Sou Sportinguista desde que me conheço, ou melhor, antes de ser já o era; Sim, porque sendo o meu pai um indefectível  Sportinguista, o normal é que, mesmo no ventre da minha mãe, eu já tivesse sangue verde.

Não obstante eu ter uma prodigiosa memória da minha infância e de todo o Sportinguismo que me rodeou, há um episódio que me marcou e que demonstra o Sportinguismo do meu pai e que, agora, partilho com todos vós.
Estávamos na época 1979/1980, tinha eu 10 anos. O clube que mais tarde veio a ser conhecido pelo clube da fruta (recordo que o bufas ainda não tinha chegado à presidência) havia ganho os dois anteriores campeonatos e já só falavam no TRI. Era TRI para aqui, era TRI para alí; Até já tinham mandado fazer camisolas alusivas ao TRI.

Sucede, porém, que, à partida para a penúltima jornada, o futuro clube da fruta partilhava a liderança com o Sporting. Os duelos dessa jornada opunham os futuros fruteiros ao “amigo” Boavista e nós tínhamos uma difícil deslocação a Guimarães. As artimanhas levaram até a que, descaradamente, tivesse oferecido uma choruda quantia aos jogadores do Guimarães, caso derrotassem os nossos Leões, porém, as contas saíram-lhe furadas; Um auto-golo de um tal Manaca (sabem quem foi?) deu-nos a vitória por 1-0. Na jornada seguinte, obtivemos uma vitória robusta sobre a União de Leiria por 3-0 e festejamos o título.

Nessa noite, o meu pai não escondia a euforia; Outros Sportinguistas se juntaram no mesmo café e o impensável aconteceu; Numa manifestação, tão rápida quanto espontânea, organizou, logo ali, o funeral dos fruteiros. Um Sportinguista mobiliza mais um, outro mobiliza mais outro e, de repente, éramos largas dezenas (sim, éramos, porque eu, com 10 anos, também lá estava).

Improvisou-se um pequeno caixão, colocou-se uma bandeira dos fruteiros em cima, mas era preciso mais qualquer coisa; Foi, então, possível contactar com o cangalheiro cá da terra e, de repente, alguém aparece com uma grande urna branca (sim, das de verdade); Colocou-se a urna branca em cima de um camião verde, eu e mais três putos da minha idade carregamos o pequeno caixão improvisado e lá seguimos nós, pelas ruas da terra a velar o defunto. Nem sequer faltaram as carpideiras, ou melhor os carpideiros, que gritavam: Ai que dor… Ai que dor… Ai que dor. Tenho a ideia que o meu pai era o que “chorava” mais.
No fim da “peregrinação” pelas ruas da terra tivemos, ainda, direito a foguetes, lançados, claro está, por um adepto dos fruteiros.

Este episódio foi motivo de falatório durante dias e dias sem fim. Ainda se repetiu a façanha em 1981/82, mas já sem a mesma espontaneidade.
Enfim, tudo isto para dizer: Amo-te pai; Obrigado por tudo.

Texto escrito por Júlio Santos