Leonardo Mendonça da Rosa, mais conhecido por Léo Jaraguá, conquistou a Liga dos Campeões de futsal pelo Sporting, precisamente contra a sua anterior equipa, o Kairat. Aos 31 anos, este brasileiro que se tornou cidadão do Cazaquistão, país onde jogou durante nove anos, confessa que a adaptação a Portugal e ao Sporting foi mais fácil do que estava à espera e acrescenta que está maravilhado com os adeptos leoninos

Nasceu em Jaraguá, no Brasil. É o irmão do meio. Os outros dois são ambos rapazes?
Sim, um é mais velho e o outro mais novo. Do mais velho, faço 3 anos de diferença e, do mais novo, 7.

Só o mais novo é que também joga futsal?
Atualmente sim. O mais velho jogou mas parou já faz tempo.

E o seu pai, também jogava?
O meu pai foi atleta de futebol de 11 e é professor de educação física. Ele sempre nos incentivou muito para o desporto. A minha família nunca teve muitas condições financeiras e o desporto foi um jeito de ter uma educação boa. Na cidade onde morava quem era atleta ganhava bolsas de estudo para estudar nos colégios particulares. Então além de tudo foi o jeito de ter uma boa educação, não tendo muito dinheiro.

Qual foi o primeiro desporto que lhe despertou o interesse?
Sempre joguei futsal, desde os 5, 6 anos de idade.

Nunca pensou jogar futebol de 11?
Tentei, quando tinha 13 ou 14 anos, fui ao Figueirense, para fazer testes, fiquei uns 15 dias, já não me lembro exatamente. Mas o meu negócio é mesmo o futsal.

Não gostou?
Não sei se fui eu que não gostei ou se não gostaram de mim, mas fiquei no futsal porque a cidade onde cresci tinha uma equipa de futsal muito forte. Por isso a minha base é muito boa. Tanto que uma das maiores e mais conhecidas equipas de futsal do mundo é a Malwee de Jaraguá. Eu cresci numa cidade que é um dos berços do futsal do Brasil. Isso levou-me a continuar no futsal, a gostar muito da modalidade e, como falei, também por causa das outras coisas envolvidas, nomeadamente a questão financeira.

Quando é que percebe que quer fazer do futsal a sua profissão?
Em 2009, quando saí dos juniores para sénior, pensei em deixar de jogar porque não estava a conseguir arranjar uma equipa e o salário não correspondia à idade com que já estava. Pensei em tentar mais um ano e se não correspondesse parava de jogar. Nesse meio tempo oguei um torneio de verão, de 15, 20 dias e a equipa da cidade onde morava pediu para eu voltar para lá. E eu que pensava que iria parar de jogar, decidi voltar para a minha cidade, assim jogava em casa, ganhava algum dinheiro e logo via no que é que dava. Fiquei um mês nessa equipa, eles queriam emprestar-me, eu não aceitei e fui para uma outra equipa onde só recebi um mês de salário. Mas depois tudo começou a encaminhar-se. Fui para uma equipa onde apesar de não ter recebido durante 5 meses, foi onde conheci um dos atletas que hoje é meu padrinho de casamento, o Andersen, que foi para o Cazaquistão e me indicou. No final de 2009 fui para o Kairat, do Cazaquistão. Tinha 22 anos e fui ficando.

Nessa altura, a nível de estudos, ainda estava a fazer alguma coisa?
Não, já me tinha formado. Sou formado em educação física.

Vai sozinho?
Eles no Kairat contratavam dois, três jogadores por época só para jogar a UEFA, então fui só para jogar um mês. Nessa UEFA, em três jogos, fiz 4 golos. O presidente gostou e fez uma proposta de três anos de contrato. Mas eu nunca pensei ficar no Cazaquistão. Voltei para o Brasil e pensei: “Vou voltar para o Cazaquistão e ficar lá três anos sozinho?”. Na época tinha conhecido a minha esposa, Renata, há uns três ou quatro meses, tínhamos começado a namorar, então falei para ela: “Só vou se tu fores comigo”. E ela foi comigo, aceitou o desafio e a gente ficou lá.

