«Voo como uma borboleta, pico como uma abelha», afirmou Slimani, citando Muhammad Ali, depois de decidir o jogo em Guimarães, mesmo sobre o cair do pano. A imagem provocou sorrisos e, ontem, ganhou cenário perfeito: um lamaçal do pior onde, ao fim de 20 minutos, a bola raramente rolava mais de um metro.

E ao fim desses 20 minutos, a perder 1-0, os leões borboleta, habituados a jogar a bola de pé para pé e a construir futebol de trás para a frente, já tinham percebido que não havia outra solução: tinham que tirar as chuteiras e calçar galochas! O grito, a plenos pulmões, foi lançado por Rojo, o patinho feio deste grupo de leões, que subiu o mais alto que a lama deixou e aplicou um cabeceamento perfeito para dentro das redes de Cássio. A equipa voltava a estar ligada à máquina, sem deslumbrar pegou no jogo e, até final da primeira parte, foi-se reencontrando e foi-se adaptando a este futebol para o qual não está talhada.

Alguns, como Capel, nunca chegaram a adaptar-se à lama pelo tornozelo e ao peso da água na juba, não estranhando que o espanhol fosse o primeiro a sair. Para o seu lugar entrava o leão abelha, de ferrão afiado. E se o Arouca já só se limitava a defender o resultado e a procurar o prémio do melhor mergulho no batatal (desde que marcou, pouco passava dos 15 minutos, a equipa nortenha só voltou a criar verdadeiro perigo aos 85 minutos, quando esteve perto de empatar), o seu lado psicológico abanou, definitivamente, com a entrada de Slimani. As oportunidades para a cambalhota no marcador sucediam-se – Montero contra o carrinho do defesa, Maurício de cabeça, um dos golos do ano inventado por William que embateu no poste, a recarga de Rojo que embateu no defesa –, mas a bola teimava em não entrar.

O sr do apito farta-se de “apenas” soprar a cada 30 segundos e inventa duas expulsões, dando a esta sessão de luta na lama contornos épicos. Dier ocupa o lugar do avermelhado Rojo, olha para o lado e vê o outro patinho feio, Maurício, de dentes cerrados, aguentando a dor de uma lesão. Olha para as bancadas e vê a cara de espanto dos adeptos, depois de Leonheart tirar o enorme William Carvalho e entregar o meio-campo a Adrien e André Martins. Olha para a frente e vê Super Slim parar no peito, esquecer que não treinou por estar lesionado e picar com toda a força que lhe resta na perna esquerda! Golo! Golo! Golo! O grito ecoa pelos quatro cantos do mundo, voando por entre a chuva e fazendo disparar o coração de milhões de adeptos, os mesmos que passam os 20 minutos seguintes de olho no relógio.

«Magrão é o car@#&#! meu nome agora é Leão!», exclama, ao virar do avesso o adversário, um tal de Gérson que, tal como se canta nas bancadas, também quer o Sporting campeão. Os leões borboleta, de galochas, os patinhos feios e o leão abelha que também pica em noites de chuva abraçam-se no centro (diz que era, apesar das marcações terem desaparecido há mais de uma hora) do enlameado. Leonheart dá socos na chuva (toma, car@#&#!), limpa a água do nariz, sorri, e avança sobre o terreno de batalha. A sua expressão diz tudo: há um imenso orgulho dos homens que comanda e que, esta noite, traduziram na perfeição a máxima «esforço, dedicação e devoção». E, tentando não passar do sorriso ao riso, Adrien fala por todos nós e envia um recado aos Joaquins Rita cá do burgo, que vaticinavam o nosso tombo assim que a chuva começasse. Esses, devem ter tido pesadelos, tal como os que faziam piadas com a metáfora da abelha, afirmando que «a abelha costuma morrer depois de picar». Deve ser lixado ter que conviver com a realidade de que vão ter que levar connosco até ao fim e de que, a cada nova semana, com ou sem chuva, correm o risco de levar uma valente ferroada.

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