A saída de Bas Dost preocupa-me de forma diferente a muito do que li nas reações do universo leonino. Muitos indignaram-se pelo valor, que é manifestamente pouco. Outros pelo ping-pong público de argumentações sobre comissões e as suas legitimidades. A mim assusta-me a forma como o nosso clube consegue pegar num goleador identificado com o clube e com números para lá do que seria agradável e em 3 actos conseguir arrasar o seu valor de mercado, além da viabilidade ou vontade de o manter.

Sei que muitos ao ler isto vão argumentar que presidente x fez isto, presidente y fez aquilo… como se tivéssemos o luxo de estancar problemas em slots sem observar que cabe sempre ao mesmo clube e aos mesmos adeptos o pagamento de todas estas facturas. A verdade é só uma. Dost era um valor seguro da equipa, os adeptos idolatravam-no, dava pontos e soluções à equipa. No momento em que seguiu para o Eintracht era um jogador em conflito aberto com o clube, com 30 anos, a um passo de treinar à parte do restante plantel, com meses de notícias publicadas a dar conta da vontade do clube em transferi-lo.

A culpa, ou quem a terá satisfaz-me pouco nesta altura. Não resolve nada, apenas afunila o debate num apontar de dedos que nos retira o foco das soluções, do futuro, do que precisamos que o Sporting seja, do que queremos que aconteça aos goleadores que se seguirão ao ex-internacional holandês.

Entendo o argumento de Bas Dost ter um salário incomportável pelo clube, ou seja, sou sensível ao argumento de que a SAD não pode ter este tipo de encargos (próximo de 6 milhões por época) com apenas um jogador. Mas para aceitar que daí a ser solução alienar o seu passe vai um longo e penoso passo. Quanto custará aos cofres do Sporting o conjunto dos salários de Jefferson, Viviano e André Pinto? Não deveriam ser estes os cortes “custe o que custar”? Não sou ingénuo, sei que é muito mais difícil encontrar emblemas interessados em aliviar a nossa folha salarial com estes “ativos” do que com Dost. Mas pergunto-me se qualquer direção do clube estará lá só para resolver as partes fáceis, se não é com estas “proezas” que se vinca a qualidade dos dirigentes, se não é conseguindo o que não é “fácil” que se conseguirá fazer crescer o clube e a equipa de futebol.

Se cada corpo dirigente “apenas” conseguir atingir o óbvio e o trivial, onde estarão todos os “mais” ou os “muito mais” com que vamos melhorar em cada época? Onde estará o “mais” que o 3º lugar? Onde estará o “mais” que x na venda de um jogador? Onde se encontra o treinador que dará “mais” que o que a equipa parecia conseguir dar? Meus caros amigos, quero fazer-me entender bem nesta questão: não digo que seja fácil ou acessível neste momento a quem quer que estivesse no comando do Sporting fazer-nos aproximar do patamar dos nossos rivais ou melhorá-lo. Mas não é para atingir a meta sempre abaixo deste desígnio que elegemos uma direção.

Creio que começa a escassear a esta direção o tempo de mostrar que consegue “mais” e “melhor” que o resultado standard. A gestão de vários dossiers tem sido discreta, mas ainda assim difícil de distinguir as melhorias. O clube está mais estável? Sim, mas pergunto-me… à custa do quê? À custa do desapego dos adeptos? De silêncios longos e exasperantes? De menos participação dos sócios e adeptos na vida do clube? É um preço elevado. Um preço que se cobrará com juros a cada mau resultado da equipa de futebol. Um preço que tem pouco lucro por onde descontar algum prejuízo.

Não adianta cair em histerias de destituições ou pedidos de AG’s. Foi um erro no passado, sê-lo-á (sem provas de má conduta e gestão lesiva factuais) neste momento, mas convém avisar as hostes que depois do que aconteceu no ano anterior, estamos longe de ser uma casa arrumada, habitada por gente serena e paciente. O tempo será sempre curto, o caminho demasiado estreito e percorrido com todas as adversidades possíveis. Mas, se há coisa que um dirigente eleito do Sporting não pode alegar nunca em sua defesa é ter desconhecido esse cenário. Não há qualquer hipótese de olhar para trás e hesitar, mas sim arregaçar as mangas e meter os neurónios e muito suor ao serviço de muitas e boas ideias.

Quanto mais depressa Varandas entender que o Sporting é todo um admirável e perigoso Afeganistão, no qual ou ganha ou morre, mais rápido concluirá que precisa dos sócios, precisa de os entender (falando com eles e não dando as célebres reportagens e exclusivos) tanto quanto precisa de fechar a porta aos notáveis e às suas “preocupações” e “oportunidades”. O Sporting precisa urgentemente de vencer batalhas. Na banca. Nos campos. Junto dos patrocinadores. Contra alguns empresários. Contra um sistema de árbitros que literalmente goza connosco.

Para sair vivo destas lutas, precisará dos sócios, precisará da força social de todo um clube, precisará de evidenciar que não está sozinho num estádio sem espectadores. E neste momento, infelizmente, é um general sem exército, um almirante sem frota, o que torna o nosso emblema demasiado exposto e frágil. Não é o clube que tem de ir ao encontro de um presidente, é precisamente o contrário que terá de suceder, uma lição que já há muito que devia ter sido aprendida. O julgamento que “ganhando no campo” ganhas o clube é factual, mas o Sporting está neste momento longe de poder oferecer sucesso a alguém que meta as suas fichas nessa aposta. A probabilidade, infelizmente, é a inversa. Varandas se depender dos resultados desportivos, cairá, mesmo que empregue um esforço tremendo em baixar as expectativas (uma espada com um gume inverso demasiado afiado) cairá.

Voltando a Dost. O problema não é um jogador e os erros que possam ser cometidos na sua (des)valorização, mas sim a condição singular de uma direção que tem uma enorme dificuldade em convencer os seus eleitores que fez o melhor que poderia ter feito, que defendeu o clube no maior grau de eficiência possível. A venda do holandês será sempre cobrada, interessando muito pouco todos os descontos por erros oriundos do passado. A solução não é colocar na imprensa a soma das poupanças. A solução é contratar o melhor substituto ao alcance do que podemos pagar e em algum momento aproximar os sócios da gestão, para que se torne óbvio e credível tudo o que tivermos de fazer com os Dost futuros. A solução de Varandas não é ganhar jogos (mais cedo do que tarde, perderá) mas sim ganhar os adeptos.

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca