Lembro-me de ti. Caramba, pá, tens mais cabelos brancos, mas continuas com aquele brilho no olhar quando falas do Sporting. És decididamente tu. Tu lembras-te daquele dia? 10 de Junho de 1956. Mais de 60 mil pessoas, mais de mil atletas do Sporting no relvado e na pista de ciclismo. Gente de todo mundo, chefes de estado… e quando entraram as vespas que traziam terra vinda de Olímpia, assinalando a inauguração de um estádio de um Sporting que queria ser grande em todas as modalidades?!? Foi nessa altura que perdeste o chapéu, não foi? Sabes, ainda hoje guardo na memória a dificuldade que foi recuperares o teu chapéu preferido num peão que tinha tanta gente que era capaz de estar-se mais à larga numa lata de sardinhas.
O peão… foi de lá que viste as consagrações do Joaquim Agostinho, na etapa final da volta a Portugal. Quando ele entrava pela porta da maratona era como se o Vasques e o Travassos partissem rumo à baliza! O Vasques e o Travassos… sabes, tenho tanta pena que os outros violinos já não fizessem parte da equipa e não tivessem festejado o título em 57/58. Merecias tê-los visto a partir desse peão que era para ter sido bancada desde o início. Mas viste tanta coisa capaz de eriçar-te a juba… Tu lembras-te quando o Damas defendeu os penaltis todos contra o Rangers?!? E dos 16–1 ao Apoel Nicósia, na Taça das Taças de 1963/64, e dos 21–0 ao Mindelense, para a Taça de Portugal? Tu tens a noção que nunca alguém será capaz de bater estes recordes, não tens? Já sei no que estás a pensar. Os 5-0 ao Manchester United. Se te disser que quando penso nessa noite fico um lamechas… E acontece-me o mesmo quando recordo o dia em que trocámos a pista de ciclismo pela de atletismo. O que é que queres, um gajo apega-se às coisas e depois dá nisto. Mas valeu a pena, claro que valeu. Lembras-te do Mamede a bater o recorde da europa em nossa casa? Fantástico! E que orgulho ver por lá o Carlos Lopes. E o Moniz? Está rijo, rijo! Este pessoal novo não acredita que deve praticar desporto…
Por falar em pessoal novo, foi mais ou menos por altura da inauguração do tartan que nasceram os teus filhos, não foi? Diz? Aquele ali é o teu filho mais velho?!? Chama-o lá, sff! Epá, o que tu mudaste, rapaz! Lembro-me de ti, bem pequeno, junto ao teu pai, quando o Bento mandou aquela braçada na cara do Manuel Fernandes e foi expulso. 81-82, mais uma dobradinha para a nossa história, antes daqueles anos todos a suspirarmos pelo título. Cá para nós que ninguém nos ouve, só mesmo um clube enorme consegue fazer crescer uma geração de adeptos sem dar-lhes títulos no desporto rei. A tua geração. Tenho respeito do catano por vocês! E pelos vossos pais e avós, claro, que souberam transmitir e manter viva essa paixão.
Claro que ajudou ter um presidente como o João Rocha. Tu lembas-te do teu pai te levar à inauguração da bancada nova? O teu pai diz que não, mas olha que eu vi-o com os olhos a afogarem-se. Não sei se eram saudades do peão, se era orgulho por estar presente em mais um momento histórico. Não te estejas a rir, que tu também parecias a Julia Roberts na ópera, em 2003, quando viste o Cristiano enfeitiçar os ingleses na inauguração da nossa nova casa. Nesse dia notei o teu pai triste, sabes. Fazia-lhe confusão olhar para o relvado e não ver a pista de tartan. E acho que ainda lhe fazia mais falta a Nave. Sabes que o teu pai gostava de andebol, gostava de vólei, mas adorava hóquei em patins e festejava como louco os golos do Livramento em balizas mais pequeas que as actuais, por isso aquela conquista da Taça das Taças, em 1991, naquele ringue que era tão nosso… tu também lá estiveste. Tanta gente… Eu nem sei quantas pessoas estavam na Nave.
