Por mais horas que passem sobre o apito final do jogo de ontem, a pergunta continuará a ser a mesma: como é possível ter que esperar até ao último momento para vencer um jogo que cheirou a goleada e que, durante vários minutos, foi um verdadeiro massacre?

A resposta mais óbvia passa, precisamente, pela forma como essa goleada foi desperdiçada. Depois de um início de jogo que demorou a assentar, muito por culpa de um Tondela sôfrego e a correr loucamente atrás da bola, Slimani esbanja a primeira oportunidade, depois de investida de Teo pela esquerda. Pelo mesmo corredor desce Jefferson, que oferece o golo de bandeja a Teo e a Carrillo, com a bola a desfilar em frente à baliza sem que algum deles fosse capaz de empurrá-la. Teo volta a atacar o espaço livre à esquerda (muito boas movimentações do colombiano enquanto teve pernas, agressivo na procura de zonas que fazem oscilar a defesa) e a bola acaba por chegar a João Mário que, com um remate desviado em pernas adversárias, não perdoa. Em cinco minutos, o Sporting criava três situações de golo claras e deixava o adversário à beira do ko.

Um minuto volvido, Carrillo deixa para trás quatro adversários e só não desfere esse golpe fatal porque há um desvio de última hora. O mesmo Carrillo aproveita uma fantástica abertura em profundidade e, depois de aguentar a pressão de dois defesa, tenta o chapéu artístico a Jones, com a bola a sair ao lado. Lá vai Jefferson outra vez, cruzamento e cabeçada de Slimani, daquelas que costumam dar golo, mas que vai para as mãos do redes. Parece mentira, mas depois deste vendaval ofensivo que durou 20 minutos, o resultado continuava em 1-0. O ritmo abrandou, o Tondela conseguiu respirar, o Sporting passou a gerir. Ok, arrumamos o jogo a abrir a segunda parte.

Carrillo, o melhor em campo, capaz de ser o dinamite da equipa ao longo de 90 minutos, arranca pela esquerda, troca os olhos ao defesa e serve Slimani ao segundo poste. A bola sai comprida, ou a reacção do argelino é que fica curta. Mais um golo desperdiçado, logo aos cinco minutos da segunda parte (foda-se, mas arrumamos com estes gajos ou não?). João Pereira tenta servir Slimani, Adrien vê amarelo depois de repetidas faltas grosseiras por parte dos jogadores do Tondela, Ruiz para Carrillo, Carrillo solta de calcanhar em Slimani, o argelino volta a falhar. Depois… depois o balde de água gelada. Livre que nasce de uma falta muito duvidosa, um jogador em fora de jogo que domina a bola com a mão e a conduz à baliza voltando a tocar-lhe com o braço. Surreal? Sim, mas golo, com a rapaziada de Tondela a festejar como se estivesse a merecer aquele golo há longos minutos.

Temos meia hora para corrigir a injustiça. Carrillo remata à entrada da área, mas a bola sai à figura de Jones. E as pernas começam a pesar. Jefferson já não consegue levantar a bola nos cruzamentos (enorme jogo do defesa esquerdo, fazendo todo o corredor vezes sem conta) e ainda tem que se preocupar com o facto da equipa estar agora mais exposta aos contra-ataques (pese a presença de uma dupla senhorial, Paulo e Naldo). Entra Mané e entra Montero, mas trazem menos do que todos nós esperávamos. O coração começa a falar mais do que a cabeça e Jesus desfaz o núcleo formado por Adrien e João Mário, deixando o capitão em campo. Entra Gelson e entra com vontade de resolver, avançando para os adversários com a arrogância de um craque tarimbado. Carrillo volta a tentar, agora num remate sem ângulo, numa altura em que os jogadores do Tondela queimam minutos agarrados às biqueiras das botas (e diz o Paneira que uma equipa matreira nem deixaria jogar…). Depois o menino Gelson, combinando com Slimani e tentando o que seria um dos golos do ano.

O tempo esfuma-se de forma angustiante. Lançamento de linha lateral. João Pereira toma balanço ao ponto de pisar o terreno de jogo (sim, o lançamento foi irregular), Murillo acerta em Gelson. Penalti. Jesus aponta para Adrien. O capitão sorri. Sorrimos todos, depois deste enorme sofrimento. É verdade que já estamos habituados a filmes destes, ou não fôssemos do Sporting. É verdade que o mais importante foi conquistado, os três pontos, sacudindo, até, a malapata que emperrava Jesus nos arranques. Mas, para a próxima, vejam lá se transformam o futebol espectáculo em mais golos.