É verdade. Com os quatro golos do trovão holandês ficou ofuscado o poker de Ana Capeta, frente ao CAC, na goleada 0-10 imposta pela nossa equipa de futebol feminino.

Tenho a dizer-vos que mais do que a canhota da Joana Marchão ou o instinto goleador da Solange, a Capeta, com o 7 nas costas, é a minha jogadora preferida. Já a apelidei de Sá Pinto versão fem e a verdade é que o espírito que a alentejana coloca em campo é mesmo contagiante (disse e repito: foi a sua entrada que desequilibrou o histórico jogo, frente ao Braga). E, à conta destes 4 golos, encontrei um texto de 2013 sobre a Ana que venho partilhar convosco.

Ana Capeta, A Princesa Rebelde
Ana Capeta figura em destaque na Seleção Nacional Sub-16 que disputou o Torneio de Desenvolvimento da Uefa, e apontada como a grande revelação da equipa nacional, na verdade só foi surpresa para quem, não a conhece e a não vê todos os domingos a emprestar a sua magia ao futebol no Alentejo.
A sua fibra fica patente na sua resposta no seu BI Futebolístico do Portal Futebol Feminino Portugal, em que muito antes das convocações para a seleção nacional e quando questionada sobre as internacionalizações ela afirmava:”Espero estrear-me o mais cedo possível”.

Ana Capeta começou a jogar futebol no OPERÁRIO FUTEBOL CLUBE (Rio de Moinhos – Aljustrel) aos 6 anos de idade. Cedo deu nas vistas pela sua garra, mas principalmente pela sua capacidade técnica bem acima da média dos seus companheiros de equipa (masculinos). Fosse na frente de ataque, onde decidia os jogos, fosse na baliza, revelando também aí qualidades de eleição, a Ana Capeta veio a desenvolver cada vez mais a sua qualidade de jogo e a paixão pelo futebol.

No entanto, o gosto pelo desporto levou-a a praticar atletismo simultaneamente com o futebol, integrando os quadros do Núcleo Recreativo e Cultural de Messejana, sensivelmente aos 10 anos de idade.
A sua capacidade atlética incomum cedo deu nas vistas, vencendo dezenas de provas nas mais variadas vertentes do atletismo, com especial destaque para o corta-mato. Muito jovem logrou alcançar o record distrital dos 600m, batido apenas este ano.

Entre inúmeras medalhas e troféus, conta no seu currículo com os seguintes títulos:
– Campeã do Alentejo em Corta Mato 2012 (Iniciada);
– Campeã Distrital em Corta-Mato 2012 (Iniciada);
– Campeã Distrital 800 metros em 2012 (Iniciada).

Continua a competir simultaneamente no futebol e no atletismo, chegando a correr, na presente época, duas provas de corta-mato, intervaladas com um jogo do campeonato de futebol 7 feminino do distrito de Beja, tudo no mesmo fim-de-semana.

Atleta ímpar, passou pelo Sport Club Mineiro Aljustrelense na época 2010/11, onde se sagrou a melhor marcadora do campeonato distrital de futebol 7, com apenas 13 anos, registe-se, no escalão sénior.
No ano seguinte mudou-se de armas e bagagens para a Casa do Benfica em Castro Verde, em detrimento do seu clube da terra, onde cresceu imenso como jogadora, atingindo patamares de excelência que a levaram a integrar a Selecção Distrital de Futebol 7 de Beja e, sendo presentemente a Capitã da Selecção Nacional de Futebol 11, onde regista duas internacionalizações e 2 golos marcados. Na época passada sagrou-se vencedora da Supertaça Distrital de Futebol 7 Feminino pela Casa do Benfica em Castro Verde, sendo presentemente a melhor marcadora do campeonato, acumulando 35 golos no campeonato e 6 golos na taça distrital.

Para sabermos algo mais sobre Ana Capeta, Princesa do Alentejo, pedimos a Gonçalo Nunes seu treinador na CB Castro Verde que nos falasse sobre a jovem jogadora, e quem melhor que ele para nos falar das suas façanhas futebolísticas?

capeta

E Gonçalo Nunes passa a relatar:
“Decorria o dia 5 do mês de setembro do ano 2011.Ao chegar ao Complexo Desportivo em Castro Verde, deparo-me com uma ou outra cara conhecida da época transacta. Sentada num pequeno muro está uma menina franzina, de sorriso rasgado, a quem havia prometido uma oportunidade. Não se tratava de uma oportunidade, para se mostrar tecnicamente, antes uma oportunidade para se mostrar enquanto pessoa, ver até que ponto iria a interação com as demais jogadoras do já estabelecido plantel.