O que fazia profissionalmente a sua mulher?
Tinha acabado de se formar na faculdade de gastronomia. Mas eu falei: “Eu vou se tu for” [sic]. O pai dela falou: “Só vai se casar” [risos]. Aí ela falou: “Então a gente casa”. A gente namorou nem um ano e casou para poder ir para lá. Fomos os dois de aventura para o Cazaquistão.

Qual foi o primeiro impacto quando lá chegou?
Acho que a primeira coisa estranha foi o idioma. Não conseguia comunicar com ninguém, só com os brasileiros que lá jogavam. Fora dali não tinha vida social. Era um país onde mal se falava inglês, hoje já mudou um pouco, mas quando lá cheguei era complicado porque poucas pessoas falavam inglês. Outra coisa também foi o frio. A gente estava acostumado no Brasil, onde a mínima são uns 5 graus, às vezes zero, mas lá cheguei a apanhar temperaturas de menos 40 graus.

Como foi a passagem do futsal brasileiro para o do Cazaquistão?
Sempre tive treinador brasileiro e treinei com atletas brasileiros, mas, por estar noutro país, com outra cultura, levei uns dois anos para me adaptar ao Cazaquistão.

Adaptar-se a quê em concreto?
A tudo. Ao jeito do campeonato, às pessoas, à vida. Querendo ou não, a minha vida resumia-se a ficar dentro de casa, ir ao shopping, casa, shopping, casa… E no Brasil, como aqui em Portugal, a gente gosta da rua. Gosta de ir à praia, de ir ao parque, então isso no início custou-nos, a mim e à minha esposa, que estava um pouco infeliz, porque ela não fazia nada, passava o dia dentro de casa. Custou.

Chegou a pensar em vir embora?
Várias vezes, mas graças a Deus não vim. No final deu certo, mas no começo foi bem complicado.

A Renata voltou a trabalhar?
Não, por causa do idioma e porque ela tinha um visto que a proibia de trabalhar. Mesmo que quisesse fazer qualquer coisa, não tinha como.

Quanto tempo levou para aprender russo?
Uns três ou quatro anos para poder ter uma conversa além de algumas palavras. Levei um tempo.

Os atletas cazaques são muito diferentes dos brasileiros, na forma de jogar e de ser?
São. Culturalmente são um povo mais fechado, até pela história deles, da União Soviética. Quando tu chegas, tens de aprender a respeitar os costumes deles, se não eles também não te respeitam. E eles têm uma coisas… são ignorantes num ponto. Se tu baixas a cabeça, parece que eles continuam sendo assim e se tu bates de frente com eles em alguns momentos, eles acabam por ceder e por te respeitar. Então esse tipo de coisa também é bem diferente do Brasil.

Foi campeão todos os anos no Cazaquistão. Já tinha sido campeão no Brasil?
No Brasil já, mas não efetivamente jogando. Era júnior e às vezes jogava pela equipa principal, o Malwee, que ganhou o campeonato nacional.

Qual foi o primeiro título que mexeu mais consigo?
Acho que foi o primeiro de importância do Cazaquistão, porque o nacional do Cazaquistão na época era muito fraco, hoje está melhor, por isso o primeiro foi o 3º lugar na Taça UEFA, em 2011. A gente sediou a UEFA no Cazaquistão e na época a gente perde a meia-final para o Sporting e ganha o 3º lugar do Benfica, nos penáltis. Esse para mim foi a primeira conquista importante no Cazaquistão, porque para o Kairat chegar a um 3º lugar é um feito muito grande. Eu joguei seis finais fora, fui 3º colocado, já fui 4º, vice-campeão e fui três vezes campeão.

Em 2011 tem pela primeira vez contacto com o Sporting. Com que imagem ficou?
De um grande clube. Já se notava a dimensão de todos eles, também do Benfica na época, eram diferentes de nós.

