No último post falei-vos do contraste entre os modelos competitivos dos países em que o Futebol Feminino já está desenvolvido ou em processo de franco, rápido e claro desenvolvimento e as opções assumidas em Portugal pela F.P.F. Hoje, pretendo focar em maior detalhe as opções de sustentabilidade comercial de modelos como o Norte-Americano e o Inglês (em minha opinião os mais bem sucedidos comercialmente).

Nos ESTADOS UNIDOS, antes da pandemia, competiam 9 equipas (cada uma de diferentes Estados); isso já era fruto de um processo de expansão iniciado em 2014, com a inclusão de uma equipa do Texas, a Houston Dash, que se juntava então a Portland Thorns (Oregon), a Seattle Reign FC (Washington), Chicago Red Stars (Illinois), Western New York Flash, Boston Breakers, Sky Blue FC (New Jersey), Kansas City (Missouri), Washigton Spirrit (Washinton DC). Para aderir e ser aprovado ao processo de expansão os Clubes têm de preencher requisitos de capital próprio inicial, sponsorização, infra-estruturas e suporte de afiliação pré determinados pela NWSL (National Women’s Soccer League). Esses pressupostos devem ser mantidos para continuar a disputar o campeonato profissional.

Em 2019, fruto de recomposições (saída de Boston Breakers, New York Flash e Kansas City e das entradas, pelo processo de expansão, de North Carolina Courage, Orlando Pride – da Florida – e Utah Royals – em Salt Lake City, Utah) a NWSL mantinha 9 equipas. Em 2021, uma nova expansão, com o regresso do Kansas City no lugar do Utah Royals e o ingresso do Racing Louisville FC, do Kentucky, aumenta a Liga para 10 equipas, pela primeira vez. Em 2022, deverá haver 12 equipas com as entradas de 2 equipas da California: a Sacramento Republic e a Angel City (de L.A.). A sua candidatura de admissão foi interposta em 2020 mas apenas para 2022 para, entretanto, assegurarem melhores condições de aprovação ( e de competitividade).

Peguemos no exemplo da Angel City FC. A equipa ainda não está formada mas o Clube já foi fundado por um grupo formado maioritariamente por mulheres: Mia Hamm (antiga lenda da seleção americana que coquistou para os EUA o seu primeiro Mundial), a que se juntaram o seu marido e as ex colegas de seleção Jule Foudy, Rachel Van Hollebecke, Amanda Cromwell, Lorrie Fair, Ronnie Fair, Joy Fawcett, Angela Hucles Shannon Mac Millan, Tisha Venturini e Abby Wambach, as atrizes Natalie Portman, Jessica Chastain, America Ferrera Jennifer Garner e Eva longoria, a tenista Serena Williams, as empresárias Julie Uhrman e Kara Nortman e ainda o empresário Alexis Ohanian, os youtubers Lilly Singh e Casey Nestat, as antigas supercampeã de ténis Billie Jean King e Ilana Kloss, a estrela da WNBA Candace Parker, a ativista Sophia Bush, a estrela pop Becky G entre outros. Para seu já estádio já garantiram, através de uma parceria com o LA Galaxy, a utilização partilhada do estádio Dignity Heath Sports Park com capacidade para 27.000 lugares sentados. O Angel City FC também já garantiu a sponsorização das camisolas através da mega empresa de entregas online DoorDash. Também já estão a negociar publicidade estática e dinâmica no estádio, no site e nas redes sociais e a preparar uma ampla plataforma de merchandising. Tudo isto quando apenas vão começar a competir na época de 2022.

Já em INGLATERRA, o processo foi algo semelhante, isto é, partiu-se de uma base mais restrita de Clubes (10 na Super Liga e 9 na 2ª Divisão) para um alargamento para 12 e 11 Clubes, respetivamente. Mas aqui, como suporte de sustentabilidade financeira, a FA aplicou um “mix” da experiência de regulação da NWSL americana com o potencial “herdado” dos principais campeonatos do Futebol Masculino Inglês e atraiu boa parte dos principais Clubes a través da cativação de grandes empresas e marcas para o patrocínio do FM. Garantiu um mega contrato de sponsorização do FA WSL (Football Association Women’s Super League) com o Banco Barclays domesmo modo que foi Garantindo grandes patrocínios para a Seleção das Lionesses. Isso abriu as portas para os patrocínios aos Clubes, os quais soberam aproveitar a onda de crescimento do FF para garantir alguns grandes sponsors nacionais, ao mesmo tempo que apelavam a uma multitude de pequenos patrocínios locais diretos e indiretos (muitos dos patrocínios locais são benefícios para os adeptos, aumentando a sua fidelização e o seu apoio financeiro).

O certo é que em pouco mais de 5 anos, o Futebol Feminino Inglês passou a ser uma das potências europeias e o seu campeonato já é o mais seguido. A tendência será de passar a também atrair maiores shares televisivos por forma a se tornar apetitivo para o investimento de operadoras privadas na aquisição de direitos de transmissão (principalmente tendo em conta que o FF tem público crescentemente alargado em países como a China, os EUA e o Japão). Acresce que a Inglaterra vai ser o país que hospedará o Campeonato da Europa de Futebol Feminino em 2022, o que poderá constituir um ótimo teste para continuar a catapultar a expansão do FF em terras de Sua Majestade.

Talvez fosse altura de em Portugal se começar a desenhar modelos e estratégias de desenvolvimento do Futebol Feminino em função das melhores práticas do que lá por fora se vai fazendo, mesmo tendo em conta a dimensão do nosso mercado. E, de preferência, tentando evitar as aberrações organizativas, reguladoras (e outras) que vão desvirtuando e desgastando a competitividade e a sustentabilidade do nosso Futebol Masculino.

