Costuma-se dizer que um treinador é tanto melhor quanto melhores forem os seus resultados. Sem discordar desta verdade la palissiana, a mim interessa-me mais perceber de que forma se atinge esses mesmos resultados. Gosto muito mais de ver uma equipa que perde no último minuto depois de dominar o jogo inteiro do que ver uma equipa que mete o autocarro e num canto conquista a vitória. Desde que essa equipa não seja o Sporting, claro. Quando se trata do Grande, quero sempre a vitória nem que seja num remate às três tabelas. Mas, como diz o título, para mim é importante saber como se chega ao sucesso.

Tal como toda a gente, também eu tenho um lado de treinador. Sempre me interessei pela arte de definir uma ideia de jogo e conseguir levar 25 gajos diferentes a acreditarem nela. E neste aspecto, sou um profundo admirador do Barcelona de Cruijff, o DreamTeam. Ficava embasbacado ao ver como aquela equipa trabalhava o seu jogo com o objectivo máximo de alimentar dois dos melhores avançados que estes olhos já viram: Romário e Stoichkov. “Barcelonices” à parte, gosto dos princípios básicos dessa forma de jogar e entendo que uma equipa grande terá sempre de jogar mais ou menos assim. Cada qual com as suas ideias e nuances próprias,  mas os princípios básicos de jogo não mudam: Pressão alta, intensidade e rapidez na recuperação de bola, posse de bola no meio campo adversário, poucas correrias e muita inteligência na gestão dessa posse até encontrar o momento de ruptura. Com Jardim vimos um pouco disto na primeira volta mas depois fomos, aos poucos, perdendo o rumo. Deixámos de dominar durante tanto tempo, insistimos obssessivamente no jogo exterior e tornámo-nos previsíveis aos olhos dos nossos adversários. As vitórias não pararam de surgir mas o nosso jogo já estava “topado”. E aqui faltou, se calhar, algum arrojo do treinador e também ideias novas aos nossos jogadores. O que até considero natural, tendo em conta a necessidade de obter resultados.

É aqui que entra o Marco Silva. Daquilo que vi dos dois últimos anos do Estoril, percebi que o nosso actual treinador é um adepto de um futebol de posse. Mas isso são todos. Desde que o consigam, qual é o treinador que não gosta que a sua equipa tenha bola? Tirando o José Mota, que devia era estar a treinar lutadores de MMA ou a ajudar o Cabral a tirar imperiais num qualquer tasco do interior, diria que nenhum. Mas o Estoril era muito mais do que isto. Era objectivo a jogar. Sem medo de ter a bola, ou melhor, com prazer em ter a bola, o Estoril de Marco Silva nunca perdia de vista a baliza adversária. E por isso é que havia um Sebá, um Evandro e um Licá. Jogadores que, na altura certa e com o espaço conquistado, aceleravam o jogo e davam sentido à posse de bola anterior sempre com o objectivo de alimentar o Luís Leal. Ora, é precisamente isto que espero ver em Alvalade, com protagonistas claramente melhores. Se Licá, que é um cepo e foi o melhor marcador da Segunda Liga, imaginem o que ele poderá fazer com Carrillo ou Mané.

Esta é a grande diferença entre o Marco Silva e, por exemplo, o Paulo Fonseca. O Fonseca, para além de não saber os nomes dos adversários com quem ia jogar e de ter um cabelo de fazer inveja ao protagonista da Rua Sésamo, construiu o seu Paços de Ferreira à base de um jogo puramente de transições. E por isso é que foi um acaso e por isso é que não se adaptou aos Corruptos. Já o Marco, meteu o Estoril a jogar à grande, principalmente fora de casa. Essa é outra diferença. O Fonseca, em casa era um valente mas fora jogava para não perder. O Marco, ganhava a jogar à grande, perdia a jogar à grande e empatava a jogar à grande.  E é este “jogar à grande” que me agrada no treinador e que me faz acreditar que escolhemos a pessoa certa para estar ao leme do nosso futebol. É por isto que o Estoril atingiu rapidamente o sucesso que atingiu. Ninguém tem resultados tão consistentes durante tanto tempo simplesmente a jogar em contra-ataque. Um jogo, 10 jogos, uma época talvez. Nunca 3 temporadas seguidas. Seria necessário muita sorte ou uma eficácia absurda em todos os jogos. Não digo que, estrategicamente, o Marco Silva não o tenha feito em alguns jogos  mas, manifestamente, não era essa a sua praia. Quando alguém pega numa equipa que tem como objectivo ser campeão da Segunda Liga tem que, pelo menos, querer ser dominador. Pode até nem jogar grande coisa mas tem de querer ter bola, tem de querer jogar no meio campo adversário, só assim é que se pode almejar o título e a subida de divisão. Curiosamente, depois de ter atingido esse objectivo o normal seria redefinir tudo para jogar para a manutenção. O MS manteve-se fiel à sua forma de jogar e acabou por fazer um brilharete e ir à Europa confirmando que  não se trata de um fogacho ou uma obra do acaso. É alguém que vê o futebol de forma positiva e que não muda consoante o adversário chame-se ele Carnide, Corruptos ou Sporting. Isso foi bem  visível nos seus dois anos de Primeira Liga e nos jogos que fez contra equipas superiores.

Portanto, se o Marco chega ao Sporting por causa dos brilhantes resultados que obteve, creio que o seu longo contrato (4 anos) é fruto do tal processo. E aqui, tenho de deixar uma palavra ao presidente. Não pela competência revelada na gestão dos dois processos mas, sobretudo, por ter compreendido a progressiva queda da qualidade do nosso futebol e pela escolha de alguém que tem o perfil indicado para resolver esse problema. Resta saber quanto tempo precisará o Marco para colocar a equipa a jogar da forma que gosta. Eu acredito que não será muito.

Para já, em comunicação e atitude já estamos a ganhar. Para quem, nos últimos anos, teve um ditador como o Paulo Bento, um forcado como o Paulo Sérgio, um choramingas como o Domingos, um arrogante como o Jesualdo e um calculista como o Jardim….Marco Silva é uma lufada de ar fresco.

Bem-vindo, Mister!

 

* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!