adrienNão sei se há muitos sportinguistas a fazerem isto, mas tentem ouvir um jogo do Sporting pela rádio, desligando por momentos a TV ou, se estiverem em Alvalade, fecharem os olhos por uns minutos depois de surripiarem o transístor ao herói da terceira idade que está, garantidamente, no lugar atrás do vosso. E não me digam que ele não está lá. Está sempre. Quando há um lance polémico, todos se viram para trás à procura desse herói para confirmar o penalty, o fora-de-jogo ou o vermelho. E, de vez em quando, paira no ar umas frases e expressões que validam tudo o que a malta diz durante os jogos. “És um filho da puta, boi!” Logo a seguir vem a confirmação do ancião: “Gatunooo!” ou “Ganda golo, caralho!” seguido sempre de um “Bela bola, equipa!”. Ou então, quando a coisa não corre bem “Merda de jogo!” seguido sempre de um “Assim não vamos lá!”. Portanto, procurem o velho sábio, aproveitem um momento de distracção (a idade proporciona vários) e, depois de fazerem o exercício, devolvam o rádio ao homem seguido de um “Desculpe, encontrei o seu rádio no chão!” E ganharão um amigo para o resto da vida.

Voltando ao exercício, verificarão que se ouvirem o relato de um jogo do Sporting, a palavra que mais vão ouvir é, com toda a certeza, “ADRIEN”. “Grande passe de Adrien!”, “Aí está Adrien a recuperar a bola!”, “Adrien a segurar bem!”, “Adrien distribui para a esquerda!”, “Falta de Adrien!”
Isto não é por acaso. Adrien é daqueles jogadores que enchem o campo. Mas enchem, não apenas pela sua presença (como o William) mas porque, está literalmente, em todo o lado! Na transição ofensiva, transporta, distribui, decide. Na transição defensiva, recua, recupera e desarma. Se estivermos a levar um contra ataque, mais certo do que a bola ser redonda, é Adrien vir atrás. Confesso-vos que quando estou a ver os jogos do Sporting, tenho a irritante mania de me armar em treinador e começo, quase de forma inconsciente, a dar instruções à televisão (eu gosto de pensar que é aos jogadores). Farto-me de dizer: “Volta, Nani!”…”Acompanha Carrillo!”…”Para trás, João (Mário)!”…”Volta mais rápido, William!”. Nunca precisei de dizer um “Volta, Adrien!”. E esta é a mais pura das verdades. Porque, invariavelmente, ele já lá está. Ou já voltou. Existe uma razão do Sporting defender sempre com 6 e atacar sempre com 5. Essa razão chama-se Adrien Silva. O centrocampista mais completo do nosso campeonato.

Hoje percebo porque é que, em tempos já longínquos, foi considerado o maior talento que o Sporting formou desde CR7 e Nani, motivando o interesse de vários clubes europeus, entre eles, o Chelsea. Adrien não é um driblador do outro Mundo, não é um velocista imparável, não é um fantástico marcador de golos. É um verdadeiro jogador de futebol, que combina, na dose certa, todos os ingredientes que uma equipa precisa para ser competente em todas as fases do jogo. Se ele fosse mais “técnico”, provavelmente seria menos intenso. Se fosse mais raçudo, provavelmente não teria tanto à vontade com a bola nos pés. Se aparecesse mais a finalizar, estaria mais longe de recuperar a bola, se fosse mais defensivo, se calhar não faria tantas assistências. Como disse, Adrien tem tudo na dose certa: Técnica, Raça, Inteligência, Intensidade, Poder de Decisão…por aí fora…Não é o jogador perfeito mas é capaz de ser o jogador mais competente no maior número de funções necessárias para se praticar futebol. E isso torna-o, de longe, no jogador mais importante do Sporting “Era Bruno de Carvalho”.

E é nestas pequenas coisas que se vê quem percebe ou não desta coisa que chamamos de futebol. Adrien nunca foi um titular indiscutível do Sporting. Nunca acreditaram verdadeiramente nele, a ponto de irem buscar um tal de Schaars que apregoava ser o cimento que colava…os cacos deixando a argamassa de qualidade superior a fermentar em Coimbra. E o maior elogio que posso fazer ao nosso 23 é que ele é, sem grandes dificuldades, tudo o que gajos como Elias e Schaars sempre sonharam ser. Foi isso que Bruno de Carvalho percebeu. E não tenho qualquer dúvida, que o primeiro nome que a estrutura definiu para assumir o nosso meio-campo foi mesmo o de Adrien (e, na altura, o de André Martins). Depois é que vieram os Williams, os João Mários e os Manés. Primeiro, era preciso o equilíbrio. E Equilíbrio é o nome do meio de Adrien Silva.

Verdade se diga, nem sempre foi assim. Adrien já foi um dos jogadores que mais me irritou. Mas hoje compreendo que nem tudo foi culpa dele. Quem o meteu a jogar a trinco, quem o impedia de ir à frente, quem lhe dava apenas uns minutos de jogo em posições que não são a dele teve muita culpa no cartório para que este fantástico médio só se tenha revelado aos 25 anos. Antes tarde do que nunca. A má notícia é que, podíamos, com um pingo de visão e competência por parte das direcções anteriores, ter visto um Adrien a assumir aquilo que um certo anão assumiu aos 18 anos. A boa notícia é que ainda temos duas mãos cheias de anos para apreciar toda a qualidade do seu futebol.

Ao Adrien nunca veremos falta de atitude. Está no seu sangue dar tudo o que tem e esforçar-se ao máximo para a equipa. E é por isso que é um dos capitães de equipa “no papel” mas é O Capitão de equipa dentro de campo. É ele que, com um olhar, um berro, uma indicação mantém sempre os companheiros concentrados. E depois, uma das coisas que mais gosto dele, assume. Quando mais precisámos de alguém, quando a coisa parecia irremediável, quando tudo parecia perdido…apareceu Adrien. A marcar o penalty indefensável sob uma pressão imensa e, a seguir, a aparecer na área para empatar. Falo, obviamente, do jogo na Alemanha que terá sido, provavelmente, a melhor exibição do médio ao serviço do Sporting. E esse jogo tem “Adrien” escrito em letras douradas, mesmo apesar do escândalo que se passou. Com menos um jogador, foi a sua intensidade que nos fez parecer que estávamos em igualdade numérica e em completo controlo dos acontecimentos, mesmo em desvantagem no marcador. E logo a seguir, contra o Marítimo, revelou a outra faceta, a de artista ao fazer aquele passe de morte para o grande momento de Montero esta época. E é basicamente isto que é o nosso 23. Quando a equipa precisa de um operário, é o primeiro a vestir o fato-macaco. Quando a coisa complica e é preciso um toque de génio, veste o smoking. E é por isto (e por muito mais) que ele se chama ADRIEN EQUILÍBRIO SILVA.

PS: Adrien, se leres este texto, há um rapaz que é o teu fã nr.1 e precisa da nossa ajuda. Chama-se Fábio, é um grande sportinguista e tem  uma doença que ninguém merece. Ele precisa de uma assistência para marcar o golo da sua vida. Não vejo ninguém melhor do que tu para lhe entregares essa bola.

 

* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!