«Olha… este engatou». Este chama-se Ricardo, é guarda-redes do Vitória de Setúbal e aos 15 minutos de jogo já tinha tirado três golos certos da boca do Leão. Primeiro, a bomba de Bruno César, depois Slimani, em jeito, ora toma em arco por baixo ora toma lá uma tentativa de chapelada e o raio do moço a tirar as bolas todas. E quando não era ele era um defesa, como aquele que, sobre a linha, impediu a cabeçada de Coates de anichar-se no fundo das redes.

É, o Sporting entrara a todo o gás, trocando as pantufas de João Mário pelos ténis de velocista de Gelson Martins e encostando o adversário completamente às cordas. E tão encostada estava a equipa sadina que o árbitro da partida se esforçava por ajudar a equilibrar a balança, fosse mostrando um inenarrável amarelo a Adrien que o retira do último jogo do campeonato, fosse ignorando um penalti claro sobre Slimani depois do argelino ser agarrado durante alguns segundos no interior da área. O mesmo Slimani que terá pensado “o melhor é ver se despachamos isto para eu sair. Este gajo está mortinho por dar-me um amarelo a mim também”. E se bem o pensou, melhor o fez, sendo lesto a combinar com Ruiz, o tal que, na ausência do Mago, fez de extremo mascarado que vem para dentro e espalha magia. O resto é pura classe do menino Gelson, picando a bola à saída do redes e sorrindo muito, de punho erguido, dizendo a Alvalade que o mais complicado estava feito.

Tanto estava que, logo a seguir, William veio por ali fora (alguém já reparou como o 6 é cada vez mais um box to box?), meteu em Teo e o colombiano borrifou-se para aquela brincadeira que costuma fazer em bicos de pés e ancas a bambolearem-se. Zabimba lá para dentro, com força e colocação, no 2-0 que descansava o coração e deixava Slimani ainda com mais vontade de marcar. Picadinha sobre os defesa, passa no meio deles, vai fuzilar… não, vai rematar em jeito e o raio do guardião, o tal Ricardo, a tirar mais um golo feito antes do intervalo e a evitar um resultado esmagador como corolário de uma primeira parte de altíssimo nível.

E na segunda pouco mudou, até porque aquelas quase 44 mil almas que se borrifaram na chuva e foram a Alvalade cantar a plenos pulmões que querem o Sporting campeão, nunca deixaram a equipa adormecer. Teo foi o primeiro a dizer-lhes “ok, vamos festejar juntos mais vezes”, mas seria do virtuosismo de Adrien que nasceria o passe para o 60 – que se tivesse um corte de cabelo à Sideshow Bob estaria hoje a caminho de seis clubes por 100 milhões de euros – fazer o terceiro. Para já fica por cá e fica a ver o entretanto entrado Zeegelaar sofrer uma falta para segundo amarelo do setubalense e, na marcação do livre, Ruiz fazer um golaço de todo o tamanho. Aliás, o raio do puto gosta tanto de correr que para lá dos oitenta fez uma piscina pela direita e meteu em Barcos, o tal que parece pesado, mas fez um troca pés do caraças e viu o seu primeiro golo de verde e branca ser negado pelo tal Ricardo.

Haveria de contentar-se o argentino com o festejo do quinto golo, obra e graça do espírito genial de Bryan Ruiz, que na marcação de um livre a castigar mais uma falta sobre Adrien (que viu o critério do apitador ser apertado só para si), ao ver a barreira sadina saltar, lhe meteu a bola redondinha e direitinha por baixo. O capitão foi o primeiro a abraçá-lo, toda a equipa se seguiu no gesto. Porque aquele golinho e o sorriso que se seguiu foi como contornar as linhas tortas pelas quais se escreve este futebol onde as encomendas não chegam em malas, mas em caixas bonitas com voucher e camisolas vintage. Foi uma bofetada de mão cheia, cheia de futebol, dada por uma equipa que não nos cansamos de aplaudir.