*às quartas, a cozinha da Tasca abre-se a todos os que a frequentam. Para te candidatares a servir estes Leões, basta estares preparado para as palmas ou para as cuspidelas. E enviares um e-mail com o teu texto para [email protected]

hoje avançamos com um texto do Marco Aurélio, que se debruça sobre a pergunta que, todas as semanas, é colocada a Leonardo Jardim – o Sporting é candidato ao título? – para fazer um exercício sobre estratégias comunicacionais.

 

Candidatos ou não? Um caso de comunicação institucional, by Marco Aurélio

Quando a 20 de Maio Bruno de Carvalho apresentou Leonardo Jardim como técnico da equipa principal de futebol do Sporting Clube de Portugal, porventura nem os mais optimistas (e quiçá, nem os próprios) arriscariam sequer a aventar a possibilidade de, passadas 11 jornadas e após ter jogado com 4 dos 5 primeiros classificados da época transacta, o Sporting ocupasse ex-aequo com o seu rival Benfica, a primeira posição do campeonato.

Desde antes das eleições que marcaram o período mais conturbado da História  do clube que os adeptos ficaram mentalizados que esta seria uma época de transição. O Sporting, pela segunda vez na sua História, não assumia que era à partida um candidato a vencer o título em disputa. Esta é a questão que tem dado pano para mangas para jornalistas mais ou menos inocentes, discussões de café entre os sportinguistas e perplexidade e motivo de bazófia da parte dos rivais. Mas esta questão de não assumir a candidatura a um título, não é o mesmo que assumir que não se é candidato. Estranho? Passo então a explicar.

À entrada para a época 99/00 e após uma época em que se quedou pelo 4º lugar somente, José Roquette anunciava que “este ano não somos candidatos ao título” que, diga-se, já escapava há 17 anos ao Sporting. Mas apesar daquele 4º lugar inesperado para os leões, os tempos eram outros, e ninguém levou a sério este recado presidencial. É claro que o Sporting é um crónico candidato ao título, diziam uns. O gajo diz isto pra fora mas lá no fundo quer ganhar, diriam outros. O que é facto é que após 7 jornadas a equipa não mostrava um fio de jogo minimamente atractivo e, pior que isso, não conseguia vencer. O treinador contratado, um italiano desconhecido, era devolvido à procedência e para o seu lugar contratado uma antiga glória do clube, que somente tinha experiência como adjunto e logo por longos anos, nos rivais portuenses do FCP, Augusto Inácio. À 26ª jornada, o Sporting bate o FC Porto em Alvalade por 2-0, com dois históricos golos (um pela execução, outro pela circunstância) e passa para o primeiro lugar do campeonato, que não mais iria largar. 18 anos depois o Leão volta a rugir, para delícia dos milhões de adeptos do Sporting Clube de Portugal.

Coincidência? Talvez. Fortuna? Também, com certeza. Falhanço? Só se as previsões tiverem sido honestas, coisa que não acredito que tenham sido. Pelo caminho uma transformação digna de referencia: Luís Vidigal, jogador considerado mal-amado quase unanimemente, transformara-se numa das referencias da equipa, não só pelo que jogava, mas pelo sportinguistmo que lhe era inerente, ao ponto de Inácio, quando confrontado com a utilização de um jogador com uma passado de relações complicadas com a massa adepta ter respondido: “Neste momento, o Sporting é Vidigal e mais 10!”.

Para explicar esta questão da comunicação institucional gostaria primeiro de destacar dois pontos. O primeiro é que regra geral, os adeptos mais “ferrenhos” de um clube esquecem-se que há mais para além do seu próprio clube. Há outros contendores, há outras opiniões, e pior que isso, há outras forças que lhes fazem frente, seja dentro ou fora das quatro linhas. E este ponto ressalvo-o para relembrar estes adeptos que a comunicação institucional de um clube como o Sporting Clube de Portugal não é feita só para eles, mas pra toda a gente. Rivais e “neutros” incluídos.

O segundo ponto é que sendo uma das principais bandeiras da campanha de Bruno de Carvalho à liderança do Sporting a exigência, como acreditar que se baixem os níveis de exigência à equipa de futebol depois da sua pior época de sempre?

