Em tempos (há 8 anos) Daniel Carriço era a maior certeza na Academia de Alcochete. Como jogador tinha sido Campeão Nacional de Iniciados, Juvenis e Juniores, e para além dos títulos, era um jogador claramente acima da média e o seu comportamento fora dos relvados era igualmente motivo de orgulho na Academia.

Eu sinceramente, nunca fui um grande adepto do Daniel Carriço enquanto jogador, enquanto pessoa nunca fomos muito chegados e eu respeito isso.
Eu penso que muitos adeptos hoje em dia olham para um Júnior ou até para um atleta Sub-17 e dizem que ele vai ser atleta para a equipa principal. Eu penso que se pode pensar muita coisa, pode-se desejar muita coisa, mas, saber no nosso íntimo que este ou aquele vai ser jogador de certeza, bom, isso na última década só o “senti” duas vezes, uma foi com o Eric Dier em idade Sub-13 e outra foi com o João Mário Eduardo em idade Sub-14. Aliás, disse-o nessa altura, que João Mário um dia iria ser Capitão da Selecção Nacional A, era completíssimo.

Quase todos os restantes jogadores, posso ver neles estas qualidades, estes “defeitos”, este talento, aquela mentalidade, e é possível tentar adivinhar, mas raramente com certezas.

A forma como os adeptos dizem que este ou aquele atleta Sub-17, Sub-18 ou Sub-19 vai ser craque, fazem-me lembrar a forma como alguns atletas no Futebol Americano a nível universitário fazem carreiras fabulosas, conquistam o troféu Heisman, mas depois, quando fazem a transição para a NFL, muitos apercebem-se que estão num mundo diferente, em termos de intensidade de jogo, em termos de cultura táctica, em termos de capacidade de leitura de jogo, e em termos de “skills” que nunca necessitaram a nível universitário, mas que subitamente são necessários para sobreviver na NFL. O que aconteceu a Tim Tebow, o que irá acontecer a Johnny Manziel, etc?

Quem fala da NFL, pode igualmente falar de Basquetebol a nível universitário onde um Michael Wiggins, um Jabari Parker, um Julius Randle, um Doug McDermott ou um Joel Embiid todos eles podem ter carreiras fulgurantes, mas ninguém sabe como o seu jogo se irá transferir para a NBA.

Irá a idade de McDermot colocar um limite na sua evolução? Será Wiggins apenas um bom atleta? Será Parker apenas um jogador fisicamente mais forte que os universitários mas que na NBA perderá essa vantagem? Há muitas variáveis e diferenças entre a Formação (ou Universidade) e os Profissionais.

É crucial criar plataformas que permitam uma adaptação entre as duas realidades competitivas. Em Portugal criaram-se as equipas B, enquanto na NBA, obrigam agora os atletas a cumprirem pelo menos um ano de basquetebol universitário antes de fazerem a transição para a NBA.

Relativamente a Carriço, recordo-me bem da sua última época na Formação em 2006/07. Era (e continua a ser) um grande Sportinguista, era um grande capitão (tal como o tinha sido nas Selecções Nacionais e Distritais), estava sempre em excelente forma física, dava sempre tudo o que tinha. Mas, confesso, sempre olhei para ele com grandes dúvidas em relação ao futebol profissional.

Nesse final de época, a defesa era constituída por João Gonçalves, Daniel Carriço, Marco Lança e Tiago Pinto, e dos 4, Carriço era o melhor na Formação e aquele que parecia reunir mais qualidades para singrar nos seniores. Mas… não era particularmente alto (estive várias vezes ao seu lado, e a minha estimativa é de que ele teria 1,81), era por vezes excessivamente impetuoso nas faltas e cortes que fazia, e por último, achava-o demasiado ansioso a jogar, ele dava tudo o que tinha, mas por vezes num misto de garra e de desespero. Um líder (seja ele o Capitão ou o Treinador ou o Presidente) nunca pode mostrar ansiedade perante os seus comandados. Muitas vezes me questionei como reagiria Carriço nos seniores onde indubitavelmente perderia mais jogos do que na Formação.

A adaptação de Carriço aos seniores foi razoável, primeiro foi emprestado (juntamente com João Martins) ao Olhanense, onde alegadamente, Álvaro Magalhães terá dito que Carriço nunca seria central na vida. A segunda metade de 2007/08 foi passada no AEL Limassol onde se afirmou e rapidamente se tornou um ídolo.

Em 2008/09 esteve no Sporting, onde debaixo da estabilidade emocional de Paulo Bento e a liderança forte de Filipe Soares Franco, Daniel Carriço finalmente num palco grande teve a oportunidade de mostrar o seu valor e diria que esteve bem, não foi fabuloso, mas com 20-21 anos de idade assinou uma bela época.

