Como sabemos, o momento dá para tudo. São os adeptos que correm por esse país, a encher os estádios que os outros não enchem. São os jogos de bastidores que colocam uma equipa a jogar a dezenas de quilómetros do seu recinto habitual. É o chorrilho de interessados nos cavaleiros e cangalheiros da vida. É a venda fantástica do André Gomes, esse talento em potência, que tanto tem dado ao futebol nos últimos três anos, depois de entrar na equipa principal da Sérvia.

Dá para tudo e dá também para criar o novo mito benfiquista. O mito da nova academia sem rival, situada ali para os lados do Seixal, e que dá pelo nome de caixa. Pois bem, como se não bastasse a habitual e diária desonestidade do Manha e seu séquito, eis que somos brindados com mais uma estratégia de marketing, muito bem definida, é um facto, que visa colocar as camadas jovens do Benfica lá em cima, como se tudo o que está para trás fosse pura ficção e a maior falácia do mundo.

Pois eu fiz um trabalhinho de casa, e começo por dizer que o nome da competição pouco importa, na verdade. O que há dois anos era a NextGenSeries, passou este ano a denominar-se UefaYouthLeague. A grande diferença? Não encontro. E não encontro porque olho para o quadro de há dois anos (não encontro o primeiro quadro de equipas, no primeiro ano da competição), e vejo Ajax, Anderlecht, Arsenal, Athletic, Borussia Dortmund, Chelsea, CSKA, Juventus, Olympiacos, Paris St Germain, Aston Villa, Barcelona, Celtic, Inter Milão, Liverpool, Man City, PSV, Tottenham, entre outros. Portanto, uma competição que, ao contrário desta última, podia ser vista como uma competição fraca, com pouca qualidade, a avaliar pela repercussão que teve por essas televisões e jornais cá do sítio. Pois claro que sim. Adiante.

Quem olhar para os jornais dos últimos meses, e tiver em atenção tudo aquilo que se escreve sobre camadas jovens, ficará com a certeza que a caminhada benfiquista nesta competição, terá sido, mais coisa, menos coisa, como um quarto segredo de Fátima. Uma coisa fabulosa, sem igual. Algo que não será mais replicável, até porque, convenhamos, estamos a falar do benfica, o clube das coisas que são garantidas por decreto. O clube que faz existir e expandir o próprio Universo, quais hidrogénio e hélio primários. Depois voltamos um pouco atrás, comparamos a forma como as equipas de juniores do Sporting dos anos do Sá Pinto e Abel passaram ao lado dessa comunicação social e imprensa desportiva isentas, e deontologicamente irrepreensíveis, e percebemos que a merda é a mesma, sempre a mesma, seja para tratamento de campeões de natação, a quem são sonegados símbolos da instituição que representam, seja em competições onde miúdos, que mais não são do que adolescentes, vêem o seu esforço e a sua qualidade passar ao lado de tudo e de todos. Tudo e todos, menos nós, orgulhosos sportinguistas, que os trazemos na cabeça a cada 11 que fazemos para o futuro.

Pois bem, voltando um pouco ao que foram as duas competições, não restará muito mais do que avaliar as condições em que as mesmas decorreram. Se o Sporting, por um lado, fez grupo com Aston Villa, PSV e Celtic, o benfica fez grupo com PSG, Anderlecht e Olympiacos. Ambos terminaram os grupos na primeira posição. Depois, na fase seguinte, o Sporting eliminou o Liverpool (clube que, nas camadas jovens, não deve poder ver-nos, nem pintados), o Tottenham, e perdeu na ronda seguinte com o Aston Villa (jogo sem Mané e Bruma, por exemplo), equipa que dominara na fase de grupos, e equipa essa que acabaria por vencer a prova, depois de ganhar ao Chelsea por 2-0, e tendo o Sporting terminado no terceiro lugar, depois de vencer o Arsenal por 3-1.
Depois mudamos a análise e seguimos para o benfica. Pois bem, depois de vencido o grupo, o benfica eliminou à justa o Man City, por uns claríssimos 2-1, e, pasmem-se, levou à frente o Áustria Viena por 4-1 (é esta a grande melhoria de uma competição para a outra, tirar equipas como o Liverpool, e fazer avançar os colossos austríacos?), vencendo depois o jogo da meia-final, frente ao Real Madrid, por uns esclarecedores 4-0, numa partida em que os pupilos da luz jogaram cerca de 75 minutos com mais um jogador (qual João Pereira expulso aos 4 minutos), contra a academia que dá um Raúl a cada 20 anos (consta que agora é o jesé).

