Não me levem a mal pelo título. A originalidade do mesmo não é minha e ao seu Autor faço a devida vénia. Sou Sportinguista, devoto ao Clube e apaixonado pelo seu símbolo. O meu sofrimento é constante e o meu estado de espírito é afetado, substancialmente, pelos insucessos desta Associação da qual fazemos todos parte.

Tenho andado longe das artes da estampa, mas agora confesso que fiquei um pouco incomodado com um fenómeno que persegue o Sporting há muitos anos, uma vez que a ausência de títulos atrai esta famigerada turba verde e branca, que se designa como adiantados mentais. Trata-se, naturalmente, de um trocadilho verbal, pelo qual não pretendo designar, de modo irónico, os ditos adiantados de atrasados. Apenas pretendo referir, que tais pessoas, são tão inteligentes e estão tão à frente do seu tempo, que as suas ideias se tornaram inúteis, uma vez que são desadequadas aos tempos nos quais vivemos.

Na verdade, o adiantado mental do Sporting é aquele sujeito que sai à rua de gabardine e guarda-chuva, num dia de Agosto, com 41 Cº, uma vez que alguém lhe disse que Dezembro terá muita precipitação e granizo. O dito adiantado não deixa de ter razão, no entanto, as suas ideias pecam por não servirem para nada e demonstrarem um completo desfasamento com o sol, perdão, quero dizer com a realidade.

Ora, os três parágrafos que antecedem o presente, servem apenas, para mais uma vez, enquadrar o tema do i-voting. Noutros tempos ironizei perguntando se este tal de i-voting ia marcar golos, fazer cruzamentos ou ser o novo patrão da nossa defesa, no entanto e como não temos outros problemas para discutir – agora sim, em modo ironia ligado – surge e ressurge o i-voting outra vez.

Pelo lado do clube, diga-se da direção e da mesa, eu até consigo perceber. E relativamente a este assunto já lá vamos pois tenho algumas considerações a fazer. Pelo lado dos adeptos é que não consigo, de todo, perceber como existem adeptos e sócios do Sporting, que dentro do contexto atual do Clube, queiram discutir e defender o i-voting.

Vejamos as seguintes perguntas:
1. Temos razões objetivas para acreditar que o i-voting não será exercido no Sporting de modo transparente?
2. O i-voting vem resolver os problemas estruturais desportivos, com mais de 40 anos, que o Clube ainda vive?
3. No futuro, podemos ter alguma entidade ou órgão que possa atestar a independência e o correto funcionamento deste sistema, como é por exemplo, o caso da Comissão Nacional de Eleições, entidade essa que não se encontra dentro das estruturas dos candidatos que vão a votos, sejam eles deputados, presidentes ou outros?
4. Estamos no momento político certo para discutir este assunto?
5. Os dirigentes atuais são os dirigentes apropriados para discutir este assunto e, no caso de aprovação do i-voting, para o testar, implementar e consolidá-lo?

A minha resposta a todos estes pontos é não e peço perdão pela minha arrogância intelectual – não sendo a mesma muita, pois de intelectual tenho pouco – mas se responderam positivamente a alguma das questões acima é porque estão muito à frente do vosso tempo. Não digo isto com ofensa ou gozo. Gostava de ter a vossa capacidade de entender a relevância do i-voting, mas tenho a convicção objetiva e plena, que por agora, devemos rejeitar, com todas as nossas forças este método de votação, essencialmente, por dois motivos:

Primus: ao contrário do que se possa pensar, o i-voting não é assim tão democrático. A democracia surgiu em Atenas, porque os seus cidadãos, quer dizer, uma parte deles, achou que seria melhor organizar um conjunto de reuniões na Ágora, através das quais se pudesse determinar o modo de a sociedade Ateniense se organizar entre si e resolver os seus problemas, em oposição ao governo de um só homem, ou seja, a tirania.

Na altura não havia tecnologia digital, no entanto, os Atenienses cedo perceberam que era melhor juntarem-se entre si, debater e discutir os problemas que lhes eram comuns e no final votarem as medidas para a sua resolução. Esta votação não era para coroar a maioria, uma vez que a democracia, ao contrário do que muitos dizem, não é o regime da maioria, mas sim o regime das minorias. Na verdade, uma maioria não é mais do que o somatório de várias minorias e em democracia a palavra de uma minoria deve ser ouvida e respeitada, tanto como a de uma maioria.

Assim, as maiorias correspondem apenas ao resultado da operação que é utilizada, isto é a votação, para se determinar como agir em função de um problema que a todos é comum ou que a todos diz respeito, seja ele a edificação de um templo a um deus grego, seja ele a tomada de decisão de ostracizar um cidadão Ateniense, seja ele a reprovação de um relatório de contas duma associação desportiva. Reparem que os gregos podiam ter feito o mesmo através de papiros, no entanto, optaram por se reunir no local mais central da cidade. Deste modo, lamento informar, mas votar no sofá, através de um pin, sem debate, sem troca de ideias e sem contraditório não é democracia, é entretenimento e para isso temos o Big Brother.

Secundus: por fim, cabe perguntar qual o motivo da urgência e da necessidade que esta direção – mesa- tem, em tempos de pandemia, para abordar e querer implementar este tema. Não sou um expert em estatutos, mas creio que estará por elaborar e submeter à assembleia geral um relatório de contas – não é à mesa, mas sim à assembleia geral, realço.

Ora, parece também que “A realização de gastos e investimentos que impliquem um défice superior ao que foi orçamentado, carece de autorização da Assembleia Geral, sujeito a parecer prévio do Conselho Fiscal e Disciplinar” (31/4) e “Salvo se outra decisão for tomada em Assembleia Geral por maioria de, pelo menos, dois terços dos votos expressos, a violação por parte do Conselho Diretivo do disposto no número 4, implica a perda imediata dos mandatos por parte dos seus membros e a impossibilidade de, durante sete anos, qualquer desses membros poder desempenhar qualquer cargo nos órgãos sociais do SPORTING CLUBE DE PORTUGAL” (31/7).

Pois é, tenho dúvidas que eu tenha descoberto a pólvora, mas há uma coisa que tenho a certeza. Os membros desta direção são muito incompetentes, principalmente, se houver uma pandemia que possa agravar as contas e a gestão do clube. Só assim posso entender a pressa de submeter o i-voting a votos, antes de se aprovarem os gastos de 19-20, no meio de uma pandemia, assumindo eu esta ordem das coisas, uma vez que a agenda do dia no Sporting tem sido o i-voting, em vez do documento que apresenta aos sócios a execução do orçamento anterior.

E já agora: a votação para o i-voting vai ser debatida pelos sócios em AG? Ou vamos lá votar e depois vamos para casa? Se formos todos para casa, sem ver a decorrência das votações, os ilustres Sportinguistas sentir-se-ão confortáveis com o resultado desse ato eleitoral?

Pois é, nem sempre as maiores urgências refletem os verdadeiros objetivos políticos. Para mim, o dia no qual poderemos perder o nosso Sporting para sempre não será com a venda da SAD, pois nesse dia já teremos traçado o nosso destino com o famigerado i-voting, caso permitamos que o mesmo vença nos tempos que se aproximam.

ESTE POST É DA AUTORIA DE… Bucefalus, the Great – uma vez que nunca deram o devido valor ao Cavalo
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