento visível para esta promoção.

5 – O que achas dos denominados notáveis ou ilustres e o que farias em relação às claques?
Nunca vivi politicamente o Sporting até as eleições em que Bruno de Carvalho venceu José Couceiro. A verdade é que sempre comprei aquilo que me venderam e acreditei em praticamente todos os “croquetes” que me serviram como sendo de boa qualidade. Se calhar quis sempre acreditar nos Dias da Cunha, Bettencourts e Godinhos porque surgiram como a única solução, e o amor ao Sporting obrigava-me a apoiar quem queria servi-lo. Desconhecia quem eram e a relação entre eles.
Hoje, as redes sociais permitem conhecer o passado destas pessoas dentro do clube e avaliar as suas acções., e isto faz com que estejamos mais atentos. Mesmo assim muitos de nós são manipulados pela forma como os gabinetes de comunicação “trabalham as informações para os OCS. Tenho amigos que acreditam e apoiam Frederico Varandas, que tecem rasgados elogios à substituição do relvado sintético e ao novo campo de futvolei, mas que são incapazes de questionar o protocolo chinês de 2 milhões, dinheiro que evitaria que o nome do Sporting fosse enxovalhado na praça pública por um pedido de insolvência feito pelo Guimarães (é Guimarães mesmo e não Vitória! O que fizeram ao Sporting foi deplorável). Por isso percebo que são muitos aqueles que estão anestesiados e aceitam o actual estado de coisas no Sporting. Infelizmente.

Não considero notáveis as pessoas que utilizam a sua posição social e mediática, e que se agarram ao Sporting para obter mais visibilidade. São sócios como nós e não deveriam ter privilégios diferentes dos restantes sócios a menos que tivessem prestado serviços relevantes ou dedicado parte a sua vida ao engrandecimento do Clube. Posso estar a ser injusto para com algumas destas pessoas, por ignorância, mas para mim uma grande parte delas são simplesmente emplastros.
Para mim notáveis são os sócios que fazem contas a vida para proporcionar Dias de Sporting à família, que fazem quilómetros, faça frio ou faça sol, para apoiar os nossos atletas por todo o País.
Notáveis são Aurélio Pereira, Carlos Lopes, Chana, Manuel Fernandes(apesar do presente), Jordão e Fraguito (porque não convidá-los para um homenagem em Alvalade, como fizeram à Chana no JR?), os saudosos João Rocha e Mário Moniz Pereira, Manolo Vidal e tantos outros. São ilustríssimos!

O que mais me revolta é que os emplastros do Sporting, alguns deles bem colocados em órgãos de poder e decisão, nada dizem ou fazem em defesa do Sporting quando este é atacado na comunicação social, nem trabalham pela verdade desportiva em Portugal. São políticos, advogados, magistrados, figuras da cultura e da comunicação. Bola!

Escrevi na altura das rescisões que não entendia como figuras históricas do futebol leonino, percebendo os enormes prejuízos causados pelas saída dos jogadores, não foram capazes de mobilizar para tentar convencê-los a não deixarem o Clube que os formou passar por uma crise tão grave e com efeitos imprevisíveis. Beto, Futre, Figo, Oceano, Carlos Xavier, Manuel Fernandes, jogadores e capitães com peso histórico no Sporting, nada fizeram. Alguns lamentaram, outros choraram, mas nenhum agiu…

Sou defensor das claques desde que cumpram àquilo para que foram criadas, que é a festa e o apoio às nossas equipas. São uma parte importante do espectáculo. Antigamente, quando a militância era menor, eram as nossas claques que se faziam ouvir em todos os estádios.
Mas o problema com as claques não é apenas do Sporting e não vejo vontade política para criar e aplicar leis de forma a banir quem comete crimes escudado nelas. Já ouvimos um responsável político dizer que as claques não são um problema…
Bastava-nos copiar o modelo inglês. Tenho a certeza que se os nossos governantes e dirigentes tivessem interesse real na mudança, os ingleses ajudariam, explicando o modelo e até enviando especialistas.
E enquanto não houver coragem política e existirem grupos organizados de bandidos sem punição, o Sporting estará a mercê do poder de quem se serve das claques. Se houverem leis e punições severas, o Sporting terá apenas que proporcionar as condições para que se cumpram.

6 – Que medidas aplicarias em relação à melhoria do futebol nacional em todas as suas áreas (arbitragem -ligas -campeonato – mais ou menos clubes, no fundo organização do futebol nacional)?
Este fim de semana ouvi que os ingleses se preparam para permitir aos espectadores nos estádios a visualização das mesmas imagens do VAR que o árbitro analisa durante o jogo. Também na Austrália será possível ter acesso ao áudio do VAR. Tudo pela verdade e transparência. Enquanto em Portugal não tivermos ambas nunca teremos hipóteses contra os rivais. Sem honestidade a tecnologia fará pouca diferença.

Hoje sabemos que o “polvo” trabalhou a realidade do futebol tuga de maneira a condicionar os vários intervenientes e decisores do futebol português. Neste assunto não poderia estar mais pessimista. Se nos vários processos em que o rival lisboeta está envolvido não houver castigo exemplar, nunca mais seremos campeões, pois os corruptos irão promover ainda mais a benfiquização do país, a descarada.

Não penso que a alteração do modelo ou do número de equipas traga a competitividade que o nosso campeonato necessita. Antes destas alterações é preciso dar condições para que as equipas com menores recursos possam ter melhores condições nos seus estádios, melhores plantéis, maiores proveitos gerados pelo futebol para que possam crescer. Este deveria ser o principal objectivo dos nossos dirigentes.
Alguns estádios estão as moscas porque não proporcionam um espectáculo e uma experiência condizente com o valor despendido. Reduzir o número de equipas ou criar playoffs não trará a competitividade que o nosso pobre futebol necessita. É preciso mais. É a minha opinião.

7 – Qual o teu jogo mais marcante como Sportinguista? E qual o teu onze ideal, incluindo um técnico?
Dois jogos fazem parte dos meus maiores pesadelos enquanto Sportinguista: A derrota na final da Liga Europa com o CSKA em Alvalade, e a derrota na final da Taça de Portugal contra Académica de Adrien Silva.
O jogo mais marcante foi a vitória sobre o Salgueiros no Vidal Pinheiro e que nos deu o Campeonato após longo jejum. Foi o meu primeiro título em adulto.

Ora um 11… Schmeichel, César Prates, Valckx, Mathieu e Rui Jorge, Oceano, Balakov e Bruno Fernandes, Figo, Iordanov e Cristiano Ronaldo.
Para treinador pensei inicialmente em Augusto Inácio, mas por uma questão de memória e justiça…Bobby Robson. Teríamos sido Campeões com ele ao leme…

8 – JHC, supõe que estás a falar às massas Sportinguistas num momento importante. Qual seria a tua mensagem?
Sem saber de que momento importante falamos não é fácil fácil pensar numa mensagem. Mas sei que se algum dia concorresse e vencesse eleições no Sporting, agarraria na medalha que tenho guardada na mesinha de cabeceira, em busca de inspiração…

*às sextas, o Sonhador convida um tasqueiro para a mesa do canto e coloca-lhe uma mão cheia e meia de perguntas às quais não vale dizer talvez

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