Lembro-me das primeiras vezes que ouvi falar dele, enquanto treinador do Beira-Mar. Aplaudia-se o futebol praticado, elogiava-se o profissionalismo, havia quem garantisse que seria o próximo treinador do Fruta Clube do Porto. Naquela época em que era típico procurar “novos Mourinhos”, Leonardo Jardim perfilava-se como um possível treinador de sucesso.
Veio Braga, depois a Grécia, numa espécie de crescimento sustentado, antes de ser apresentado como o novo treinador do Sporting e aposta desta direcção. Neste momento, após sete meses de trabalho, será um dos maiores responsáveis por sentirmos que o nosso Sporting está de volta (e há uma diferença monumental entre dizê-lo e senti-lo). O homem do processo, o homem do sorriso contido, o homem do discurso lógico, o homem do fato de treino.
Esta é, para mim, a imagem de marca de Leonardo Jardim. Ao apresentar-se, regularmente, de fato de treino, o técnico passa uma mensagem clara: ele está ali para trabalhar e sabe que há muito por fazer. A camisa, essa, veste-se em jogos como o de ontem, onde só faltou um nó perfeito numa gravata estreita. Olho para Leonardo como um artesão nato, que decidiu não perder a oportunidade de moldar um sonho antigo. Um sonho que, conta-se, remonta ao início da adolescência, altura em que terá dito, apontando para a televisão, «um dia vou treinar o Sporting!». E é isso, precisamente, que ele está a fazer, a treinar o Sporting.
Mas a tarefa é bem mais complicada do que para tantos outros que já passaram pelo lugar que ocupa. Leonardo aceitou pegar num Sporting a quem foi dito que devia temer e duvidar da própria sombra. Um Sporting a quem foi dito que a ideia de ser grande devia ficar encerrada numa frase intemporal e em feitos de outros tempos. Um Sporting a quem sugaram o património e que foi endividado até ficar nas mãos de trafulhas, banqueiros e biscateiros. Um Sporting sem possibilidade de ir ao mercado com molhos de notas nos bolsos. Um Sporting obrigado a assentar a sua estratégia na sua maior riqueza: a formação.
E se ter uma das três melhores escolas de futebol do mundo pode ser visto como uma vantagem, o conseguir passar aos adeptos a mensagem que não há quem nasça ensinado é tarefa nada simples. E ensinar, sem colocar sobre os ombros dos jogadores o peso de ter que resgatar um clube centenário, é tão ou mais complicado, nomeadamente quando a eles se pede que, além de deixarem a juba em campo, ainda sejam capazes de entusiasmar a plateia.
A tudo isto, o artesão Leonardo tem respondido com a criação de uma obra que vai sendo moldada em plena exposição. Quando as luzes baixam, na sua oficina, o madeirense vai limando imperfeições sabendo que essa questão do tempo é algo muito relativo e que, a cada momento, novas vozes surgem tentando menorizar o que de tão bom vai sendo feito.
Mas, por mais subterfúgios que inventem para tentar esbatê-la, a verdade é só uma: em sete meses de trabalho, Leonardo Jardim pegou num monte de cacos, reuniu aqueles que estavam em melhores condições e formou uma equipa com identidade e fio de jogo. Mais, uma equipa que empolga as bancadas e fez regressar a onda verde de adeptos. Se essa era a primeira etapa, então está completamente superada, com o extra de, revelando-se belíssimo gestor de recursos humanos, ter conseguido unir 20 homens e 20 egos, em torno de um mesmo objectivo. Ter conseguido que, com maior ou menos qualidade, todos se sintam de uma utilidade extrema na luta por esse mesmo objectivo.
Leonheart, é justo que lhe chamemos assim, apresenta-se, hoje, como um líder que conta com o comprometimento de todos na defesa de uma camisola e de um clube. E é por isso que, em cada adepto, cresce a vontade de se perfilar ao lado deste madeirense tranquilo, no arranque para mais uma batalha. Afinal, isto ainda agora começou. E há tanto sonho bom para tornar realidade…
31 Dezembro, 2013 at 19:00
Excelente texto, Cherba… + 1. Começa a ser rotina 😉