As últimas semanas não têm sido fáceis de gerir emocionalmente. Podia dizer que, sendo adepto do Sporting, isso deveria ser algo a que já devia ter-me habituado, mas chego à conclusão que nunca me habituarei pelo simples facto de não ser capaz de encarar um jogo com pessimismo e com desconfianças. Se já assim era com plantéis onde cabiam, numa mesma época, um Vinícius, um Luís Miguel, um Nene, um Leão, um Marioni e um Ivo Damas, entre vários outros, era o que mais me faltava não acreditar agora.

Obviamente que esta tarefa de tentar olhar para o copo meio cheio pode ser encarada de várias formas. Uma delas, tem-me sido repetidamente atirada: «és um romântico e é por causa dessa falta de exigência que o clube está como está! Tens o Sporting que mereces!». E como, felizmente, tenho a capacidade de escutar o que me dizem, esse rótulo fez-me pensar. Fez-me recuar no tempo e tentar perceber se existem razões para este meu comportamento e o que o terá motivado. E quando faço esse flashback, o primeiro facto com que me deparo é que eu cresci com um Sporting em constante revolução.

Falei-vos, acima, de um plantel que fez uma das épocas mais fracas da nossa história, mas não vos disse que esse plantel, numa única época, teve quatro treinadores: Octávio Machado, Vital, Cantatore e Carlos Manuel. E para trás já tinha ficado o Waseige, essa esponja belga que, com Norton de Matos como director desportivo, nos trouxe pérolas como Gil Baiano, Missé-Missé ou Balajic. Já lá vão 18 anos, mais coisa menos coisa, mas posso garantir-vos que, nessa altura, eu também era apologista da “chicotada”. Queria lá saber, se os resultados não apareciam era trazer outro treinador. E uma carrada de novos jogadores no arranque de nova época e de novos sonhos. Mas podemos recuar quase mais dez anos, a 89-90, quando Sousa Cintra chega à presidência do clube. Ivkovic, Luisinho, Douglas, aquela eliminatória incrível com o Nápoles que me fez faltar às aulas para ir ver a segunda mão para um café. Manuel José era o treinador. Levou um chuto assim que foi eliminado para a Taça, ficou o Damas a segurar o barco e veio o Raul Águas, uma espécie de Vercauteren à portuguesa. Uma miséria total. Veio Marinho Peres, que aguentaria uma época e meia, a que se seguiu Bobby Robson. E acho que todos, pelos menos os que têm idade para isso, se recordam de como termina esse episódio.

Haveríamos de ser campeões, curisamente depois de mais uma chicotada e de anos a esbanjar dinheiro em jogadores (veja-se as épocas de Queiroz no Sporting), mas logo na época seguinte Inácio é corrido e algumas dezenas de adeptos impedem a contratação de Mourinho, com Duque a borrar-se todo perante a pressão de alguns pesos pesados das claques. Mais uma época perdida, mais uma mudança de paradigma. Agora apostamos na formação e trazemos o Sr. Boloni, mas não sei quanto tempo teria durado o romeno caso Jardel não tivesse chegado e formado com João Pinto uma dupla infernal. Boloni fica um segundo ano, pouco ou nada brilhante apesar do lançamento de Cristiano Ronaldo, e a política volta a mudar. Aliás, diria que é fácil perder a conta ao número de jogadores que entraram e sairam entre 2003 e 2013. A aposta em Paulo Bento mostrou que valia a pena alguma estabilidade, mas que a mesma de nada vale se quem dirige o clube não tiver um rumo.

Pausa. Respira.
Rumo. Tempo. Paciência. Isto.

Isto é tudo o que eu sinto que poucas vezes tivemos. Ou nenhuma. É muito bonito puxarmos do exemplo Alex Ferguson, afirmando que é necessário dar tempo a um treinador. Ora, eu digo que, no Sporting, Ferguson tinha ido a andar na sua segunda época. Também é muito bonito puxarmos do exemplo do Dortmund, afirmando que é necessário darmos tempo a um projecto. Ora, depois de praticamente termos avançado para a refundação do clube, há dois anos, temos uma crescente franja de adeptos para quem já está tudo mal, para quem a recuperação financeira vale as bolas de um gato se não começarmos a ser campeões não sei quantas vezes seguidas. Ah, também estamos longe de ter a mentalidade dos adeptos do clube alemão, que jogo após jogo enchem o seu estádio (a imagem de Alvalade por menos de metade, frente ao Wolfsburg, continua a causar-me pesadelos) e sou gajo para apostar a minha mão esquerda em como o Klopp já teria rimado com flop se vestisse as nossas cores. Entretanto, há já por aí quem berre que nós precisamos é de um Simeone. Bem, creio que todos teremos uma ideia das negociatas em que tem estado envolvido o Atlético, mas já nem vou por aí. Sorrio e encolho os ombros, quando ouço falar no Simeone com laivos de saudosismo ao Sá Pinto. Ou quando ouço aventar o nome do Sérgio Conceição.

Ah, eu sabia que íamos chegar aqui. Não, pá, isto não é uma tese de defesa ao Marco Silva. Embora te diga, com toda a sinceridade, que tenho pena que não lhe seja dada a oportunidade de começar uma segunda época. Depois de um verdadeiro ano de cão, duvido que não tenhamos todos aprendido com as dificuldades e sou gajo para acreditar que mantendo a maioria do plantel, estaríamos mais perto de atingir objectivos. Tal como tive pena que Leonardo Jardim tivesse saído ao fim da primeira época, sem tentar dar continuidade ao seu trabalho com reforços que lhe permitissem outra ginástica táctica. Porque, pelo menos para mim, é visível o esforço feito pela actual direcção para nos tirar do buraco financeiro e tentar, ao máximo, manter o plantel de época para época. Mas será que isso chega se continuarmos, ano após ano, a trocar de treinador? Há quem ache que sim e que basta encontrar o treinador certo (e há quem sonhe com treinadores que ganham o que não podemos pagar). Eu estou cansado de anos zero. Estou cansado de não dar tempo a quem quem chega perceba o que é o Sporting. Porque o Sporting é uma caixa de surpresas, até para um presidente como Bruno de Carvalho que desde sempre acompanhou de perto a vida do clube. E estou cansado da mentalidade esquizofrénica, em que o Rui Patrício vai de melhor do mundo, depois de limpar quatro ou cinco golos certos ao Chelsea, a frangueiro que só não é vendido porque ninguém lhe pega. Em que o Paulo Oliveira vai de “flop” logo na pré-época a bandeira para questionar a falta de visão de um treinador. Em que Montero passa do nosso Freddy Krueger ao próximo alvo de assobios em Alvalade. Podia dar-vos um exemplo semelhante para qualquer um dos jogadores do nosso plantel, mas não me apetece e a conversa vai longa.

Assim sendo, recapitulemos a etiqueta que me é colocada: «és um romântico e é por causa dessa falta de exigência que o clube está como está! Tens o Sporting que mereces!».
Sim, sou um romântico. Imagina tu, que continuo a sonhar com uma equipa nossa, formada por putos da formação, a conquistar uma Champions como o Ajax. Acredita, dá-me um orgulho tremendo olhar para quem enverga o Leão Rampante e ver jogadores que cresceram entre nós e se me garantires que tenho que esperar mais um pouco para ser campeão com eles, eu espero. Já não sei é se serei assim tão pouco exigente. Tu achas, mesmo, que eu não perco o apetite depois de não ganhar um jogo? Tu achas, mesmo, que não tenho vontade de ligar a minha fala ou a minha escrita a uma automática e começar a disparar em todas as direcções? Agora, permite-me perguntar-te algo: tu consegues controlar-te? Tu consegues não insultar os nossos jogadores? Tu consegues não ir para o facebook oficial do nosso clube dizer que é tudo uma merda? Será que sou eu que sou pouco exigente, ou és tu que escolhes a via mais fácil? Eu também podia ir para o Facebook do meu clube, quando me pedem apoio para a meia final da Taça, dizer “para quê? para irmos à final e levarmos três do Braga?”e, depois, fingir que era um gajo altamente militante e pedir ao amigo do amigo para me arranjar bilhete para ir ao Jamor (sim, já sei, se ganharmos, estiveste lá, caso não ganhemos ficaste de diarreia e passaste o bilhete a alguém).

Se eu tenho o Sporting que mereço? Eu diria que mereço festejar com a minha verde e branca vestida, mas também te digo que estou pronto a esperar. Esperei muitos anos até sentir que podíamos tentar criar algo palpável e sustentável. Sinto que estamos a tentar fazê-lo, mas também sei que escolhemos o caminho mais duro e moroso. Estamos todos a aprender a viver com o que temos. Com essa herança monstruosa que nos torna num gigante adormecido, que quase morreu. Quem dirige, quem treina, quem joga, quem apoia, todos continuarão a cometer erros, a enfrentar dificuldades. Será mais fácil se estivermos todos juntos.