Nos últimos tempos, a agenda do Sporting tem vindo a ser marcada por um debate, bom… se calhar é melhor chamar-lhe confronto de opiniões (que chamar “debate” ao que o universo leonino faz, é capaz de ser um elogio imerecido) sobre o que significa “poupar” recursos financeiros na construção do plantel de futebol profissional.

Numa posição mais racional e pelos visto nesta inclui-se a própria Direção do clube, está estabelecido que existe um limite de verbas e toda a definição do plantel terá de encaixar neste tecto. Cortar a direito mesmo em jogadores que tenham sido estratégicos num passado recente é um gesto que tem sido prática, mesmo que ainda recaiam sobre esses ativos a esperança que uma coincidência tática e bem estar psicológico os devolvesse a patamares exibicionais compatíveis com altos salários.

Não é segredo que este CD, desde que tomou posse viu em alguns jogadores, nomeadamente aqueles que estavam no topo das maiores remunerações, alvos daquilo que cedo começámos a ver chamado de “poupança”. Nani saiu, Mathieu deve ter diminuído a sua massa salarial, Battaglia, Acuna e Dost à mínima oferta razoável seguiriam o seu caminho. A decisão porém não parece ter tido alicerces apenas na aviação da despesa. Houve factores de carácter desportivo que entraram também neste rastreio. Problemas disciplinares, falta de evolução, instabilidade psicológica, cada jogador escolhido para ser “artigo de poupança” exibe factores que esta SAD considera aconselhadores de uma venda.

Racionalmente esta estratégia de gestão de ativos é aceitável e pode, caso seja uma prática levada em frente de forma absolutamente coerente, dar os seus frutos, numa espécie de seleção natural bastante depuradora que acabará num futuro próximo com um lote de atletas mais homogéneo e competitivo. Mas, há sempre um mas, também depende que não só os que permanecem preencham a check list de qualidades, mas os que entram também. E é aqui, que a coisa pode se tornar infinitamente mais complexa e falha. Se colocarmos 10 atletas fora do plantel, outros 10 terão de entrar. Como é extraordinariamente difícil “conhecer” totalmente um jogador antes de o ter a competir num ambiente desportivo específico, a capacidade de nos 10 que entram poderem permanecer pelo menos 5, será decisiva.

Um excelente scouting pode ajudar a acertar mais do que um scouting apenas razoável. O meu receio é que, neste momento, mesmo que tenham existido melhorias, o Sporting esteja a jogar um jogo de altíssimo risco na confiança que um departamento ainda pequeno e com tudo para provar, descubra pérolas que venham a preencher o lugar das vedetas que identificámos como demasiado caras para o nosso projecto. O equilíbrio e sustentação de todo o mandato de Varandas pode balançar no sucesso de um departamento de 3 ou 4 pessoas que influirão na escolha de quem substitui Dost ou BF (caso saia).

A mostra das recentes escolhas (Borja, Ilori, Doumbia, Luiz Phellype e Neto na época passada – Rosier, Eduardo, Camacho, Plata, Vietto nesta época) não são nem espetaculares, nem catastróficas. Mas preocupa-me que nenhum deles tenha provado ser bastante melhor que os jogadores que os antecederam, os tais jogadores que saíram para lhes dar o seu lugar. Borja não parece talhado para mais que uma 2ª linha. Ilori foi um erro. Doumbia dá sinais positivos, mas para já precisa de jogar para conseguirmos um tirocínio mais concreto. LP serve perfeitamente como opção ao avançado de referência e Neto pode muito bem ser o substituto de um Mathieu no declínio das suas capacidades (sobretudo físicas).

Para já é justo que não sejam feitas grandes avaliações aos recém entrados, apenas direi que nenhum aterrou na titularidade, o que juntando ao que escrevi sobre o primeiro lote, podemos concluir que, até agora (sublinho esta condição) descobrimos soluções, mas não as estrelas. Essas continuam a ser Coates, Mathieu, Bruno Fernandes, um lote cada vez menor de VIP’s. Pode argumentar-se que o mercado do futebol evoluiu e que seja cada vez mais difícil surgirem as Cinderelas de verão. Aqueles jogadores que vinham de um clube pequeno e assim que vestiam a camisola tornavam-se maiores, conquistavam os adeptos e os treinadores e ao fim de poucos jogos eram certezas inabaláveis.

Todos os clubes sabem melhor o que valem os seus ativos e já não há mercados fáceis em parte alguma do planeta. O Sporting tem a particular dificuldade de ter poucos recursos financeiros para o mercado de jogadores que precisa. Será expectável que se exija mais ao scouting leonino? Confesso que não sei ainda a resposta, mas tendo a ver a questão por outro prisma. Será mais fácil, tanto quanto a qualidade e a quantidade de pessoas a fazer este trabalho seja correspondente à importância do que se decide, e pelo que é possível entender, continuamos a caminhar lentamente nessa direção.

Outro dado que não pode ser colocado fora desta ponderação é o comando da equipa. O treinador é uma pela fundamental. Pode fazer crescer jogadores, quer através de bons resultados, quer através da escolha de táticas que potenciem o desempenho dos atletas, pode até conseguir evoluir as qualidades individuais de cada um através de treino específico. Confesso que Keizer tem trazido pouco mais que estabilidade e alguma adaptação ao contexto da nossa Liga, mas há muitas áreas onde não consigo ver mais valias, sobretudo na vertente tática e solidificação de processos da equipa. Os jogos passam, os meses decorrem e o Sporting é uma equipa bastante frágil fora do seu terreno, mais confiável em Alvalade, mas ainda assim completamente irregular.

É Keizer que não consegue fazer crescer o plantel ou serão os jogadores que não ajudam Keizer a conseguir esse objectivo? Serão ambos os problemas? Deve-se mudar o treinador ou dar-lhe melhores jogadores? Deveríamos fazer ambas as coisas? Estas são as minhas dúvidas. Questões que penso ser muito mais importante de responder antes de decidir “poupar” no salário de um jogador.

PS – Vejo tantas certezas em tantos adeptos do Sporting que parecem saber exactamente o destino de tudo e de todos no clube. Eu cada vez tenho mais dúvidas.

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca