Andamos à procura de adjetivos para classificar esta época do futebol do Sporting. Para uns se vencermos a Taça de Portugal é uma temporada bem sucedida, para outros só o título de campeão da Liga Nos encaixa nesse parâmetro. Outros há, que elevando a importância financeira da entrada na Champions League, definem este ano como apenas mais um em que cavaremos o fosso, já evidente, para com os nossos rivais. Acho a discussão interessante, mas depende muito de como avaliamos o que estava ao alcance deste plantel, desta estrutura, deste clube.

Devo manifestar que a minha visão do que é o Sporting e o meu sportinguismo nunca me permitirá ficar satisfeito com a conquista de Taças internas ao ponto de conseguir convencer-me que os objetivos foram alcançados. A meu ver, não foram. Existem de facto atenuantes, factores que dificultaram a nossa tarefa mais que aos nossos rivais. Um plantel a que foram retirados muitos argumentos de qualidade, com compensações financeiras impossíveis de serem usadas para restitui-la, seria sempre um handicap que diminuiria as probabilidades de sucesso.

Se a isto juntarmos um novo corpo directivo, uma nova estrutura e uma governância provisória completamente despropositada e uma massa adepta completamente dividida e exaurida pelas humilhações do final da época passada, temos os ingredientes perfeitos para desculpar qualquer fracasso. Mas não devemos optar por esse caminho. Não podemos. Escolher os abrigos confortáveis dos erros e das dificuldades não é um acto de construção sólida, mas sim um recurso para disfarçar incapacidades crónicas e adiar a sua superação ou solução.

E no Sporting há muito a resolver, antes de ser possível construir. Entendo a tentativa deste corpo directivo de construir sobre as cinzas, de ignorar as queimaduras e até estabelecer uma nova ordem assente na ideia de que evitar os erros passados, fazendo tudo diferente. É uma estratégia que se está a comprovar errada. O clube sobreviveu, continuou, mas fê-lo diminuído. Acima de tudo porque a mensagem de união, transmitida aos sócios pela lista vencedora, esvaziou-se num nada desde o dia da eleição. Varandas e seus pares cuidaram das finanças, das equipas, dos contratos, das instalações. Descuidaram talvez do mais importante que tinham a fazer – olhar para os adeptos do Sporting.

Se o tivessem realmente feito, teriam evitado muitos dos erros que cometeram desde Setembro até agora. O mandato desde CD tem sido uma enorme e completa negligência comunicativa. O Sporting não fala para os seus adeptos, não os envolve, não os motiva, mantém os processos de marketing a funcionar na mesmice habitual de todas as anteriores direções e sobretudo revela uma incrível limitação em entender que todo e qualquer projecto ou crescimento não resultará do que a Direção faz sozinha, mas sim com a adesão do universo leonino.

O ponto de partida deste mandato deveria ter sido sempre a conjugação de uma comunicação humanizada com hábeis desenvolvimentos de canais próximos e assentes em emoções transversais. Diminuir a desconfiança, atenuar a hostilidade, desarmar as visões divisionárias e construir um Sporting à volta do que une os sportinguistas. Ao invés, preferiram o silêncio, ignorar e até esnobar os adeptos mais insatisfeitos com o resultado eleitoral, saíram o mais possível do papel de liderança dos sócios, deixando-os a degladiarem-se nas redes sociais e em outros espaços de debate, imaginando que todas as peças se encaixariam por artes mágicas de resultados que não eram sequer previsíveis.

Aos dias de hoje, é inadmissível este CD ainda não ter entendido a extensão da amputação que fizeram ao seu próprio sucesso. Ainda não entenderam que era necessário a Varandas ser visto como um líder operacional, deixando as mensagens a quem as conseguisse potenciar. Ainda não entenderam que o caminho para pacificar o clube é deixar de enfrentar o passado como fantasmas que lhes podem assombrar o futuro. Ainda não entenderam que escutar as mais críticas opiniões é tão mais valioso que escutar os elogios. Ainda não entenderam que o objectivo deles é superar as dificuldades do clube e não as suas.

Temo que o tempo para fazerem estas reflexões e mudar esteja a esgotar-se. Temo que estejam cada vez mais dependentes dos resultados do futebol. Temo que tenham enormes dificuldades (nem todas por culpa própria) em construir a imagem de confiança e de caminho que uma Direção deve ter com a massa associativa. Isolaram-se nos gabinetes da SAD, colocaram avisos para não fazermos barulho e trabalham dentro de poucos metros quadrados de realidade leonina. A limitação do que poderiam ser, passará em pouco tempo para a ínfima parte do que precisariam ter sido.

E o mais infeliz de tudo isto: leriam este texto e acredito que entenderiam pouco do seu significado e urgência.

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca