* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!

 

UM JANTAR PREVISÍVEL

No Sábado passado fui jantar com dois amigos que já não via há mais de 3 anos e que hoje trabalham na mesma empresa fazendo, esporadicamente, uns clientes em Angola. Um é andrade e o outro lampião. É dessa forma que serão identificados no resto do texto.

Primeiro, o mais importante: a conta foi dividida pelos 3. Os meus amigos, que estão cá em Angola de passagem, ainda tentaram descartar-se à dolorosa mas eu mandei-os pó caralho. Talvez sejam ainda efeitos dos últimos clássico e derby. É a vida. Se calhar, noutras circunstâncias até teria pago a conta. Mas como o Sporting está num rumo diferente, achei que também eu deveria comportar-me como tal. E por isso, cada um pagou o que comeu.

O lampião pediu lagosta, quiçá convencido de que eu lhe iria bancar o jantar, e o andrade quis ficar com a factura total para incluir nas despesas de estadia. Sorri. Pequenas coisas que ajudam a demonstrar o porquê de serem dos clubes que são.

Depois de cerca de 20 minutos a falar sobre as nossas vidas profissionais, o assunto acabou, obviamente, em futebol. E eu já sabia disso, por isso é que marquei o jantar num restaurante cujo dono é um sportinguista doente como eu. Não que eu precisasse de algum tipo de “backup” em argumentação futeboleira, mas apenas porque gosto ter sempre a opção de os pôrr a dormir com qualquer coisa, em caso de estupidez aguda. Não foi preciso.

O tema começou com os elogios da praxe. “Epa! O teu Sporting está se a aguentar!”. Sorri (sorrir foi das coisas que mais fiz durante este jantar). Descodifiquei a coisa facilmente. O que eles queriam dizer era: “Se nos deixamos dormir, os lagartos passam-nos à frente!”. Ao que eu respondi que achava que o porto tinha a pior equipa dos últimos anos e que o benfica era um barril de pólvora, prestes a rebentar. “Pois, mas chegámos para vocês!”. Sorri novamente. E porquê? Porque confirmei imediatamente que estamos no bom caminho. “Chegar para nós” passou a ser a medida do sucesso destes meus amigos, quiçá para esconder os desaires na Champions e a irregularidade exibicional na Liga. Não lhes respondi porque sabia que iríamos voltar a isto, mais ou menos na altura em que eles não tivessem mais argumentos para continuar um outro qualquer tema relacionado com os nossos clubes que na altura estivéssemos a discutir. Sabia perfeitamente que o “Chegámos para vocês” iria surgir novamente. E resolvi poupar as munições.

Começámos com o derby. “Grande jogo!”, “Aquilo é que foi um derby!” foram as frases do meu amigo lampião. Ao que eu respondi que sim, tinha sido um jogo intenso mas, por exemplo, em nada superior ao 5-3 de há uns anos atrás. Estava a começar a preparar o terreno. Ao que ele, obviamente que não concordou. E eu insisti, dizendo que nesse jogo, os golos foram mais bonitos, a incerteza foi maior e…não houve gamanço. “Pronto, sempre a queixarem-se!” foi a resposta que obtive. E já estava à espera. Respondi que não eram queixas, simplesmente factos. E a discussão andou uns 15/20 minutos nisto, a falar de lances reais, linhas de fora-de-jogo, unicórnios, elfos, duendes e outras fantasias do sempre criativo cérebro vermelho… O normal. O andrade acompanhou isto de forma tranquila mandando sempre um bitaite….imagine-se….contra mim!!! Surpreendentemente, vi um andrade a tomar partido de um lampião. Sorri. “Os tempos estão mesmo a mudar” pensei eu. A seguir veio o também já esperado gozo ao MELHOR GUARDA REDES PORTUGUÊS seguido da atribuição de culpas da derrota ao GRANDE RUI. Respondi com uma ideia que os deixou desarmados. Disse que o Rui cometeu um erro e pagou, em directo e in-loco, pelo mesmo. Deu golo. E não há maior punição do que essa. E depois disse que o luisão e o andré almeida cometeram dois erros igualmente graves e que não pagaram pelos mesmos acrescentando que esses dois erros foram seguidos de mais dois erros do árbitro que, igualmente, não pagou nem vai pagar por eles. “Porque razão é que o Rui é o único a ser punido?” Foram 4 erros graves em 2 jogadas sem qualquer tipo de punição para os intervenientes…contra um erro, igualmente grave, com punição máxima que foi o golo sofrido naquela altura. E esta lógica deixou-os sem resposta. Pedi também um agradecimento ao RUI PATRÍCIO por ter deixado as redes portuguesas invioladas contra a Suécia. Para efeitos de coerência.

