Parece que o tema em cima da mesa na semana que passou foi centrado na entrada de Palhinha no onze e se JJ culpou o jogador ou ele próprio pelo tal guião errado. Sinceramente acho o “carvão” fraco e um pouco sabujo inferir que o treinador do Sporting se desculpou com os “putos” pela derrota no clássico. Não me parece que JJ tenha tentado criar essa ideia e se o tentou fê-lo de forma muito menos directa do que costuma fazer.

É óbvio que a entrada de jogadores que pouco tempo de treino têm com a equipa pode dificultar a agilidade da mesma e até afectar a prestação individual de um atleta, mas isso acontecerá independente da idade ou experiência que tem. O que é mesmo verdade é que o Sporting fez regressar alguns jogadores que têm muito potencial e muita margem de progressão, que talvez sem a responsabilidade e tensão da luta imediata pelo título, tenham finalmente oportunidade de se mostrarem soluções efectivas. E aqui a palavra chave é mesmo “margem”.

Cada vez é mais raro encontrar jogadores que tenham rendimento imediato quando contratados. Bas Dost é uma excepção rara no que tem sido o histórico leonino e talvez por isso tenha custado o que custou, mas é preciso ver o trajecto, idade, jogos acumulados do jogador para entender melhor porque rendeu de forma tão célere. Contratar um jogador de futebol está longe de ser uma ciência, mas eu arrisco dizer que se o Sporting contratar internacionais (actuais) de países como a Holanda, com passagens bem sucedidas por clubes holandeses e germânicos, mais de 2 centenas de jogos realizados e patamares exibicionais bastante regulares, numa folha de registo sem “birras” e amuos ou lesões…falhará muito pouco na obtenção de reforços que mereçam essa denominação.

O problema é que, infelizmente nem sempre é possível atrair este tipo de jogadores. Na maioria das vezes um bom jogador não deseja sair do circuito das grandes Ligas europeias, na maioria das vezes pede exorbitâncias incomportáveis para ingressar num clube português. Sobram mercados alternativos como o brasileiro, o argentino, o colombiano ou outro em que a capacidade financeira de um emblema como o Sporting seja ligeiramente superior. É mesmo dentro deste mercado, não está ao nosso alcance a chegada às grandes vedetas em ascensão, que rumam por somas proibitivas aos grandes tubarões europeus, mas sim a rápida identificação de talento emergente que deseje profundamente dar um salto rápido para uma adaptação intermédia ao contexto competitivo europeu. E aqui, abrem-se muitas portas a problemas de adaptação, imaturidade e desenquadramento. Quantos de nós não nos lembramos de grandes promessas sul-americanas chegarem ao Sporting e ser quase impossível vislumbrar o que alguém possa ter observado de positivo naqueles jogadores. Kmet, Careca e outros são exemplos bem registados na minha lista de horrores.

Foi no aftermath de tanto deste desperdício financeiro que, especialmente depois dos títulos mundiais dos sub-21, se fundou a ideia de que será muito mais barato e muito mais rentável produzir 1 Figo entre 20 Paim´s do que comprar 20 Kmets para obter um Duscher. O El Dorado estava encontrado e juntamente com um projecto empresa-imobiliário “à lá Wall Street”, o Sporting foi se aperfeiçoando estruturalmente numa fábrica de talentos. Escapou aos “engenheiros” do projecto que o futebol não é “apenas” uma indústria e não basta comprar o equipamento e mão-de-obra para o operar para dar resultados. Para que a “fábrica” conseguisse operar em pleno, era preciso um clube estável, uma equipa competitiva e sobretudo uma massa adepta que colocasse as suas ambições imediatas na prateleira, dispondo-se a esperar 6 ou 7 épocas de tentativa e erro. Nenhuma das condições foi satisfeita.