Dois ou três dias passaram e dou por mim, num intervalo no trabalho, a procurar informações no jornal A Marca: “ora deixa cá ver como anda o joelho do Ronaldo”. Pumba, scroll down, e três batatas no bucho das galinhas apareciam no meu monitor! “Ah, ah, ah, o Seixal”, pensei eu. Os minutos passaram e comecei a aperceber-me de duas coisas:  1) benfica dominador, perde com a melhor escola de futebol do mundo; 2) fantástica exibição dos encarnados, volta a colocar Portugal no trono do futebol europeu jovem. Respiro, e só consigo pensar: oh, cum caralho, então agora a desculpa é o Barcelona? É que volto atrás, e reparo que a melhor escola do mundo (não sei se será, se não. Para mim é a nossa e pronto), a inigualável escola tico e teco, ficou pelo caminho cedo, aquando da nossa competição. Pois bem, pensei eu, se assim é, é comer e calar, que eles gostam.

A verdade é que este último mito, e esta última verdade irrevogável que aponta para um benfica formador, não contempla duas questões chave: em primeiro lugar, há todo um histórico, e se formos ver, o benfica não tem, nem pouco mais ou menos, dominado o panorama das camadas jovens em Portugal. Ok, dominou este ano, e deve servir-nos de lição para o futuro, para que não se repita. Em segundo lugar, e o aspecto último e mais relevante, toda esta discussão acaba por tornar-se estéril quando avaliamos o fim último de uma escola de futebol, que passa acima de tudo por lançar jogadores na primeira equipa, ou, quiçá, fazer um encaixe financeiro cedo, como aconteceu, por exemplo, com o Bruma e com o Ilori. E aqui, meus amigos, o benfica camadas jovens está mais ao menos ao nível de um Clube de críquete de Sydney, que, pelas especificidades, não poderá nunca dar jogadores de futebol a qualquer equipa profissional. Porque, em última análise, são zero as referências e nula é a história de aproveitamento a seguir ao Rui Costa. Ruben Amorim, ok, talvez, mas até este num contexto de empréstimos sucessivos, e com uma qualidade, no mínimo, de satisfatório, para baixo.

Seja como for, e aquilo que me fica depois de ver a actuação de ontem do Romário e companhia, é que não trocava um único jogador da geração de 93 e 94, por toda a equipa que actuou ontem na Suíça. E a justificação encontro-a, por exemplo, aqui, no jogo do primeiro torneio, e um hino ao futebol, em certos períodos.

Porque a verdade é tão somente esta: por cada Bernardo Silva que se levanta (e espero sinceramente que não façam com este puto, aquilo que fizeram com os restantes, a seguir ao Rui Costa, e notem que é o único que traria de olhos fechados para o meu clube, mesmo sendo benfiquista), novos Iuri, Ponde, Chaby, Esgaio, João Mário, João Carlos (obrigado Godinho, por mais esta venda fabulosa), Betinho, Mané, Bruma, Podence, Palhinha, Semedo, Tobias, entre muitos outros, se levantarão, com reais possibilidades de vir a fazer parte de uma equipa da categoria do Sporting. E a verdade, putos, é que vos falta um bocadinho assim para subirem e pegarem de estaca. Um bocadinho assim, por isso tenham um pouco de paciência e continuem o trabalho que falta. Vamos lá, putos.

Podia concluir com aquilo que podemos extrair de uma rápida reflexão histórica, mas o resultado seria tão escabroso, que me proíbo de iniciar uma comparação mais aprofundada entre uma formação que deu Ronaldo, Nani, Moutinho, Veloso, Figo, William, Rui Patrício, entre tantos outros, e uma outra que deu Rui Costa, Edgar, Aqua(?), Moreira, David Simão, e o inigualável Miguel Rosa.

Viva o Sporting!

Texto escrito por Diogo Carvalho 

*às quartas, a cozinha da Tasca abre-se a todos os que a frequentam. Para te candidatares a servir estes Leões, basta estares preparado para as palmas ou para as cuspidelas. E enviares um e-mail com o teu texto para [email protected]