Cumpriu-se há poucos dias um ano de mandato deste Conselho Directivo e é tempo de fazer alguma apreciação ou avaliação do que tem sido a sua prestação. Ao escrever este texto, vou tentar ao máximo restringir a opinião a factos e não a achismos, o que nem sempre é fácil, nem popular nas novas dinâmicas de pensamento do universo leonino, recheada de “bombas”, desinformação e puxarabrasaàsardinhização.

Ponto prévio na análise, governar o Sporting é uma tarefa complexa, árdua e muitas vezes ingrata. Não há pausas para cafés, não há paz nem sanidade alguma, é uma montanha íngreme e cheia de lama…mas…quem se candidata e aceita liderar este clube (se tem estado atento à nossa história recente) aceitou o desafio, sabendo de tudo isto e sabendo sobretudo que de uma presidência do Sporting não se espera menos que genialidade e infalibilidade.

Pontos positivos

Estabilidade
Parece absurdo conceber que o último ano foi algo remotamente parecido com estável, mas se formos justos- qualquer tempo sem invasões à Academia, sem processos graves a chegar aos tribunais, escândalos diversos ou demissões em barda nos Órgãos Sociais seria sempre melhor que o passado recente. Este ano, não sendo o mar de tranquilidade que precisávamos, foi ainda assim mais estável que a verdadeira balbúrdia do ano anterior. Por poucos méritos que tenham ainda estes corpos sociais, cumpriram os mínimos olímpicos, não existindo fracturas ou discórdia no interior do clube ou da SAD. As duas renúncias no Conselho Fiscal ( um vogal efectivo e um suplente) não chegam para mudar o quadro geral.

Reestruturações pontuais
A necessidade de reformular vários departamentos quer da SAD, quer do Clube era da máxima urgência. Várias unidades de trabalho estavam desatualizadas, um deserto de qualidade e quantidade de recursos pairava pelos corredores de Alvalade, Pólo EUL e Alcochete. Não acho que o foi feito no último ano chega sequer para arranhar o nosso atraso monumental, mas ainda assim existiu uma razoável tentativa de passar da Idade da Pedra para, vá lá, a Idade Média. Não resolve, não acrescenta, mas é um passo na direção certa. Nem todas as reconstruções foram bem feitas, muitas apenas mudaram a cara, mas há que validar pelo menos a ideia e a decisão de repensar áreas estratégicas à operação deste enorme emblema.

Imagem e relações Institucionais
Há um lado perverso e francamente prejudicial ao Sporting que resulta do que vou escrever a seguir, mas ainda assim é apenas um facto que, à custa de uma diminuição brutal de capacidade e caudal comunicativo, o clube cessou a produção da fábrica de fazer inimigos e encaixou-se num lugar remoto da sala de aulas, um ponto onde pela inofensividade, se tornou mais fácil de dialogar com restantes clubes, empresários e talvez até empresas. Não existindo ainda lucro algum desta nova posição, era essencial criar uma identidade que permitisse a reconstrução da imagem externa do clube, mesmo acreditando eu que teria sido possível fazê-lo de uma forma bastante diferente, nota favorável nesta matéria, com muitas reticências quanto a danos paralelos que abordarei nos pontos negativos.

Manutenção do Investimento nas Modalidades
Não me vou estender muito neste parâmetro, até porque a nota positiva é apenas circunstancial e dada graças à continuidade transmitida ao trabalho do CD anterior. O mérito foi apenas não estragar, o que já é de enaltecer, pois muito do legado positivo deixado por BdC, foi desbaratado e incrivelmente desaproveitado. Existiram alterações pontuais, erros diversos e incompreensíveis, diminuição de orçamentos, mas nenhum acto de gestão que seja possível de considerar como uma prova de desinvestimento em massa nas Modalidades. E, por pior que isto soe, para mim já é positivo.