Agora a comunicação propriamente dita. Quando Leonardo Jardim diz que o Sporting não é um candidato ao título não está, obviamente, a dizer que o Sporting não é um candidato ao título. Confusos ainda? Mas afinal, porque interessa tanto saber se o Sporting é ou não candidato a vencer uma competição que disse à partida que não deveria ganhar? A questão é, meus amigos, que o Sporting é grande demais para ser ignorado. O Sporting tem uma força tremenda. Sim, estivemos adormecidos demasiado tempo, e sim, muito por nossa culpa. Mas nós não somos grandes, somos enormes, gigantes, assustadores!

Depois de dois anos de contratações pagas a peso de ouro com os resultados conhecidos, perda de confiança dos adeptos na direcção e de carisma no balneário, a solução foi encontrada onde sempre esteve: Alcochete. Jesualdo viu isso e mesmo enviesado e com os resultados que se conhecem dos casos Bruma e Ilori colocou em prática a única solução aparente da altura, promoveu internamente jogadores da formação. Com resultados melhores mas que não chegaram para impedir a pior classificação de sempre da História do Sporting, depressa se percebeu qual o caminho a seguir. Só faltava saber se era Jesualdo quem iria trilhar esse caminho. Cedo se percebeu que não.

Pela mesma razão de que antes do término da competição nada foi confirmado, também agora não se confirma o que toda a gente sabe, que o Sporting é um candidato ao título. A ideia que passou foi a de que Jesualdo não aceitou ficar. O que realmente aconteceu, como é fácil de perceber, é que Bruno de Carvalho fez a Jesualdo uma proposta que ele nunca poderia aceitar, qual nem interessa, porque já tinha Leonardo Jardim na rectaguarda pronto a assumir os comandos da equipa leonina. Apesar disto, a massa leonina na ignorância, expressava as ânsias e esperanças, dividida. Uns achando que o Prof. Jesuado deveria continuar, não só pelos resultados que apresentou mas sobretudo por haver a crença que poderia potenciar os elementos da formação; outros que era a vez (mais uma) de entrar sangue novo no gabinete técnico de Alvalade, e mal o nome de Leonardo Jardim ecoara pela primeira vez, logo uma legião de fãs se levantou para defender a sua contratação, muito com base no que havia feito no Beira-Mar e SC Braga.

Após a vitória tangencial e sofrida em Guimarães na 10ª jornada, António Oliveira, comentador portista do programa de futebol da SIC Notícias dizia: “mas alguém acredita mesmo que Leonardo Jardim ou Bruno de Carvalho digam aos seus jogadores ah e tal não temos que ser campeões!? Isso é um absurdo. Outra coisa é o que ele diz cá para fora, à imprensa, outra é o que diz dentro do seu balneário, e isso é ‘meus amigos, somos o Sporting e vamos lá ganhar a estes gajos todos!’” no que era corroborado por Toni, comentador benfiquista.

A gestão da comunicação nem sempre é facilmente compreendida (ou compreendida de todo) por estre as massas. Sobretudo pelas massas apaixonadas e com pouco discernimento dos ferrenhos adeptos de futebol. Mas não pode ser ignorada. O que conta é o que fica escrito nos livros, digamos assim, e caso o Sporting ganhe, ganhará com surpresa excepto para os próprios sportinguistas. E caso o Sporting não ganhe, acontece simplesmente o que já era esperado. Já para os outros contendores não é bem a mesma coisa. Perder para o Sporting é ainda mais embaraçoso que Benfica e Porto perderem um para o outro. Porque isso significa para um derrotar o mais difícil adversário e perder para o mais fácil e para outro, ter perdido para os dois. Ao haver

este tipo de comunicação, coloca-se pressão no trabalho dos rivais, que estão proibidos de falhar. Uns porque são tri-campeões mas nas últimas duas épocas não convenceram ninguém, ao ponto de despedirem um treinador bi-campeão. Outros porque há 3 épocas que devem ser campeões e falham nos últimos momentos. Jesus tem a cabeça a prémio desde Maio e Paulo Fonseca ainda não convenceu e já está no fio da navalha. Assumir publicamente que o Sporting entra nesta matemática seria equilibrar uma balança que se quer desequilibrada: a da responsabilidade.