Conquista em 2013 a primeira taça UEFA. Houve uma evolução muito rápida no Kairat. Como explica?
O presidente do Kairat tinha um plano de cinco anos para ser campeão europeu. Ele começou com um investimento que foi crescendo gradativamente até chegar no quinto ano de investimento dele e ganhamos a primeira Taça UEFA.

Qual foi a sensação de ganhar uma taça UEFA?
Tinha 24 anos e nunca imaginei jogar a UEFA, ainda mais apanhámos o Barcelona numa meia-final, e o Dínamo de Moscovo que era uma equipa muito forte na final e ganhámos. O Kairat era o patinho feio da competição. Então foi uma felicidade. Todo o mundo falou que a gente ganhou por causa da sorte e só a gente sabia na época o quanto tínhamos trabalhado para ganhar.

Em 2015 voltam a ganhar e o Léo destaca-se.
Fiz quatro golos na meia-final e duas assistências para golo na final. Fui eleito o melhor jogador da meia-final e o melhor jogador da final.

O que contribuiu para isso acontecer?
A equipa do Kairat evoluiu bastante. De 2013 para a frente a equipa tinha muita gente nova e fomos evoluindo. Foram feitas contratações de peso, o que ajudou a crescer o futsal. Foram as mudanças que aconteceram na equipa, que ficou mais profissional. Houve mudança de treinador, de formas de trabalho, de mentalidade também. Passou de uma equipa que teve sorte para uma equipa respeitada a nível internacional. Acho que foi isso que mudou. Foi um momento em que estive muito bem na minha carreira e culminou com essas conquistas pessoais.

Veio emprestado para o Sporting, em 2016/17. Como é que isso acontece e porquê?
Quando vim emprestado, tinha mais dois anos de contrato com o Kairat, só que a situação familiar na época não era a melhor porque a minha esposa já não estava aguentando mais estar lá. Através do Marcão, um guarda-redes que jogou comigo no Kairat e veio para Portugal, ele perguntou-me se eu tinha interesse em vir. Falei que tinha e dali para a frente o empresário entendeu-se com o presidente do Kairat, com quem sempre tive uma relação muito boa. Na época expliquei-lhe que a minha esposa não estava feliz e por isso pessoalmente eu também não e ele com um gesto de bondade, de carinho para com a minha pessoa falou: “Léo, vai lá, passa um ano e depois volta”. E foi o que aconteceu. Vim e fiquei um ano.

Já tinha estado em Portugal?
Só para jogar o UEFA 2015.

Qual foi a sensação? Como é que correram os primeiros meses?
Costumo falar que Portugal é o Brasil na Europa, para nós foi uma adaptação muito fácil. A língua não precisa aprender, os costumes são muito parecidos, também tem muito brasileiro aqui em Portugal. Para quem morou no Cazaquistão vir morar para Portugal é muito fácil [risos].

Em relação à equipa do Sporting, o que veio encontrar era o que estava à espera?
Foi melhor do que que estava à espera naquele ano. Já falei, foi a melhor equipa com quem já treinei.

Porquê?
Porque me sentia muito bem na equipa. Sentia-me feliz, não conquistámos a UEFA naquele ano mas eu senti-me muito feliz com aquela equipa. Tanto que fiz de tudo para voltar para cá.

O balneário do Sporting era muito diferente do do Kairat?
Sem dúvida. Era um balneário leve, que a galera brincava um com o outro o tempo inteiro, a galera era feliz ali dentro. Como a gente costumava falar, parecia uma família, tinha as suas turbulências, as suas confusões, mas eu sentia-me bem. Porque acho que passei por tantas coisas no Kairat, por causa dos costumes deles, dos problemas deles, talvez os problemas daqui não me afetavam.

Que problemas foram esses?
O atleta, e isso não exclusividade do Kairat, mas aqui é menos, o atleta é muito moeda de troca. Quando a gente está bem, vale muita coisa e quando a gente não está bem, é normal ser mandado embora, ser trocado. Mas no Kairat por vezes eles não respeitavam os contratos e essas coisas começaram a afetar-me negativamente. Amigos meus a serem prejudicados e isso afetava a família deles….Eu não conseguia mais ficar indiferente. Aqui é diferente.

Passou-se alguma coisa diretamente consigo lá?
Só no último ano. Tinha mais um ano de contrato e o pessoal falou que estava livre, depois não estava. Depois tive que pagar uma multa que até então não era preciso pagar…

Quando chegou ao Sporting teve de alterar a sua forma de jogar?
A equipa do Kairat tinha características de jogar com o guarda-redes avançado, de defender em zona, características completamente diferentes e aqui muda tudo. É um campeonato mais competitivo, é um tipo de jogo diferente, é uma marcação individual, o guarda-redes não sobe tanto.

Custou-lhe a adaptação?
Pensei que iria custar mais, acho que consegui adaptar-me rapidamente.

Gosta mais deste tipo de futsal ou daquele que praticava no Cazaquistão?
Gosto dos dois tipos. Cada equipa tem o seu método de trabalho, cada treinador tem o seu método de trabalho. Os dois têm o seu lado bom e os seus lados negativos.

Com que ideia ficou de Nuno Dias, treinador do Sporting?
É um treinador muito exigente, que tenta sempre tirar o máximo dos atletas e eu gosto disso, apesar de muitas vezes não concordar e ficar incomodado com aquilo no momento, mas a gente sabe que lá na frente, a gente vai colher os frutos. Da primeira vez que vim para cá achei isso, que era um excelente treinador.

O que é que aprendeu mais com o Nuno e a equipa?
A jogar sem a bola. A movimentar sem a bola, cortar linhas de defesa. Defender individualmente. Jogar sem a bola foi o que mais aprendi.

Qual é o seu ponto mais forte enquanto jogador?
Acho que é defensivamente. A defender e na finalização são os dois pontos onde me destaco.

E qual é para si a mais-valia, o ponto mais forte deste Sporting?
É o jogo de equipa. Quando um jogador não está bem, tem sempre alguém decidindo, acho que o plantel do Sporting é muito forte e a equipa desde o treinador até ao 16º jogador, todos têm condição de jogo. E isso faz muita diferença.

Veio emprestado um ano, depois volta mais uma época ao Kairat e regressou esta época. Esta foi a terceira final do Sporting na agora intitulada Liga dos Campeões. O que foi diferente desta vez para o Sporting conseguir a taça?
Acho que as experiências passadas ajudaram muito. Em 2017, chegar à final contra o Inter, depois de fazer um grande jogo na meia-final, e ‘tomar’ 7-0 foi a pior derrota e a pior vergonha para qualquer atleta que ali esteve.

Como explica aquela derrota tão pesada?
Não sei o que aconteceu, mas foi uma sensação muito ruim que todo o mundo teve após o jogo e para mim particularmente foi a pior derrota na minha carreira. Prometi a mim mesmo que não voltava a acontecer. Não daquela maneira que foi, poderia perder jogo, mas não assim. Calculo que cada um dentro de si, deve ter falado, posso perder, mas não da maneira que foi. Em 2018 perderam outra para o Inter e acho que isso deixou mais aguçado o sentimento de que vai chegar uma hora que tem de ser nossa, se chegámos duas vezes seguidas à final. E esse ano foi um ano diferente porque começámos o ano mudando 40% do plantel. A meio do ano saímos da Taça da Liga ao perdermos com o Eléctrico e todo o mundo já achava que a equipa não era aquilo que foi. Não todos, mas uma grande parte da torcida já não tinha a mesma confiança na equipa, deu uma estremecida e acredito que a partir do jogo com o Benfica que gente ganha em casa por 6-1 e depois vai ganhar a Taça de Portugal, o pessoal começa a unir-se, começa a mudar o pensamento e chega lá na UEFA com uma vontade de que esse ano é nosso, não adianta. Seja o Inter, seja quem for, esse ano tem de ser nosso, a gente sai com a vitória. Acho que foi esse pensamento e as experiências que tivemos anteriormente que levaram ao título.

Houve diferenças também da parte do treinador?
Acho que o diferente foi a maneira como foram conduzidos os jogos. A gente chegou com toda a confiança do staff em nós e nossa para eles. Sempre houve essa confiança mas acho que nesse ano teve algo a mais. A gente se uniu de tal forma que não iam tirar de nós esse título.