Pontos Negativos

Gestão do Futebol
Do “fácil, fácil…” passámos para o “…já está, já está”. Na verdade nem foi “fácil”, nem o que “já está” chega para nos dar algum tipo de esperança na capacidade deste CD saber colocar a SAD nos eixos. Os resultados são ambíguos e difíceis de classificar como bons ou maus. Para uns, conquistar 2 troféus numa época (face ao histórico das últimas décadas) é um sucesso. Para mim e muitos outros não serve, de forma alguma, como prova de habilidade e rumo certo. É claro que celebrei as vitórias, é óbvio que foi muito melhor vencê-las do que sair perdedor, mas muito honestamente, o mais importante ainda está por fazer. E o que é? É isto:

1- Ter uma linha de acção clara e transparente na construção do plantel principal. Ser evidente porque certos atletas são adquiridos e outros dispensados. Ter excelentes avaliadores de talento, óptimos gestores de talento e ainda melhores formadores de talento. Desde o atleta iniciante até à vedeta máxima do plantel profissional – o património tem de ser cuidado, trabalhado, motivado e orientado para ser um símbolo do Sporting. Um símbolo de excelência e qualidade.

2- Ser assertivo no investimento na Formação. Dizer e anunciar é uma coisa. Investir, defender e dar oportunidades é outra. Na minha opinião falta muito dinheiro à operação, enfermamos ainda em excesso de estrangeirite no scouting, sendo que há carências enormes de gente que saiba olhar para um ativo do clube e distinguir potencial efectivo de potencial subjetivo.

3- Compreender que sem jogadores diferenciados, não há resultados diferenciados. Trazer para o clube 20 pontos de interrogação é pior do que garantir 2 ou 3 pontos de exclamação. É necessário traçar uma linha de qualidade e não investir abaixo da mesma. Se não há recursos para adquirir 10 reforços de qualidade ideal, não contratem 10 jogadores que vão apenas encher plantel e tornarem em futuras dores de cabeça para voltar a colocar no mercado. O plantel está progressivamente a perder estrelas e a descer o nível de qualidade média das soluções. A este ritmo, facilmente nos tornaremos um clube grande com uma equipa pequena, incapaz de dominar jogos, atingir boas classificações, gerar ciclos positivos.

4- Se despedir Peseiro era uma obrigação, a escolha de Keizer revelou-se aquém do desejado. A SAD falhou sobretudo em compreender que para o perfil do holandês (comunicador monotónico, superficial, calmo e racional) se ajustasse ao futebol português e às necessidades do Sporting, teria de ser criado uma autêntica “guarda pretoriana” para colmatar aquilo que Marcel não dava aos treinos, à equipa, aos adeptos, à comunicação social. Na ressaca da saída de Keizer, criou-se uma espécie de preambulo de liderança na equipa – precisamente o pior remédio possível para curar as carências da equipa.

A insegurança, a desconfiança, a falta de apoio interno e novo paradigma técnico e tático, nunca poderá ser transmitido por um Leonel Pontes a prazo. Nunca poderá ser uma emulação do caso Lage. Falta o principal que sustentou Lage. Faltará sempre a Pontes os penaltis salvadores, autogolos dos defesas contrários, amarelos e vermelhos perdoados e sobretudo uma autêntica legião de bajuladores instantâneos na imprensa e redes sociais. Já nem vou explorar muito a forma como o plantel olhará para Leonel Pontes, chega-me perfeitamente a forma completamente frágil e inconsequente como jogámos no Bessa, onde apesar do esforço e e entrega evidentes, não atingimos sequer o vislumbre de que algo novo foi conseguido com 2 semanas de treino.

O autêntico “ver se cola” de Leonel é mais um erro de avaliação estratégica do momento, da carência e de como se mexe esta máquina chamada equipa grande de futebol em Portugal. Se o fazemos num compasso de espera por um treinador prestes a ser demitido (Vitor Pereira, Marco Silva, NES, Leonardo Jardim, Rui Faria, etc) o preâmbulo fica mais fácil de explicar, mas mais difícil de aceitar. O Sporting pode esperar por todos e acabar por garantir nenhum, algo que seria a repetição da nossa última janela de mercado. Esperar é um verbo que não se deve empregar no futebol, quem espera – perde. Quem hesita – sofre. Quem não ataca decidido um objectivo – passa fome.