Perante o historial dos últimos anos e o orçamento de cada equipa, o Sporting não se lhes pode comparar. Mas só nisso. Porque no relvado é que se processa a única estatística que interessa: quantas se metem lá dentro.A Norte todos já perceberam que a dinastia de Pinto da Costa está a acabar e teme-se, compreensivelmente, pelo futuro. Do outro lado da Segunda Circular há um estranho silêncio de quem muito escarcéu armava, depois de ter falado cedo demais e ter sido obrigado a agarrar-se à palavra para se agarrar ao poder, Luís Filipe Vieira só reza para que Jesus este ano ganhe qualquer coisinha, embora todos saibamos que não começará a época 14/15 aos comandos da águia, novamente.

Outro episódio em que podemos observar a forma deficiente de comunicação institucional que havia até hoje no Sporting, foram as declarações de Stijn Schaars ao sair do clube. Schaars, um jogador de reconhecida influência no balneário e uma mais valia dentro do campo dizia que saía para o PSV porque o PSV luta pelo título na Holanda e cá o Sporting iria novamente disputar apenas um lugar europeu, esta época. Ora isto é gravoso, porque Schaars (de quem pessoalmente gosto como jogador) envergou a braçadeira de capitão do Sporting e aparentemente não compreendia a dimensão deste clube. Muito provavelmente porque nunca lho foi explicado. Mas sobretudo porque não lho foi exigido. O tempo dos mercenários acabou. O Sporting é maior que todos e todos têm que ser maiores para poderem estar no Sporting. Não basta estar no Sporting para ser Sporting. Mas tem que se ser Sporting para se poder estar no Sporting.

Por outro lado, Bruno de Carvalho fez estalar o verniz quando declarou que “Tirando-se o vermelho da bandeira nacional, resolveriam-se os problemas do país!”. Não é preciso ser-se muito inteligente para perceber o que aconteceu. Bruno de Carvalho a ser igual a si próprio depois de um com certeza bem regado almoço e perante uma onda de fervor e entusiasmo sportinguista, mais ou menos privada. Ninguém estranha, sportinguista ou não, que esta seja a sua opinião. Bruno de Carvalho não pauta por ser politicamente correcto ou por fazer fretes. Se o devia ter dito? Provavelmente não. Não que tenha feito algum mal, mas porque da mesma maneira que se fala deste não-assunto se poderá falar de outros, mais nocivos, no futuro.

Desde que tomou posse, que a Direcção do Sporting não perde uma oportunidade de expressar as suas posições e pontos de vista, maioritariamente através de comunicados oficiais, colocados no site e dados a conhecer aos órgãos de comunicação social. Os seus detractores dizem que dispara a tudo o que mexe e isso desgasta a sua imagem e ameaça a sua ainda pouco sólida credibilidade. Talvez. Mas se for feito de maneira coerente, ganhará credibilidade a longo prazo e, mais importante, afeição dos adeptos. Eu apenas não teria feito o comunicado dirigido ao Record, por causa da maneira como este jornal apresenta a classificação da Liga. Mas reconheço que é coerente e na linha do que tem sido até aqui.

Por tudo o exposto aqui e mais ainda, os adeptos do Sporting não precisam, mas sobretudo não devem, exigir outra tomada de posição diferente da que tem sido até hoje: “ganhar o próximo jogo”. Esta Direcção, equipa técnica e plantel, são os primeiros a quererem ser campeões, disso não tenho dúvidas. A nós adeptos, cabe-nos apoiar de 15 em 15 dias em Alvalade e de 15 em 15 fora de portas, e somente observar os nossos rivais a consumirem-se. Mais nada. Não temos que responder a nada, nem provar nada. Ganhar é da responsabilidade deles. Vencer, da nossa. Mas para o Sporting vencer, não precisa de ganhar, mas só de continuar a trilhar o seu caminho. Já para os outros, têm que ganhar a qualquer custo e, às vezes, nem assim vencem.