Como Silas passou de opção a dispensado em 100 horas
artigo publicado no jornal Observador

No final da meia-final da Taça da Liga entre Sp. Braga e Sporting, que os minhotos ganharam por 2-1 com um golo de Paulinho aos 90 minutos quando os leões estavam reduzidos a dez por expulsão de Bolasie (até ao final do jogo haveria ainda mais dois vermelhos, a Mathieu e ao suplente Eduardo), todos os elementos verde e brancos que falaram na flash interview, na conferência de imprensa ou na zona mista abordaram a questão da arbitragem. Todos, de Luís Neto a Frederico Varandas, passando por Emanuel Ferro e Jorge Silas. No entanto, as visões não foram completamente as mesmas. E esse foi mais um “capítulo” na relação entre técnico e SAD leonina.

“Aos 51′ tínhamos a linha defensiva toda amarelada e tive de tirar o Marcos [Acuña]. Isto é um jogo de contacto, de duelos. Não percebo os sete cartões amarelos, cinco na primeira parte, três por palavras. Não foi por aí que perdemos mas isso condicionou muito as nossas abordagens aos lances. Não fomos tão agressivos a defender como poderíamos ter sido”, comentou Silas, que mais tarde salientou que “Jorge Sousa é um grande árbitro”. “Já tinha conseguido expulsar Bruno Fernandes no Bessa, num jogo em que foi massacrado. Existem árbitros que são fracos, Jorge Sousa é um bom árbitro honestamente mas não pode virar-se para o capitão do Sporting e dizer que para a próxima vai para a rua (…) Acredito nas intenções de Fontelas Gomes mas com árbitros bons assim nada muda, infelizmente é por isso que Portugal está como está. E se nada muda, se temos de ir para o registo que ninguém quer, o do ruído, também vamos”, referiu Varandas, na mesma zona mista onde, um ano antes, tinha criticado os homólogos Luís Filipe Vieira e António Salvador por se escudarem na arbitragem.

Pelo habitual silêncio da estrutura leonina em torno do futebol e pela capacidade de fintar possíveis problemas nas conferências de imprensa, a relação entre as partes foi-se mantendo boa para fora enquanto se ia quebrando por dentro, em algumas situações por questões mínimas que ganhavam outra proporção por se irem acumulando. A resistência de alguns jogadores às nuances táticas que o técnico tentava introduzir acabou por ser aquilo que menos preocupava Silas, que acreditava que, com o tempo, todos iriam perceber a ideia coletiva em construção. Mas, entre falta de resultados, escassez de apoio público, problemas (e ligações) com atletas por causa de possíveis saídas ou renovações e abordagem ao mercado de inverno, tudo se foi começando a desmoronar. Ainda antes da derrota com o Basaksehir, o técnico estava a prazo. Agora, e em 100 horas, tudo caiu de vez.

Na mesma noite da goleada sofrida em Istambul, Silas falou com Hugo Viana. A necessidade de haver uma reunião entre treinador e administração da SAD depois da eliminação do único objetivo desportivo ainda existente era evidente para ambos mas esse encontro acabou por ser adiado até por forma a não haver decisões de “cabeça quente”. Esteve para ser na sexta-feira, passou para quarta-feira da semana seguinte, o dia seguinte ao encontro em Famalicão. No entanto, e numa primeira luz do que iria acontecer, o técnico foi informado de que tinham sido feitos contactos exploratórios com Rúben Amorim. Abel Ferreira, do PAOK, e Marco Silva, agora sem clube, foram também ventilados pela imprensa, tal como Pedro Martins (Olympiacos) e Ricardo Sá Pinto (sem clube). Houve de facto mais cenários em cima da mesa mas Amorim era a prioridade, até porque outro técnico muito bem visto em Alvalade pelo perfil, Rui Jorge, continuará na Seleção Nacional Sub-21.