Comunicação
Não vou bater no ceguinho (vou apenas retirar-lhe a bengala). Incompreensível como alguém alguma pensou que não dizendo nada, estaria tudo dito. Que o silêncio defenderia os nossos interesses. Que desaparecendo do mapa, encontraríamos um espaço onde nada nos iria ferir e teríamos tempo e espaço para lutar pelos nossos objetivos. Isto tem sido mais ou menos como atravessar a estrada com os olhos e ouvidos tapados, imaginando que por vestir trajes budistas e colares com o símbolo da paz, nenhum veículo nos iria atropelar.

Desde os homens do apito, a clubes credores, paineleiros e cavaleiros das insides mediáticas, empresários de bons ou maus jogadores, todos nos têm “passado a ferro” e exposto as magrezas comunicacionais. Não só temos sido atropelados sucessivamente, como ninguém parece muito importado com a nossa figura de hippie ensanguentado a tatear o asfalto, com a gravidade do maior alheamento vir precisamente dos adeptos leoninos, já mais desejosos que o corpo vire cadáver do que prontos ou disponíveis para prestar auxílio.

Apetece-me regularmente meter-me no carro, ir a Alvalade, entrar pela SAD e dirigir-me ao gabinete de Varandas e fazer-lhe algumas perguntas: “Caro Presidente, como é que um líder coordena um exército em batalha calado? Como é que um líder motiva as tropas a gaguejar (no pun intended)? Como é que se combatem os inimigos, deixando batalhões perdidos em campo sem armas? Imagino que me respondesse algo como “mas o futebol não é uma guerra”. Nessa altura, eu ria e rastejava para fora do gabinete, dirigia-me ao hippie vendado, dava-lhe a mão e procurava o primeiro autocarro em excesso de velocidade que garantisse uma rápida saída desta parábola infeliz.

Gestão financeira
Sobre a égide da poupança, vendemos os barcos e os cavalos. Empenhámos os Ferraris e leiloámos os quadros. Resultado? Passámos de muitíssimos endividados, para muito endividados. Alienámos demasiado para a poupança efectiva e acho que é óbvio que escapou a todos a emergência, não recebemos os avisos de corte de luz, passando literalmente das mensagens de confiança para um enorme e velado “Houston we have a f*ckin’ huge problem”.

Não sou perito em economia ou finanças, mas arriscaria dizer que estamos numa lógica de emagrecimento com uma extensão que não pensaríamos que precisávamos e que não estamos a entender o objetivo principal, já que o verdadeiro retrato das finanças da SAD e clube não evidenciam nenhuma das vantagens de quem está a fazer ou acabou de fazer uma enorme poupança.

Convém também salientar que mesmo os bancos mais discretos e low profile investem. Qualquer entidade que tenha a ilusão de crescer, tem de apostar em algo, tem de querer gastar, tem de compensar outros por um ativo que deseja seu. No Sporting esta simples parte do protocolo da nossa forma de existir está meio baralhada, meio ocupada por um novo desenho ou paradigma que ninguém parece distinguir ou conseguir classificar. O que investimos é, no mínimo especulativo, mas abatemos ativos estratégicos, tudo em curvas e contra-curvas de interesse, necessidades e opções que se deixam plantar nos jornais, à espera que cresçam e desabrochem como justificações convincentes e racionais.

O Empréstimo Obrigacionista foi um meio-desastre. Meio desastre de comunicação, meio desastre de capacidade de criar um ambiente junto das entidades emissoras, para potenciar a operação. A Reestruturação Financeira está a ir pelo mesmo caminho, ou seja, silenciosamente serena até ao pânico das vésperas e às dificuldades eternamente inesperadas. Perdoem-me a expressão, mas que c*ralho anda esta malta a fazer? Que raio de expectativas querem que tenhamos? Como podemos avaliar esta “gestão competente e profissional” quando não nos é garantido absolutamente mais nada fora do intervalo entre a ausência de dados e o desespero de ter de cortar dedos e anéis?

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca