O tema da “Comunicação” tem estado na baila no debate sobre o futuro e melhorias no Sporting. Parece ganhar uma certa (e bastante determinada…) unanimidade a noção que o Sporting não está a usar, quer dos melhores meios, quer dos melhores argumentos, na arte de transmitir informação. Já escrevi aqui na Tasca sobre o tema e quase tudo o que pensava mantém-se, logo não vou versar por aí. Mas, como o assunto me interessa particularmente, há dentro desta coisa chamada “Comunicação” alguma confusão, misturando-se tudo no mesmo saco.

Há várias, digamos…necessidades no que diz respeito ao que o Sporting deseja comunicar. Há a Informação pura e dura, que incide sobre eventos, logística e demais factos sobre a gestão institucional de um clube com a grandeza social (ex: onde, quando, como e porquê se vai realizar esta ou aquela acção). Existe a informação ao Mercado, que podemos designar por todos os esclarecimentos e reports sobre operações financeiras de relevo (ex: o jogador x, rescindiu contrato ou o Sporting realizou um protocolo com clube y). Estas não são as áreas em que se aponta caminho a percorrer. O centro da discussão aponta-se claramente ao tratamento do discurso directo e indirecto, à chamada (por mim, mesmo agora) informação opinativa.

É verdade que raramente os media transmitem dados subjetivos relativos ao Sporting de forma positiva. As nossas contratações são sempre “arriscadas”, os nossos investimentos são sempre “jogadas arriscadas”, a nossa gestão é sempre “atribulada”, as nossas posições são sempre “polémicas”, as nossas contestações são sempre “exageradas”. Isto não teria particular importância se fosse dado tratamento igual aos nossos rivais. Isto não teria gravidade alguma se cada adepto leonino fosse capaz de discernir o que é verdade e o que é fruto do alinhamento político/económico dos media. Infelizmente grande fatia dos adeptos (de qualquer clube) não segue a actualidade a um ponto em que lhe seja fácil analisar as “motivações” por detrás das notícias. Pode parecer ridículo, mas há muitos Sportinguistas que não compreendem o papel de Mendes nas finanças dos clubes portugueses, não entendem a “origem” da fornada mais jovem de árbitros da primeira categoria, não dimensionam que o isolamento do Sporting (face à Mendização do Benfica e Doyenização do Porto) tem maior peso que apenas o tipo de jogadores que se escolhe no mercado. A grande maioria dos adeptos que segue o fenómeno do futebol lendo as “gordas” dos jornais e vendo jogos ocasionalmente não detecta a razão porque um jornal faz em poucos meses 10 capas com um jogador de 19(?) anos, apesar de nada nos jogos conseguir explicar todo o foco apontado. A esmagadora maioria dos cidadãos não questiona o que vê e ouve.

A imprensa é usada e usa o que está à sua volta para…vender. Um jornal que faça 1 capa com Rafa do Braga, não vende o mesmo que escolhendo Renato Sanches. Se o título for “bom jogador” venderá menos que um “o maior jogador de sempre”. A informação há muito que deixou de ser objectiva, é sensacional, emotiva, histérica, megalómana, hiperbólica. Porquê? Acima de tudo porque as pessoas reagem cada vez menos ao estímulos moderados e a única forma de captar o interesse num mundo exageradamente informativo é…exagerar. Este é o primeiro problema para quem “comunica” hoje em dia. Mas não é, nem de perto, o maior. Como chega uma notícia a uma capa? O ciclo clássico dir-nos-ia que tudo começa com um jornalista que segue uma “pista” ou uma “fonte”, analisa os dados disponíveis, filtra a veracidade dos factos, investiga até onde for possível e converte todo esse trabalho num texto que poderá ser editado, melhorado, rejeitado ou publicado sem supervisão da sua chefia de redacção. Infelizmente este modo está ultrapassado. Os media são cada vez menos independentes, o que ganham nas suas tiragens é cada vez mais irrelevante na sua viabilização financeira. Os media são hoje, instrumentos numa incessante batalha por poder de manobrar opinião, que pode ser política ou financeira, mas que já está para além da necessidade de fazer um trabalho de excelência para crescer, mas sim a construção da opinião pública que interessa aos accionistas.

Ser um bom jornalista não serve para nada. Ser um meio rigoroso é descartável. O que interessa é ter ligações o mais tentaculares possível com as esferas de poder. Arriscaria que um jovem formado neste Verão em Jornalismo e que eleja o desporto como área preferencial, dependerá muito mais das pessoas que conhece e da sua preferência clubística, do que da sua capacidade de interpretação da actualidade, talento para escrever ou dotes de oratória. Tudo começa, desgraçadamente assim. O corromper dos principais instrumentos de informação em massa, gerou desiquilibrios. Os agentes que participam no processo estão cada vez mais centrados na sua sobrevivência, no fortalecimento do seu status e muito pouco na qualidade do seu trabalho. Quem és e o que pessoalmente defendes passou a ser muito mais relevante que a isenção ou o rigor. O resultado está à vista, 80% de um jornal desportivo é nos dias de hoje uma súmula diária de “recados”, “anúncios” velados, posições não oficiais, vontades de empresas e empresários. Ou seja, um jornal não é uma colecção de factos, é uma reunião de interesses. A grande questão para o Sporting é que estes “interesses” são muitas vezes os que mais desejam o seu insucesso.

Um Benfica esmagador, hegemónico, incontestado é o que os media perseguem. Vista curta que obedece a instintos primários de quem quer alimentar o que pensa ser a melhor solução de “mercado”. Todos somos capazes de concordar que 3 ou mais clubes em condições de igualdade disputariam os títulos de forma mais intensa, gerando mais interesse, mais emoção daquela boa…que emana da incerteza da vitória. O “mercado” seria claramente vitalizado, com ganhos evidentes para qualquer meio de comunicação…isto mais do que lógico, está comprovado. Mas aqui incide a grande distorção. Para que esta opção pelo estímulo à igualdade pudesse ser o paradigma, seria fundamental que os media fossem capazes de autonomamente optar pelo mesmo, mas isso, meus caros não é do interesse de quem está, por agora, a dar cartas e muitas vezes a fazer “lobbing” com vista ao cenário do “Super Benfica”, que devemos lembrar que surge na decadência do “Super Porto”. A problemática da venda dos direitos televisivos é um bom exemplo de como as boas soluções que beneficiam todos, caem facilmente por terra dando lugar a soluções que projectam um em prejuízo dos demais. Ninguém na verdade quer equilíbrio, evolução ou valorização da competitividade. Ao Benfica, neste momento (como ao Porto no passado), interessará muito mais a crise profunda de tudo o que o rodeia, porque na dúvida mantém-se o que é seguro e todo o status quo estagna…o Challenger que é o Sporting…os clubes que desejam o equilíbrio, a equidistância, a evolução por critérios de mérito e justiça são “atacados” pelos demais agentes que nasceram e são mantidos por pactos e compromissos de conservação das forças de poder.

Vieira demorou 10 anos a construir um “palco” onde o Benfica se posiciona no centro. Todas as ideias preconcebidas defendem que interessa defender e alimentar quem “dá dinheiro”. Jornais, rádios, tvs alinham neste modelo porque são incapazes de ter a independência de o contrariar e porque provavelmente durante 10 anos foram concordando com “alinhamentos” e mutualismos que visavam a perda de capacidade de dizer não, dando em troca exclusividades ínfimas, migalhas, “boas relações”. Hoje será fácil identificar numa redacção uma primazia por jornalistas cada vez menos moderados e cada vez mais alinhados com um emblema. Onde no passado se promovia a imparcialidade, hoje estimula-se o “alinhamento” e a “concordância”.

O problema da “Comunicação” do Sporting é este. O seu espaço de acção é-lhe desfavorável e por mais que argumente, aponte falhas, exponha as ausências de critério e direito às mesmas regalias que outros têm…isso simplesmente não vai acontecer. É uma sucessiva onda que se esmaga frente às rochas, sem qualquer tipo de resultado. A meu ver é inútil a direcção, intensidade e caudal da onda. O que temos de mover são as rochas. Ou seja, mais do que mudar a sua “Comunicação”, o Sporting deve estimular a mudança de paradigma dos próprios Meios de Comunicação. O “Super Benfica” vende menos, muito menos que os 3 grandes (ou mais) com o mesmo tratamento, com os mesmos elogios e críticas, os mesmos “achismos”. Por muito que custe a muitos Sportinguistas, o caminho mais promissor para o Sporting é democratização da nossa Liga e FPF, a meritocracia na carreira dos árbitros, a centralização dos contratos de tv. Por mais estranho que pareça, não é imitando o que outros fizeram mal que vamos ascender à posição que desejamos, mas é fazer exactamente o contrário. Não é “jogar o jogo” com recursos a armas e estratégias que outros já dominam à décadas (e que viciaram o tabuleiro para jamais permitir a entrada de um outsider) que vamos chegar ao “Super Sporting”. A “Comunicação” deixará de ser uma preocupação a partir do momento em que entendermos tudo isto. Ter uma “boa” Comunicação não é um objectivo, é uma ferramenta para atingir um fim. Saber qual é esse “fim” ajuda que se farta. Qual é o objectivo deste Sporting? Como o pretende alcançar?

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca