Numa partida que recordava Maria José Valério no braço de cada jogador, o Sporting escolheu o caminho mais complicado para continuar a marcha rumo ao título ansiado desde os netos até aos avós. Valeu-lhe a muita fé no coração e mais uma cabeçada sobre a hora do Capitão Sebastião

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Existem duas formas de olhar para o jogo desta noite: a pura e dura e a romântica. Ora, de realidade pura e dura pintada a verde e branco estou eu farto, por isso, sempre que posso, refugio-me no romantismo que esta coisa de ter-me apaixonado por um clube tende a proporcionar-me.

Digo-vos, assim, que esta vitória conquistada com cojones foi mais importante do que se tivéssemos ganho por 3-0. Não que tal resultado me tenha passado pela cabeça enquanto o jogo decorria, mesmo perante o facto de ter ficado claro que se acelerasse um bocadinho e a inspiração surgisse nem que fosse em espasmos seria perfeitamente possível ir marcando a um Santa Clara que sabe cortar os caminhos para a sua baliza e que surgiu em Alvalade de peito feito e a conquistar um canto ainda o jogo tinha remelas.

Essa coisa do acelerar inspiradamente apareceu ali pelos 20 e poucos minutos, quando a pressão alta resultou em pleno: Palhinha recuperou uma bola na raça, meteu em João Mário, este meteu no apoio de Tabata a surgir como ponta de lança, o brasileiro teve passe iluminado e Peter Potter nem olhou para a baliza antes de metê-la lá dentro. Um remate, um golo, choramingadela para uns sobre essa coisa de marcar na primeira vez que se vai à baliza como se essa coisa de marcar na primeira vez que se vai à baliza não mereça ser etiquetada como nível de concentração extremamente elevado.

Ora, nesta noite de sexta-feira, essa concentração leonina esteve quase sempre no processo defensivo, fosse a tapar os caminhos para a baliza, fosse a sair a jogar com pinta sob pressão dos açoreanos. E, por isso, o jogo lá foi para intervalo a tornar-se aborrecido de tão controladinho que estava, recomeçando a papel químico do primeiro tempo: Santa Clara a querer chegar à baliza, Sporting a defendê-la à moda dos menos batidos do campeonato, como que acreditando que esse muro seria o suficiente para deixar o jogo rolar e chegar ao fim de 3 em 3 a somar.

No entanto, à medida que os minutos passavam, e mesmo com dois ou três momentos pinga cueca patrocinados por um entretanto entrado Daniel Bragança, ficava claro um certo cheiro a risco no ar. Porque o meio campo ou não segurava ou não acelerava, porque os laterais não funcionavam, porque a ansiedade de conquistar mais três pontos era notória. E quando dava por mim a pensar que tínhamos que marcar o segundo para acabar com as dúvidas, lembrava-me que Tiago Tomás tinha saído depois de um jogo de sacrifício, que Paulinho recupera de uma lesão mal curada para poder defrontar-nos na Taça da Liga antes de para cá vir, que Luiz esquisite está a reaprender a andar, que Pedro Marques está a crescer noutro lado e que Jovane continuava no banco vá lá saber-se porquê. “Bem, se calhar e face a este cenário, é um luxo do caraças termos um golo no único remate feito à baliza e nem vou por-me a pensar no facto de estarmos em primeiro com quase duas mãos cheias de pontos de avanço, senão ainda começo a beliscar-me”.

Estava eu neste devaneio de pensamentos para espantar os nervos, quando o gajo com nome de lampião aproveita um ressalto para empatar o jogo a seis minutos do final do tempo regulamentar. Pior, só se tivesse sido o gajo com nome de champô dos anos 80 e que se dá ao desplante de aparecer em campo com umas nuances amarelo parolo, mas, ainda assim, um castigo merecido para um Sporting apático e sem chama.

Olho para o relógio e já lá vão 85. “Há tempo”, até porque os jogadores acordaram e aceleraram. O Jovane mete a merda da coxa onde devia ter metido a cabeça, depois de uma assistência de Coates (era um aviso e ninguém sabia). Volto a olhar e o senhor que ajuda o que apita mostra a placa com quatro minutos extra. “Há tempo”, que se esfuma à medida que jogadores vão ficando no chão para que esse tempo deixe de haver. “Bora lá, caray…”. E foi. O Coates, outra vez, depois de um cruzamento que parecia perdido, mas que apanhou o João Mário que, mesmo de pantufas, cruzou a bola tão tensa que só o Capitão Sebastião podia cabeceá-la. Onde grita um, gritam todos, “golo!” está pois visto, que como diz o nosso herói cada vez menos improvável: “O jogo não termina até que o arbitro apite. É essa a mensagem que este grupo está a dar – é até ao fim!”.

Precisamente por ser até ao fim é que vos disse, lá mais acima, que este 2-1 é coisa para ter sido mais importante do que um 3-0. Afinal, rapaziada, quer se possa ou se não possa, a vitória será nossa! Viva ao Sporting!

(clica)