Por não ter havido mais conversas durante o fim de semana (a equipa continuou a treinar, tendo Beto, que não foi acompanhando as decisões que iam sendo tomadas a nível de chefia de administração da SAD), tudo apontava para que essas soluções indicassem para um caminho de permanência de Silas até ao final da temporada, sendo depois substituído. No entanto, as notícias que começaram a correr com maior pertinência sobretudo na noite de segunda-feira indicaram outro cenário, de tal forma que, esta manhã, dia de jogo com o Famalicão, o treinador verde e branco já tinha consciência que poderia ser o seu último encontro pelos leões. E, tanto ou mais do que as negociações entre Sporting e Sp. Braga ou da despedida de Rúben Amorim de alguns jogadores, havia também esse novo dado da mais do que provável subida de Custódio dos juniores para os seniores dos minhotos.

Ao início da tarde, e através de um acordo verbal numa conversa promovida pelo treinador perante os indicadores mais do que evidentes que existiam, Silas e o Sporting “selaram” a saída. E tudo indica que o próximo treino, seja ele amanhã ou na quinta-feira (caso haja folga), já não será orientado pelo atual responsável.

No entanto, esta será mais do que uma simples troca de técnicos (mais uma porque Rúben Amorim será já a sexta opção no banco verde e branco desde que a nova administração tomou posse, depois de José Peseiro, Tiago Fernandes, Marcel Keizer, Leonel Pontes e Silas): olhando para tudo o que se passou na presente época, e até por forma a tentar camuflar a evidente turbulência no universo sportinguista – embora não chegando ou tocando nos atuais órgãos sociais, acrescente-se –, Frederico Varandas, que foi conversando com várias pessoas nos últimos tempos, quer mudar o paradigma da estrutura do futebol leonino, tendo também em mente a contratação de uma figura que funcione como um diretor geral para a equipa principal, que trabalhe com Hugo Viana e Beto e que possa também dar a cara quando e se for necessário, resguardando um pouco mais a figura do número 1 do clube e da SAD. Embora o organograma e o perfil estejam definidos, falta saber quem chegará a Alvalade.

silasvarandas

Silas vai sair do Sporting e esta é a história de um casamento que correu mal desde o início
Silas decidiu sair do Sporting há um mês e o Sporting decidiu o mesmo. As duas partes manifestavam desgaste numa relação que não arrancou à primeira, nem à segunda, mas à terceira tentativa. O treinador sente-se desapoiado e ultrapassado pela direção e esta entende que a equipa devia render mais, apesar das debilidades. Nesta história de desacordos cabem Acuña, Coates, Bruno Fernandes, Rúben Amorim – e o telefonema de um amigo

artigo publicado no jornal Expresso
Silas não queria o Sporting, mas o Sporting insistiu uma, duas vezes e só à terceira os dois lados laçaram o acordo, com a ajuda de alguns velhos conhecidos que, pelo telefone, disseram ao treinador para aceitar o projeto. Um deles foi Miguel Quaresma, antigo adjunto de Jorge Jesus, o técnico-guru de Silas, e que se manteve em Alvalade. “Anda para cá, que o grupo é unido”. Assinaram então contrato com uma cláusula curiosa: enquanto fosse matematicamente possível o Sporting chegar ao segundo lugar, Silas seria recompensado caso rescindisse antes do final da época; a compensação está, mais ou menos, fixada em 1 milhão de euros, o custo total da ainda atual equipa técnica de Alvalade. Que pode muito bem deixar de o ser após o Famalicão – Sporting desta terça-feira (20h).

As coisas estão assim: Silas já decidiu há um mês que quer deixar o Sporting e o Sporting decidiu a mesma coisa. O que se discute, agora, é o timing da rescisão que o treinador quer em tons amigáveis – hoje, amanhã, mais tarde ou só no final da época, logo se vê, o importante é sair a bem. A direção de Alvalade, por sua vez, tem Rúben Amorim debaixo de olho e é provável que o emancipado treinador do SC Braga siga para Lisboa, mediante o pagamento de €10 milhões, o valor do resgate minhoto. O jornal “A Bola” escreve esta terça-feira que a coisa está feita; fontes próximas do processo dizem à Tribuna Expresso que Amorim é uma “forte hipótese” para Alvalade, mas que o assunto ainda “não está fechado”.