Houve algum momento no jogo em que perceberam “isto está ganho” ou, pelo contrário, algum momento em que ficaram receosos e a pensar “vai acontecer outra vez, não vamos ganhar”?
Não, tanto é que quando sofremos o primeiro golo do Inter, a gente não baixa o nível de concentração. Logo de seguida a gente empata o jogo, e mais para a frente leva o jogo da nossa maneira, não como nos outros anos em que eles é que conduziam o jogo. Nesse ano, tanto na meia-final, como na final, quem conduziu o jogo fomos nós. E aí a gente chega e faz o golo, acredita naquilo. Nos olhos de todos estava, este ano não é para eles, este ano é nosso.

Das três Taças europeias que já tem no currículo, esta foi a mais importante?
Acho que cada conquista tem a sua importância, mas com certeza diferente pela dimensão que o clube tem. É diferente jogar numa equipa como o Kairat, que praticamente não tem torcida. Num clube com a dimensão do Sporting, chegas e ganhas por esse clube, é a primeira, e logo quando muda a nomenclatura da competição, a sensação é diferente, até porque ganhas por um clube de nome.

Que importância é que têm os adeptos para um jogador de futsal?
No primeiro ano em que estive aqui, nunca tinha visto nada parecido, nunca tinha jogado num clube assim. A gente está a jogar contra o último colocado e temos 1.500, 2.000 pessoas no pavilhão. A gente foi jogar contra o Benfica e classificamo-nos muito por causa deles. Porque tu estás ali naquele stress, as pernas começam a cansar e escutas os adeptos cantando, ou vem alguém dar motivação. Eles estão sempre ali. E tem uma coisa diferente aqui, seja no futsal, no hóquei, seja andebol, eles estão sempre lá. Não é uma coisa só do futebol de campo. Eu acho isso diferente de tudo o que já vi.

É muito diferente a forma de festejar aqui da que viveu no Cazaquistão?
É. Começa logo com a gente chegando no aeroporto e não podendo sair por causa da polícia, porque já tem adeptos esperando a gente sair do aeroporto. Seguimos para a câmara municipal e já tem um monte de adeptos. Depois a gente vem para pavilhão, numa segunda-feira e tem 3.000 pessoas no pavilhão para festejar com a gente. É completamente surreal isso.

Tem contrato por mais uma época. Depois disso, gostava de cá ficar?
Gostaria de encerrar a carreira aqui. Agora isso depende muito do que acontecer daqui para a frente. Hoje está tudo muito bem, conquistamos a UEFA, estamos naquela euforia, só que isso leva muito do momento. O atleta vive do momento. Eu particularmente gostaria de jogar aqui até acabar a minha carreira.

Quando pensa que isso irá acontecer?
É até o corpo aguentar. Gosto muito de jogar futsal, gosto muito do que faço, portanto enquanto o meu corpo permitir. Tento ficar preparado e enquanto eu conseguir jogar em alto nível quero continuar a jogar. No momento em que eu vir que não aguento mais eu paro de jogar.

Tem algum clube de sonho em que gostasse de jogar?
Não, porque eu cresci num clube de sonho lá no Brasil, o Malwee. Para mim aquela foi a equipa dos sonhos. O melhor jogador do mundo, o Falcão, jogava lá. Um dos melhores fixos do mundo estava lá.

Este fim de semana começou o playoff do campeonato e o Sporting venceu a Quinta dos Lombos, com quem perdera já perdera pontos esta época. A equipa colocou rapidamente os pés no chão?
Sim. É natural a gente dar uma relaxada, ainda mais com a dimensão da conquista que tivemos há pouco mais de uma semana. Mas a gente fez história e queremos continuar fazendo. Seria a única equipa de futsal a conseguir o tetra campeonato. Acho que esse é o foco que leva a gente a pôr o pé no chão rapidamente e seguir forte daqui para a frente.

Entretanto foi pai.
Também. O meu filho Pietro nasceu a 16 de março de 2018, no Brasil.

Fez questão que nascesse lá?
Sim, porque eu estava no Cazaquistão e a minha esposa teve de tomar injeções todos os dias durante a gravidez, porque teve uma gravidez de risco. Por isso preferi que ela ficasse no Brasil. Eu fiquei um ano inteiro no Cazaquistão, longe, e não acompanhei a gravidez da minha esposa. Foi um ano muito difícil, custou-me muito. Fiquei o ano inteiro a ter lesões. Acho que foi mais psicológico do que qualquer outra coisa porque nunca fui um atleta de ter lesão. Foi uma sequência de lesões, acho que mais por fatores psicológicos.

Chegou a jogar com o seu irmão Daniel?
Sim, joguei com o meu irmão mais novo na época passada. Para mim foi a realização de um sonho que tinha desde criança. Com o mais velho joguei contra na época de base, mas jogar junto com um irmão é muito bom. Foi o primeiro ano dele fora do país. Ele morou comigo quando eu estava sozinho no Cazaquistão, consegui ajudá-lo em alguns momentos, com o idioma e tudo o mais. É muito gratificante jogares com o teu irmão, é muito bom mesmo.

Porque é que decidiu mudar a sua nacionalidade e tornar-se cidadão do Cazaquistão?
Quando fui para o Cazaquistão, não tinha jogado quase em lugar nenhum. Não era conhecido em lugar nenhum e eles deram-me essa oportunidade depois de dois ou três anos. Perguntaram-me se eu gostaria e na época não vislumbrava a seleção brasileira e também era uma oportunidade de defender um país que me acolheu muito bem, que me deu tudo o que eu tinha. Prontamente disse-lhes que aceitava e que teria o maior prazer de jogar por eles. Foi então que joguei no Campeonato Europeu, no Mundial e defendi com muito orgulho o Cazaquistão. Ganhei uma medalha de bronze no Europeu de Seleções em 2016.

A sensação é diferente ou estes momentos agora da Champions são mais intensos e importantes?
É diferente, porque o Cazaquistão nunca tinha jogado nada parecido e não jogava com muitos estrangeiros. Era eu, o Higuita e o Douglas naturalizado, o resto era tudo atleta do Cazaquistão que nunca teve muita expressão no futsal mundial. A gente chega ao Europeu e fica em 3º, faz um jogo de meia-final contra a Espanha muito bom e coloca o Cazaquistão definitivamente no mapa do futsal.

Qual é o jogador com quem se entende ou entendeu melhor em campo?
Acho que foi com o Alexandre Pintinho que jogou comigo no Kairat. Eu já sabia o que é que ele ia fazer de trás para a frente. E com o Higuita também. Joguei com eles sete anos.

E para si qual é o melhor jogador do mundo?
Hoje, o Ricardinho, sem dúvida.

Porquê?
Não sei, mas para mim é. Pelo o que ele faz com a bola, por aquilo que já ganhou, por tudo o que representa hoje para o futsal.

Qual foi a primeira tatuagem que fez e tinha quantos anos?
Tinha 18 anos e fiz os meus pais nas minhas costas.

Há alguma que tenha um significado mais especial?
Tenho o nome do meu filho no meu braço, com a data de nascimento e tudo o mais, e tenho o nome da minha esposa tatuado com uma seringa e 305, que é o número de injeções que ela tomou durante a gravidez.

Um dia, mais tarde, a sua ideia é voltar ao Brasil?
É, porque quero ficar perto da minha família, dos meus pais, quero que o meu filho tenha esse contato com a família. Coisa que eu já não tenho há 10 anos. Não tenho esse contato físico, pessoal com a minha família há muito tempo.

Não costuma visitar o Brasil?
Sim, mas é só um mês por ano. Vou nas férias mas não é a mesma coisa que conviver.

O que é que se vê a fazer no futuro?
Gosto muito de futsal, gostaria muito de trabalhar com o futsal. Não digo como treinador, mas gosto da gestão desportiva, gosto muito de conviver com o meio desportivo.

entrevista original publicada no Expresso