Entre 2009 e 2013 o Sporting mergulhou nas trevas sob a liderança fraca e instável de José Eduardo Bettencourt e de Luiz Godinho Lopes. Liderança fraca essa que permitiu a utilização de 11 (ONZE!!!) treinadores diferentes no espaço de 4 anos.

Depois de 2009 o Sporting perdeu muita da sua competitividade desportiva, e o ainda jovem Daniel Carriço sofreu com isso. A partir de 2011 começou a sofrer ainda mais com a chegada de novos jogadores. Até que em Janeiro de 2012, Carriço saiu por uma bagatela para o Reading, tinha batido no fundo (e o Sporting também).

Claramente, houve um Carriço em 2008/09, uma versão inferior em 2009-2011, e uma versão “triste” em 2011/12.

Muitas vezes me questiono se Bettencourt e Godinho Lopes terão arruinado Daniel Carriço ao destruírem a estabilidade em seu redor entre os 21 e 24 anos, ou se Carriço era um jogador limitado? A verdade deve estar algures no meio destas duas hipóteses.

Não tenho dúvidas de que Carriço foi muito prejudicado pela ante-penúltima e sobretudo pela penúltima administração do Sporting que durante 3 anos, não lhe proporcionaram um ambiente apropriado para a sua evolução. Mas, confesso que tenho algumas dúvidas de que Carriço atendendo às suas limitações (supramencionadas) se seria capaz de ser titular no Sporting desta última época.

Daniel Carriço foi adaptado a “trinco” e tem obtido algum sucesso ao serviço do Sevilha. É verdade que não se afirmou plenamente ao serviço do seu Clube do Coração, é verdade que teve azar com os dirigentes e estruturas que teve em seu redor, mas, suspeito que para Daniel Carriço… simplesmente não estava destinado a ter sucesso em Alvalade. Daniel Carriço não tinha (e não por culpa dele) qualidade suficiente para ser titular num Sporting que quer lutar para ser Campeão.

Quem sabe (eu não sei), se calhar daqui por dois ou três anos até perceberemos que foi curiosa a utilização dos nomes de Daniel Carriço e de Johnny Manziel neste texto, pois eles possuem algumas características em comum.

Melhor que Carriço é Eric Dier, e quando digo melhor, não estou a querer dizer que Dier seja melhor que Carriço em todos os aspectos, mas na globalidade, Eric é o melhor central formado no Sporting nesta última década.

Há 6 meses que pressinto que Dier está para o verão de 2014 como Tiago Ilori esteve para o verão de 2013, mas espero estar enganado. “Culpados” há muitos, há o jogador, há o seu pai, há a Sporting SAD, mas à margem de todos esses “pormenores” dos quais ninguém se lembrará no futuro, está um jogador de enorme qualidade, e que infelizmente estagnou durante os últimos 13 meses.

Eric Dier tem potencial para ser central de nível mundial, mas ele precisa do Sporting para lá chegar, da mesma forma, que e o Sporting precisa de o manter para o ajudar a chegar a esse nível. Se e quando Dier atingir um determinado patamar de excelência, o Sporting poderá tirar partido de todas as recompensas desportivas e económicas que estiverem ao seu alcance do atleta.

Há quem diga que a Sporting SAD não vende os jogadores que deseja manter, e essas mesmas pessoas dizem antes que o Sporting ou deixa os jogadores sair porque não os queria, ou então, que os vendeu (em vez de os perder).

É importante clarificar que há casos e casos, e muitas vezes, os adeptos agrupam tudo, confundido jogadores dispensados pelo Sporting com jogadores que se recusaram a ficar no Sporting.

Para quem diz que o Sporting não queria este, ou que não perdeu aquele, mas sim que o vendeu… nem sempre são esses os casos, pois houve situações em que o Sporting negociou durante 4-6 meses para manter os jogadores e os jogadores recusaram-se a ficar, enquanto noutros casos, o Sporting não vendeu os jogadores por vontade própria, vendeu-os porque não tinha outra escolha, ou os vendia, ou iria perder esses mesmos jogadores meses depois. Não negociou essas vendas a partir de uma “posição de força”.

Tanto no Futebol Profissional como na Formação, há vários jogadores descontentes nestes últimos 13 meses, e o dinheiro é uma das razões desse descontentamento, mas está longe de ser a única. O Sporting pode não ter mais dinheiro para dar aos seus atletas e funcionários, mas pode melhorar a relação que tem para com eles de outras formas. Profissionalmente, depois do dinheiro, não há nada mais importante do que o respeito, a confiança e a lealdade.

 

Texto escrito por André Carreira de Figueiredo (ACF)

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