A propósito: Rúben Amorim era um dos homens na shortlist de Frederico Varandas, presidente do Sporting, e de Hugo Viana, diretor desportivo do clube; os outros eram Pedro Martins, treinador do Olympiacos, Sá Pinto, que se encontra sem clube, e Abel, que lidera o PAOK e que esteve com um pé dentro de Alvalade na altura em que Varandas rescindiu com o holandês Marcel Keizer. E estes nomes que circularam, uns na imprensa e outros nos corredores futebolísticos, sem desmentidos oficiais de Alvalade, deixaram Silas agastado. E embora o treinador reconheça que isto faz parte do jogo, este desapoio público foi uma razão que o levou a tomar a decisão de abandonar Alvalade há mais de um mês – mas não foi a razão determinante.

A TURQUIA
Logo após a eliminação na Liga Europa, diante do Basaksehir, Silas pediu uma reunião com Hugo Viana no hotel, em Istambul, e este ter-lhe-á dito que aquele não era o momento para conversas daquelas. A reunião foi adiada de quinta-feira para sexta-feira, dia 28 de fevereiro, e nessa ficou decidido entre ambos que, acontecesse o que acontecesse em Famalicão, teria de ficar tudo resolvido num outro tête-à-tête agendado para quarta-feira (amanhã), 4 de março: ou Silas saía agora ou saía no fim da temporada; continuar, assim, em lume brando, não era opção, porque queimado já ele se sentia.

[À hora em que este artigo é escrito, Silas, Varandas e Viana não discutiram a questão, garantem à Tribuna Expresso.]

As questões entre Silas e a estrutura de Alvalade não são de natureza pessoal, porque os dois lados sempre mantiveram relações cordiais e de respeito. Do ponto de vista do clube, os problemas estão relacionados com algumas escolhas para as equipas inicias, a variabilidade do modelo tático e, claro, os resultados: a direção acredita que as eliminações da Taça de Portugal, da Taça da Liga e a distância pontual para o primeiro lugar – atualmente cifrada nos 20 pontos, com menos um jogo – não são justificáveis, apesar de reconhecerem debilidades no plantel.

Do ponto de vista do treinador, as complicações são outras. Silas sente-se desautorizado desportivamente pela direção. Por exemplo, antes do Sporting 0-2 Benfica, Acuña disse ao técnico que não iria jogar e o técnico respondeu-lhe que iria reportar a situação à direção, esperando que esta lhe desse cobertura. O que não sucedeu: Frederico Varandas e Hugo Viana convenceram o argentino a disputar o dérbi e Silas foi ultrapassado.

Outro exemplo foi abordado por Silas em conferências de imprensa: a saída de Bruno Fernandes. Estava acordado entre a administração e o técnico que o médio goleador seria vendido logo no início de janeiro e que Silas teria oportunidade de refazer o plantel; Bruno Fernandes saiu nos últimos dias da reabertura do mercado. “Nos últimos jogos, o Bruno já não estava com a cabeça aqui, mas noutro lugar”, confessou publicamente o treinador.

Mais exemplos: Silas tem alguns pesos-pesados no plantel que resistem às mudanças táticas que ele quer ver operadas. Dois deles são Acuña e Coates e, sobre ambos, Silas teve a garantia de que seriam vendidos também em janeiro. Coincidentemente, o jornal “O Jogo” titula esta terça-feira que a dupla operação ocorrerá no verão. Em cima disto tudo, os responsáveis técnicos não se sentem confortáveis com as constantes manifestações de cumplicidade entre Frederico Varandas e os antigos jogadores dos quais cuidou enquanto foi diretor clínico de Alvalade.

Mas Silas está, também, consciente dos seus erros como treinador do Sporting e reconhece aos mais próximos de que o trabalho está aquém do esperado: a equipa não tem a sua identidade e exigência, e a mensagem nem sempre passa. Depois de Alvalade, é possível que faça o que queria ter feito antes de dar o sim a Varandas: estagiar com Guardiola e visitar o Ajax.