O dirigismo mostrou-se ser o pior preparado, o menos estável e nem a demagogia de “não somos competitivos porque não temos os orçamentos dos nossos rivais” serviu para mais do que umas quantas almas enganadas. Não souberam encontrar e definir os patamares mais correctos para gerar equipas competitivas e a fábrica foi produzindo “munições” que eram mal aproveitadas, mal geridas e muitas vezes oferecidas aos rivais. Os sócios, não tendo nem o sucesso de uma equipa vencedora, nem a estabilidade financeira de um modelo de formação, boicotaram a margem de crescimento de um clube que afastava mais adeptos do que atraía, endividava-se mais do que lucrava, apagava-se mais do que renascia.

O modelo de clube, assente na formação, foi posto de lado e com Godinho no poder o paradigma era outro. O clube compraria o que precisasse e em caso de necessidade ou excelência aí sim aproveitaria os jogadores da Academia. O fracasso foi total. Com muitas semelhanças com esta época, também então se contratou experiência, nomes feitos, do mais duvidoso que cada empresário tivesse para vender. Escolheu-se caro e mal. Desde jogadores com lesões crónicas, a atletas sem qualquer motivação ou disciplina, a bad boys búlgaros… houve de tudo. Curiosamente também nessa altura foram os jogadores da formação (Ilori, Bruma, Dier, etc) os escolhidos para tapar os buracos de um scouting absurdo. O reinado de Godinho terminaria antes do tempo (e muito para além do razoável) e em mais uma pequena revolução, BdC chegaria com uma nova política desportiva.

Contenção era o verbo. Orgulho era o mote. Foi neste misto de políticas (aos olhos de muitos Janelas, irrazoável) que Leonardo Jardim, Marco Silva e JJ foram servidos de plantéis 50% oriundos da formação, experientes e bons intérpretes do que eram as ambições do clube. Patrício, Cedric, Adrien, William, João Mário e outros combinar-se-iam com “oportunidades” no mercado para cumprir uma nova modalidade a que vou chamar de 3ª via. Não seríamos um clube assente na primazia da formação, não seríamos um entreposto de talentos internacionais (o modelo dos nossos rivais), seríamos uma aproximação entre estas duas opções.

Não se pode afirmar que tenha corrido mal. O modelo cumpriu a sua função e o Sporting teve equipas competitivas, que atraíram os sócios, que colocaram valores seguros na “montra” dos milhões. Mas não obteve a confirmação máxima da sua validade e JJ era homem para questionar se o próximo passo não seria gastar mais para ter melhor e mais rápido. E fê-lo. Suportado por uma época onde tudo o que poderia correr bem, correu e onde, de facto, fomos a melhor equipa. Escudado por uma temporada onde só por um penalti ou um golo invalidado (e houve tantos) não recuperámos a liderança, Jesus convenceria BdC a esticar a corda, colocando um pé e meio onde Godinho já tinha andado anos antes. Fatalismo dos fatalismos, aconteceu de novo. Mais uma vez, o Sporting usaria muito mal os milhões que dispôs para subir de nível e embora BdC possa desculpar-se de um mercado muito adverso (Mendes, Doyen, Zahavi e outros controlam muito mercado juntos), a verdade é que a política de contenção da actual direcção foi esquecida e pelos vistos o bom scouting também. Na pressa de gastar os milhões recebidos muito tardiamente por João Mário e Slimani, o clube errou e factura foi mais do que dispendiosa, muito desanimadora.

Na ressaca do espalhanço financeiro e desportivo e com umas eleições à porta, mais uma vez uma Direcção do Sporting decidiria mudar o rumo à coisa, pré anunciando o regresso ao modelo da 3ª via, não sendo ainda óbvio se irá apostar mais ou menos nos atletas formados na Academia que a era pré Jesus. Para já o que é mesmo certo é que o tema vai ser um dos pontos mais debatidos até ao dia das eleições e um dos pólos de discussão mais complexos na definição do que o clube deseja, quer e vai eleger como o paradigma para a próxima época.

A minha dúvida principal é a razão de toda esta cronologia: vamos definir um modelo e apostar nele, ou conforme os resultados e o dinheiro disponível, vamos continuar a brincar aos paradigmas, às filosofias e aos projectos. É que até o meu avô já me dizia: “vais levar isso a sério ou vais pôr de lado quando já não tiver graça?

putosacademia

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca