amunikeQuando o telefone toca – e toca, toca, toca -, Amunike atende. Sempre! A chamada cai uma, duas, talvez dez vezes. Insistimos. Ring, ring, e o bom do Emmanuel só se ri. «Ah, ah, ah, isto é África amigo. É de Portugal? Viva o Sporting, o meu Sporting».

Emmanuel Amunike, nigeriano gingão, pé esquerdo viperino, leão entre junho de 1994 e janeiro de 1997. Amunike, atenção, não é um jogador qualquer. Anotem bem o currículo:
. Jogador Africano do Ano de 1994;
. Vencedor da CAN em 1994, dois golos na final;
. Medalha de Ouro dos Jogos Olímpicos de 1996;
. Vencedor da Taça das Taças em 1997;
. Vencedor da Supertaça Europeia de 1997.

Impressionados? Ora tomem mais isto: quatro jogos e dois golos no Campeonato do Mundo de 1994, estrela de uma Nigéria pejada de gente inesquecível. Certo, Amunike? «O melhor de todos era o meu amigo Yekini. Que saudades eu tenho dele».

A conversa arranca em Inglês, passa pelo Espanhol, cai de dois em dois minutos e ainda arrisca a língua de Camões. Afinal, por onde anda Emmanuel Amunike, antigo futebolista do Sporting, jogador acarinhado como poucos em Alvalade na década e 90? «Vivo entre Santander, Espanha, onde me radiquei depois de deixar de jogar, e Abuja, na Nigéria. Sou o selecionador nacional de sub17 e fomos campeões do mundo em 2015».

Acrescentem ao currículo, por favor: Campeão do Mundo de Sub17 em seleções no ano de 2015.

«Colaborei com o Manchester United e fiz comentários para a Al Jazeera. Estou desde 2012 nos quadros da federação nigeriana e a adorar», diz Amunike aoMaisfutebol, a partir da capital do país que o viu nascer no dia de Natal de 1970. E o futuro? «Ajudar o meu país, construir as próximas gerações do futebol nigeriano, recordar os grandes nomes do nosso futebol. Estou empenhado e comprometido com isso». Bravo, Emmanuel!

Presente e futuro falados, resta o passado. Recordar Amunike e as três temporadas de leão ao peito. Nunca foi campeão nacional, apesar de ter integrado plantéis de luxo. Ganhou uma Supertaça e uma Taça de Portugal.«Pouco», confessa o nigeriano. «Merecíamos mais».

Mas como é que tudo começou? Como veio Amunike parar ao Sporting no verão de 1994, depois de ter feito um Mundial extraordinário? Essa Nigéria derrotou a Bulgária e a Grécia, perdeu contra a Argentina – ainda de Maradona – e caiu aos pés da Itália. «Que grande seleção! Todos os espiões dos grandes clubes caíram em cima de nós. Na altura voltei ao Egito e a direção apresentou-me uma oferta do Duisburgo, da Alemanha. Era muito dinheiro», recorda Amunike.

A confusão surgiu depois. O Sporting, e Carlos Queiroz, não desistiram de ter Amunike e o presidente Sousa Cintra viajou para o Cairo. No seu estilo intempestivo, Cintra deu a volta ao que estava estabelecido e conseguiu Amunike. «Nessa reunião, um dos dirigentes do Zamalek apontou uma faca ao senhor Cintra. Havia um pré-acordo com os alemães. No aeroporto até me tentaram raptar! Não imaginam a confusão. As pessoas do Sporting perceberam o que estava a acontecer e só me lembro de ver alemães a puxar-me por um braço e portugueses por outro. Era assim o futebol».

Emmanuel Amunike não se desfez. Chegou inteiro a Portugal. A estreia de verde e branco ocorreu a 30 de outubro de 1994. Apenas à 9ª jornada porque o Duisburgo levou a traição de Amunike para Justiça«Sim, contra o Beira-Mar». E os golos, Amunike? «Don’t remember, eh eh». Nós ajudamos: Juskowiak e autogolo de Pedro Miguel, central dos aveirenses.

A ligação telefónica teima em não acompanhar os níveis de simpatia de Emmanuel Amunike. E é ele a pedir-nos desculpa. «É sempre assim. Mas ligue, eu atendo». Amunike atende sempre. Por motivos óbvios, as perguntas são curtas e as respostas também. Melhor golo em Portugal, Amunike? «Ao Benfica, num 1-0 em Alvalade [1 dezembro de 1994]. A bola apareceu na área, solta, corri e encostei de pé esquerdo. No chances para o grande PreudHomme». E o pior momento, onde aconteceu? «Fácil, o vermelho nas Antas [20 de agosto de 1995, derrota 2-1]». Amunike foi, de resto, expulso duas vezes contra o FC Porto. Nessa primeira jornada da Liga 1995/96 e na Supertaça vencida pelos leões em Paris, 3-0.

Há muitas perguntas para fazer, a qualidade da ligação contraria-nos, Amunike espera e colabora. «Melhor colega foi Figo, grande Figo. Jogou comigo em Alvalade e no Barcelona, enorme! Outro craque era o Pedro Barbosa. Eu era bom, rápido, competitivo, adorava os jogos grandes». Fala-se de Carlos Queiroz – «um pai, um professor» – e de Bobby Robson – «fui para o Barcelona porque ele quis, adorava esse homem» – até o telefone se desligar. Olhamos o bloco e ficam cinco questões por fazer. Amunike não volta a atender. Afinal, nem ele atende sempre.

Em Barcelona, as lesões mataram-no. Faz 22 jogos (e um golo, ao Logroñes) na primeira época, quatro na segunda e desaparece das fichas de jogos. Torna-se um flop aos olhos da tribuna catalã e até a um cântico pouco simpático tem direito, associado ao atual treinador do Barcelona:  «Luís Enrique, tu padre es Amunike!» Adorávamos perguntar a Emmanuel Amunike o que significava isto. Mas ele já não atende.

NÚMEROS DE AMUNIKE EM PORTUGAL:
. 1994/95: Sporting (21 jogos, 7 golos) – 2º lugar na Liga
. 1995/96: Sporting (23 jogos, 7 golos) – 3º lugar na Liga
. 1996/97: Sporting (8 jogos, 3 golos) – 2º lugar na Liga

 

(in MaisFutebol)