Anos 90. Depois de uma década em que poucos ou nenhuns títulos saboreámos, entrávamos para uma ainda maior travessia do deserto, coincidente com a tomada de poder do futebol português por parte de Pinto da Costa. Assente num discurso de guerrilha, promovendo um separatismo Norte-Sul, o presidente azul e branco tomou conta dos bastidores do futebol português e, às cavalitas de Calheiros e companhia, começou a coleccionar títulos. O Benfica ficava com as migalhas, enfraquecendo à medida que engordava os seus plantéis com contratações patéticas; o Sporting vivia na esperança que o bom futebol pudesse conduzir a títulos, ilusão que ia morrendo em jogo como aquele, para a Taça, frente aos corruptos, em que Alvalade passou os últimos dez minutos a gritar “invasão”, com as redes do topo sul já deitadas abaixo.

Quando o Sporting dá mostrar de conseguir erguer-se, à entrada para a década 2.0, conquistado dois campeonatos em três anos, dá-se um enorme tiro no pé, promovendo uma aliança com o gang de Pinto da Costa. A estratégia azul era clara: bacalhau com sorriso, antes da punhalada pelas costas. Quiseram crer alguns Sportinguistas, que até não era mau de todo ficar em segundo e ir à Liga dos Campeões. Pensamento pequeno, alimentado pela única e verdadeira rivalidade histórica do nosso futebol. Afinal, se o Benfica agonizava em épocas que nem davam acesso a lugares europeus, até dava para gozar com os vizinhos, com os amigos e com os colegas de trabalho que, obviamente, poucos argumentos tinham a não ser apontar o dedo à tal aproximação entre o Sporting e o fcPorto. A verdade é que, pese a indignação que se fazia sentir quando conversávamos com outros Leões, as direcções sportinguistas pareciam aceitar, de forma mais ou menos pacífica, os consecutivos casos de arbitragem que iam ajudando o clube da invicta a coleccionar títulos.

Enquanto isso, depois de bater no fundo desportivamente, o Benfica foi-se adaptando e trabalhando na sombra. Filipe Vieira, amigo chegado de Jorge Nuno e homem capaz de mexer-se com a destreza de um choco nos negros bastidores do futebol português, teve anos para afinar a estratégia. Com uma grande vantagem: sabendo que tinha a seu favor uma massa adepta muito maior do que a do fcPorto e, não menos importante, tinha a seu favor uma comunicação social que, diga-se em abono da verdade, nunca se coibiu de apontar o dedo às ajudas arbitrais que iam sendo dadas ao clube do Porto. Pelo meio, a tal facada nas costas que, há muito, Jorge Nuno ia preparando. Do caso Moutinho ao regresso das arbitragens capazes de deixar Alvalade à beira de um ataque de nervos, o tapete era puxado debaixo dos pés das direcções leoninas que, ainda assim, faziam do seu cavalo de batalha a necessidade de ficar à frente do rival Benfica.

Acontece que o Benfica voltou aos títulos e ficou-se perante um enorme problema: três clubes grandes para dois lugares. E não são, apenas, lugares no pódio. São lugares nos milhões da Champs, são milhões em publicidades, são milhões nas marcas das camisolas, são milhões nas vendas dos direitos desportivos e televisivos, são milhões de pessoas, espalhadas pelo mundo, a quem se omite uma marca em favorecimento de outras duas. “E que, dessas duas, a maior seja o Benfica“, pediu Filipe Vieira. E aqui reside a grande mudança: enquanto Da Costa tinha uma região onde ecoavam as suas palavras, Vieira tem à sua disposição uma verdadeira máquina de propaganda. É a formação, são as capas pintadas a vermelho, valorizando todos e quais activos e escondendo as vendas feitas há meses que levarão jogadores em janeiro, são as mensagens ridículas que alimentam acéfalos (dizia o gajo, outro dia, que para o ano o plantel teria cinco jogadores da formação, como se quatro não fosse o mínimo exigido pela UEFA). E, mais grave, é uma máquina de propaganda que ajuda a encapotar tudo o que não interessa: das ajudas do apito, 9 em 12 jogos neste campeonato, ao transformar de uma vergonha como o facto de Benfica e fcPorto poderem meter dinheiro na Liga num acto de fantástica generosidade e numa grande mudança no nosso futebol, vale tudo para massificar a mensagem vermelha e branca. Veja-se, por exemplo, a simplicidade como se acha normal que os dois melhores jogadores do Belenenses fiquem de fora, quando pelo menos um deles já não tem nenhuma ligação ao Benfica (Miguel Rosa).

Por esta altura, Pinto da Costa já percebeu que o seu lugar nos bastidores está ocupado. Decide, então, manter-se em silêncio, até porque maior desastre do que não ser campeão depois dos milhões enterrados, é não conseguir o acesso à Liga dos Campeões, algo que seria uma machadada monumental nas já de si raquíticas finanças azuis e brancas. Voltam a apertar-se as mãos, volta a haver aproximação azul e encarnada, tão próxima que este campeonato passa a ser pintado a roxo. Um roxo que esconde de onde surgiu o dinheiro para pagar os 400 mil euros que estavam em dívidas aos árbitros (sim, sim, empréstimo bancário e quem paga esse empréstimo se a Liga está falida? Fundos? ok, assim já conversamos). Um roxo que empurra para pequenas chamadas de capa o facto da Olivedesportos poder garantir a continuidade da Taça da Liga.

Se és do Sporting peço-te, sinceramente, que penses nisto. Peço-te que percebas que, neste momento, estamos mais isolados do que nunca e que essa é a única postura possível. Peço-te que, sem perderes a tão propalada exigência e espírito crítico, não sejas o primeiro a promover a desvalorização de tudo o que se relacionada com o Sporting. Para isso, já basta a máquina de propaganda. Peço-te que percebas que, mais do que nunca, temos que estar unidos. Assim que mostrámos sinais de retoma, azuis vermelhos deram as mãos e selaram o acordo sentando em cima do cofre da estratégia um boneco da michelin que se diz sportinguista. Peço-te que percebas que somos o alvo a abater, até porque somos o único que pode colocar em causa a santa aliança! Custa? Custa muito. E vai continuar a custar, porque, é um conselho que te dou, esquece tudo o que viste até hoje. A maior batalha começa agora. E, sem ti, vai ser muito mais complicado vencê-la!