De cada vez que o via, perguntava se havia para o tamanho dela. Pergunta à qual, invariavelmente, se seguia um «quando é que me compras um? Queria ter um». O desejo esbarrava na constatação de que aquele não era o momento indicado e na promessa de que “o pai compra-te um quando puder”.

Com o aproximar do Natal, as atenções centraram-se nos doces. Naquele calendário de botinhas numeradas que a paciência de um adulto a quem nem sempre apetece crescer, transforma num lugar mágico onde, ao longo de 24 dias, um duende do tamanho de um boneco da playmobil deposita surpresas que ameaçam o equilíbrio de açúcar no sangue. Depois a carta, coisa para ocupar frente e verso de uma folha a4, cujo branco passa a conter as tentativas de escrever palavras complicadas aos cinco anos. Brinquedos, brinquedos e brinquedos, misturados ao sabor da imaginação, capazes de fazer esquecer aquela prenda tantas vezes pedida.

“Esta não foi o Pai Natal que te trouxe. É do papá e da mamã”. Olhar interrogado, apalpando o embrulho. Papel que se rasga como qualquer papel de embrulho deve ser rasgado. A camisola. Os calções. As meias. Olhos que se abrem e sorriem mais do que a boca. “É mesmo igual à tua, pai… Posso ir vestir?”. E corre, desenfreada, rumo ao quarto, fintando os brinquedos entretanto espalhados. Passa a mão no símbolo e entusiasma-se por ver o Rampante também nos calções. «Podemos ir jogar à bola, pai?»; “Agora?!?”; «Sim! Vá lá…». E a desarrumação da ceia e a preparação do almoço e o polvo e as batatas e o vinho e o teu banho e pentear-te e tantos “e” que só fazem sentido na cabeça de um adulto. “Que se lixe…”

À verde e branca pequenina junta-se uma grande. Nesta manhã soalheira do dia de Natal, não há frio. Ou, se há, derrete-se no entusiasmo dela que também é o dele, na partilha de um sentimento que rompe barreiras de idade ou quaisquer outras. Alguém que passa de carro abranda a marcha e, baixando o vidro, atirar um “assim é que é! É o maior!”. Os olhos pequeninos brilham outra vez, acompanhados por um «aquele senhor é Sportinguista, não é, pai?»; “é sim, amor”; «e nós também somos! há muitos Sportinguistas»; “muitos, mesmos…”; «praí quarenta mil e cem?»; “até mais!”. Ela sorri, com a bola que se desprende debaixo do braço e é chutada para uma baliza imaginária. “Fredyyy!”, grita ela, desafiando o pai a ser outro daqueles craques que costumam vir nos jornais e aparecer na televisão. Coisa que, hoje, não acontecerá. Não há jornais e a televisão volta a dar desenhos animados ao longo de todo o dia. Ela exulta no seu seu ser criança, ele volta a sê-lo, num daqueles momentos em que recupera a certeza de que foi o desejo de colar este equipamento à pele que nos fez, a todos, querer ser do Sporting!