Olha, faz lembrar aquela noite contra o Celtic. Tu devias ter o quê? 15 ou 16 anos? Lembro-me de ti, sentado na escada de pedra, com a chuva a não dar tréguas. Até o pessoal que levava as “almofadinhas para a bola” ficou com o rabo molhado! É verdade que o nosso Sporting não tem sido tantas vezes campeão quanto nós desejaríamos, mas tenho-te visto dizer presente em belos momentos. Estiveste nos 7-1 e no 5-3 ao benfica, estiveste no banho de bola ao Real Madrid que nem sabe como passou a eliminatória, viste aquela bomba do Niculae ao Milan, a remontada contra o Newcastle rumo a uma final onde até na derrota soubemos ser grandes, no 2-0 ao fcPorto que nos abriu caminho para o título. Foi nesse jogo que engataste uma miúda que caiu quando vocês, feitos loucos, ainda galgavam a curva sul em direcção à rede, não foi? Ahahaha, quantos engates de bancada tenho eu visto! Também não admira, as Sportinguistas são mesmo as mais belas! Claro que nesse ano também te vi, com os olhos inchados de tanto chorares de felicidade, à espera que a equipa chegasse de Paranhos. Que festa incrível, por Portugal e pelo mundo. Dois anos depois também foi saboroso, mas aquela festa… Ainda tens aquela bandeira gigante? Está guardada para festejares o próximo título com a tua filha?
Mas tu… sim, claro que sim. Desculpa lá, mas são tantas memórias que às vezes tenho que parar para recuperá-las. Epá, que pena essa pequenada não poder crescer a ver os seus ídolos saírem pela Porta 10-A. Aposto que ainda guardas na memória o som dos pitons a caminho do campo de treinos. Mas, por outro lado, ela vai fazer parte da geração Pavilhão. Às tantas ainda vai para a ginástica rítmica e vai ter gajos como tu e como os teus amigos a faltarem às aulas para irem mandar-lhe piropos! Como é que eu sei tanta coisa? Tu queres lá ver que estamos aqui a conversar há tanto tempo e vocês ainda não me reconheceram…
Eu sou a tua segunda casa. Sou o teu estádio. O José de Alvalade. Ou Alvalade, para os mais chegados. Sou aquele que serve de palco a momentos que se te gravam na memória. Sou aquele que faz parte da tua vida. E sou aquele que, sem ti, não tem vida. Domingo vamos voltar a encontrar-nos para um daqueles jogos que podem fazer parte da tua história e da minha e, por isso, eu precisava de recordar-te algo que nunca deves esquecer: Alvalade és tu! Jogamos em casa porque tu lá estás! Porque estás disposto a perder a voz no apoio à equipa! É por ti que me apelidaram de vulcão! Por ti, que és pai, mãe, avô, avó, que és filho e és filha! Tu és o Sporting! E está na hora de voltares a prová-lo!
SPOOOOOOOOOOOOOOOOOOOORTING!
6 Fevereiro, 2015 at 15:20
Um texto do “carrilo”.
Obrigada pai, obrigada mãe, por me terem concebido já com as “coordenadas” todas.
6 Fevereiro, 2015 at 15:27
Ah! E obrigada aos nossos leões mais “experientes”, que aqui nos deixam as suas belas memórias.
SOMOS ENORMES!
6 Fevereiro, 2015 at 15:29
és a MAIOR!
6 Fevereiro, 2015 at 15:42
Que texto Cherba!… Arrepios corpo acima, lembranças, orgulho, entusiasmo, emoção… sei lá que mais.
Estive lá em alguns desses momentos, como naquelas defesas do Damas (quase à minha frente…). E o meu Pai esteve lá naquele 10 de Junho (como, felizmente, estivemos neste mais recente 6 de Agosto).
Deixa-me contudo fazer uma (tentativa de) correcção: as pistas de atletismo e ciclismo (e automobilismo [chegou a haver um Rali do Sporting, salvo erro nocturno]) são da fundação (como aliás a foto mostra); mais tarde, a pista de ciclismo foi eliminada, por troca de mais bancada (terá sido quando se construiu a bancada nova?)
SPOOOOOOOOOOOOOOOORTING!
6 Fevereiro, 2015 at 15:48
O velódromo de Alvalade:
https://www.youtube.com/watch?v=ciiRBUuP0Sc
SL
6 Fevereiro, 2015 at 15:49
A pista de atletismo de Alvalade:
https://www.youtube.com/watch?v=-diaCHVmZFY
SL
6 Fevereiro, 2015 at 16:34
Mais um texto daqueles…
Brutal!
6 Fevereiro, 2015 at 18:35
Muito bom, Cherba!
7 Fevereiro, 2015 at 3:16
Excelente texto Cherba! (mais um…)
No domingo vou levar comigo o bilhete dos 7-1!!! Quem quiser tirar fotos é só pedir!!!!!!!!!!
Vamos a eles como LEÕES E LEOAS!!!
SL