Depois de um bate-boca intenso, onde o lampião quis, à força toda, que eu admitisse que o árbitro errou para os dois lados, rematei com uma pergunta muito simples: “Que achaste da nomeação?” Silêncio, durante 4/5 segundos. E depois o contra ataque, dizendo que um árbitro pode perfeitamente ter clube. E eu concordei. Mas voltei a insistir. E o lampião voltou a desviar-se do assunto, falando em proençadas e outras coisas do género. O habitual. O andrade, esse, mantinha-se calado e a ouvir.

Passámos ao de leve pelo clássico. Não houve grande discussão. Admiti que a vitória do porto foi justa, não houve grandes polémicas mas que continuava a achar que o porto estava mais fraco fundamentando com o resultado em Belém. Ele concordou mas sem antes dizer que eram mais fortes do que nós. O tal “Chegámos para vocês!” disfarçado com outras palavras. Falámos também dos Casuals e contei a minha versão do que se passou. Claro que o andrade não acreditou e falou das imagens que correram o país. Chegou onde eu queria. E perguntei se ele viu algum daqueles elementos a agredir alguém por iniciativa própria. “Então não vi???” Não, não viste, pensei eu. Mas não valia a pena. Aconselhei apenas a ver novamente o vídeo ou as imagens.

Por fim, o andrade disse, com todo o seu ar de superioridade, para ter cuidado com este presidente. E aqui, confesso, comecei a enervar-me. “Cuidado porquê? Por nos ter tirado da banca rota? Por nos ter colocado a discutir o título com vocês os dois? Por não vos ser subserviente?”. E vai ele, e diz que não, que é por ser populista. Ao que o lampião, que estava fora da conversa, acordou subitamente e corroborou com o andrade. “Sim, ele é um populista que e vai acabar com o teu clube!”. Sorri novamente. Quando um andrade e um lampião tentam arranjar um defeito para colocar no nosso presidente e saem-se com um…”populista”…só posso concluir que há ali uns resquícios de inveja e, mais importante, que estamos a fazer bem o nosso trabalho. E não me fiquei. Respondi que antes ser populista do que corrupto ou traficante. E a conversa descambou durante uns minutos. Sabia que íamos chegar a este ponto e resolvi ser eu a provocar. Já tínhamos comido, bebido e estava na hora de ir embora. O dono do restaurante, de passagem, dá-me uma pancadinha no ombro e sorri para mim. Provavelmente estava a ouvir.

Pagámos, despedimo-nos e….voltei ao restaurante que estava já vazio e quase a fechar para beber um digestivo com o dono. Aquelas quase 2 horas foram  tempo perdido e precisava de estar entre os meus. Senti imediatamente o calor sportinguista do dono mal voltei a entrar no restaurante: “É isso, pá! É fodê-los a todos!” seguido de um “Tira lá dois whiskys!” dirigido ao rapaz do bar. E aqui já não houve sorrisos. Houve cumplicidade e sinceridade: “Cabrões, pensam que são superiores, mas daqui não levam nada!”. E ficámos mais uma hora nisto, a falar do “ganda ponta de lança” que fomos buscar, do “armário do Selimáne”, do “presidente com colhões”, da “discrição do Inácio”, da “competência do Jardim”, enfim….do GRANDE SPORTING. Mais uns whiskys no bucho (a conversa estava tão boa que perdi a conta), despedi-me do dono do restaurante com a promessa de lhe trazer uma camisola personalizada para o filho quando fosse a Lisboa e fui-me embora.

Saí de lá revigorado. Cuma cadela do caralho também. Mas, sobretudo, revigorado. Estar entre sportinguistas é estar entre os nossos. É partilharmos de um sentimento genuíno e de um orgulho enorme pelas cores que defendemos. Sentimento esse que se demonstra nos mais pequenos gestos, como uma frase, uma pancadinha no ombro ou oferecer uns copos a um irmão. Esta última hora vai ser a única coisa que vou recordar deste jantar. Porque o resto era previsível.