Finalmente uma nota para a campanha pró-europeu da Nossa Seleção. Tendo, até à entrada desta última dupla jornada, um extraordinário registro de 5 vitórias e um empate nos 6 jogos já disputados, com apenas 1 golo sofrido (no empate caseiro coma Finlândia , concedido aos 90 minutos de jogo) partilhávamos com esta seleção escandinava o primeiro lugar do grupo com 16 pontos. Mas a última dupla jornada correspondia exatamente aos jogos “fora” com a Finlândia (em Helsínquia) e a Escócia, equipa que perseguia o duo da frente (em Chipre). Ora, logo no primeiro encontro, hipotecámos as hipóteses de apuramento direto ao sofrermos uma derrota por 1-0, mais uma vez sofrendo o golo no última jogada do encontro (e pela mesma jogadora, a ponta de lança Sällström). Assim, o apuramento só poderá ser garantido através dos playoffs entre os 2ºs lugares, classificação de grupo já garantida por Portugal, ficando o resultado com a Escócia apenas a ditar qual o adversário que defrontaremos nesse jogo de play-off.

Sobre o jogo com a Finlândia, a seleção teve alguns bons momentos, soube ter bola (57% de posse de bola) a maioria do tempo no meio-campo adversário (conquistámos 8 cantos contra 1 da Finlândia) e fizemos menos faltas (5 contra 13). Mas perdíamos no confronto físico e na eficácia (fizemos 5 remates e apenas 1 à baliza para defesa fácil enquanto as finlandesas tiveram 10 remates, 3 deles à baliza, dando 1 golo e 2 portentosas defesas da Patrícia Moraes – grande jogo dela, da Joana Marchão (8 roubos de bola, 2 remates de longe muito perigosos) e da Cláudia Neto. A Jéssica Silva também entrou muito bem.

O pior da seleção portuguesa foi, mais uma vez o treinador Francisco Neto. O golo é claramente um deslize da Tatiana Pinto, claramente por cansaço físico (foi a jogadora que mais correu e que mais se viu forçada a usar o contato físico com as “panzers” finlandesas), situação já denunciada há alguns minutos, mas apenas se usaram 2 das 5 possíveis substituições. Também deslocada e apática no lance a acabada de entrar Fátima Pinto (substituição que não se compreende, dado que a jogadora esteve meses praticamente sem competir por prolongada lesão; apenas fez alguns minutos no penúltimo jogo do Sporting; ainda menos compreensível tendo a Vanessa Marques no banco). As invenções, normalmente pagam-se caro.

No dia de hoje, terça feira 23 de Fevereiro, aconteceu a última jornada do grupo, defrontando Portugal a Escócia, com tudo já resolvido mas com o sempre importante aspeto de podermos acumular pontos para o ranking de seleções e, assim, tentar subir algumas posições (somos 30ª e a Escócia 21ª). Portugal partiu para este jogo com 4 alterações relativamente ao jogo contra a Finlândia: Vanessa Marques, Fátima Pinto, Jéssica Silva e Ana Capeta em vez de Tatiana Pinto, Cláudia Neto, Mónica Mendes e Diana Silva. O jogo começou com forte ímpeto atacante das escocesas que aos 12 e aos 14 minutos obrigaram Patícia Morais a 2 enormes defesas.

A partir dos 15 minutos, a seleção lusa começou a esticar mais o seu jogo muito por força maior ligação entre a Ana Borges e a Jéssica Silva e de uma Ana Capeta absolutamente incansável a disputar todas as bolas e exercer muita pressão em zonas mais recuadas das escocesas. Foi em resultado de uma dessas “ações de melga” que Ana Capeta, face a um mau atraso para a GR escocesa, se estica toda em carrinho à sua frente fazendo ressaltar o seu alívio para dentro da sua própria baliza. Terceiro golo de Capeta (que apelido mais apropriado: é um autêntico demónio para as adversárias) nesta campanha. A melhor goleadora lusa apesar da pouca utilização.

Após o intervalo, entrava Tatiana Pinto para o lugar de Vanessa Marques e, poucos minutos depois, Francisco Neto tirava Ana Capeta para colocar Diana Silva. Deixámos de ter capacidade de pressão mais avançada, mas ficámos com mais consistência defensiva no meio campo mais recuado. Só que isso oferecia mais terreno às escocesas, o que lhes permitia voltar aos cruzamentos de chuveirinho para a área lusa. No último quarto de hora, a Escócia faz entrar a atacante Manson (Man. United) para o lugar de Sam Kerr (curiosamente chama-se Samantha May Kerr, tal como a internacional australiana que atua na NWSL e é uma das melhores pontas de lança do mundo). Logo de seguida, Neto mexe mais uma vez, retirando a inoperante Andreia Norton e chamando a jogo a jovem leoa Andreia Jacinto (apenas 18 anos, 4ª internacionalização A). Para os descontos entrou a maritimista Telma Encarnação (outra jovem, 19 anos 5ª internacionalização). Quase ao cair do pano, grande golo da Fátima Pinto com remate forte de longe, após um trabalho delicioso da menina Andreia jacinto.

Enormíssima a segunda parte de Ana Borges nas tarefas defensivas. Para mim a MVP do jogo. Agora é espera por 5 de Março, dia do sorteio dos playoffs para ficarmos a saber quem poderemos defrontar a 5 e 12 de Abril, na procura de sermos felizes e voltara estar presente numa Fase Final de um Europeu de Nações.

* dos Açores com amor, o Álvaro Antunes prepara-nos um petisco temperado ao ritmo do nosso futebol feminino. Às terças!