A sua qualidade técnica já era sobejamente conhecida, chegava a hora de lhe proporcionar a oportunidade de vingar num novo grupo e de um modo que nunca lhe tinha sido exigido porque, entendo, o futebol de formação, deve ser direcionado para a formação pessoal em primeira instância e só depois dar ênfase à parte desportiva, aquilo porque afinal estavam ali todas aquelas Meninas.
Nos breves momentos de conversa que mantive com esta Menina franzina repito-lhe exactamente o que lhe havia dito quase 3 meses antes: “este é um grupo diferente, preciso de ver como te adaptas às minhas jogadoras e ao espírito do grupo”.

E momentos volvidos, nesse mesmo dia, vi esta Menina rir com o mesmo riso que ainda hoje nos brinda, um riso de menina rebelde e cativante que acompanhavam o jeito rebelde dos seus longos cabelos loiros. Vi esta menina abraçar esta nova família e olhar para ela com um especial carinho.

A esta Menina, carinhosamente chamo Princesa Rebelde, porque não houve coração que não fosse rapinado pelo seu gentil, inocente mas desafiador modo de ser. A Ana Capeta passou a ser uma das minhas Meninas, trazendo consigo uma perfeita Alma Gémea na Jeka Pacheco, tornando-se ambas parte do núcleo duro desta família.
Durante meses trabalhei a Ana com a maior devoção que me é permitida. Não lhe ensinei nada tecnicamente, apenas explorei o melhor que lhe é inato, corrigi posicionamentos, exigi mais e melhor desta Menina, procurei mostrar-lhe que a exigência não tem limites para chegar a um patamar de excelência.

A Ana, embora com o sorriso desafiador da sua meninice tão ternurenta, acatava cada palavra que lhe transmitia, crescia a passos largos, cerrava os dentes sempre que lhe apontei defeitos ou lhe dava sermões bem merecidos, e lutava com todas as forças no momento imediato, valorizando a sua técnica com tudo o que lhe tentara transmitir momentos antes.

Soube ter paciência, soube ver que o crescimento sustentado que preparara para ela passava por dar valor ao colectivo, em detrimento da individualidade. Soube crescer na mescla de meninice e veterania da nossa equipa. Soube ver nas companheiras as suas amigas de eleição mas também as suas Professoras, literalmente falando. Passou por uma e outra posição no terreno do jogo, passou pelo banco de suplentes, passou pela bancada quando o temperamento ainda se encontrava muito verde.

A Ana tornou-se rapidamente na menina que se equipava a correr para entrar logo nas brincadeiras de troca de bola e desafio ao seu “Mister”, bem antes de todas as demais entrarem no campo de treinos. Tornou-se sedenta de futebol e amizade, procurando cada vez mais um acompanhamento extra futebol que me deixa orgulhoso.

Pelo meio houve dificuldades, barreiras a ultrapassar, situações em que senti em mim a dor que lhe cabia no peito, mas que juntos, com todo o apoio de todas as nossas Meninas, soubemos deixar para trás das costas.
Celebrámos vitórias e chorámos derrotas. Mais cedo do que esperávamos, eram mais as vitórias a festejar do que desfechos menos favoráveis, em todos os campos, desde o do futebol ao escolar, do desportivo ao humano.
A Ana cresceu! A Menina que vi nela num primeiro momento estará sempre presente, mas a Mulher sobressai sobremaneira hoje em dia. Passou a ser líder em campo e no balneário. Começou a escrever a sua própria história, impõe respeito nos adversários, sejam homens ou mulheres, seja treino ou competição.

Nestes últimos dias olhei para a Ana e vi uma atleta corpulenta face à franzina Menina que recebi num primeiro momento. Vi uma atleta madura, com um caminho a percorrer, mas que já traçou o seu destino – uma permanente luta por se superar!

Nestes últimos momentos, vi uma Menina com uma tremenda atitude a liderar tão eloquente a equipa de todos nós. Olhei bem para ela, vi as tão sonhadas quinas no seu peito, o peito bem repleto de sonhos mil.
Vi a minha linda Princesa Rebelde ostentar com orgulho a braçadeira no braço esquerdo, a magia do mítico 10 ornamentando-lhe o peito e as costas, e as lágrimas a caírem-me na primeira nota d’A Portuguesa.
E veio o primeiro toque na bola, e veio o primeiro golo (e que golo, típico das predestinadas…), e mais lágrimas de felicidade e orgulho.

Pelo meio, muita garra, toda a entrega que esperava da Ana, e a certeza de que a braçadeira ficou bem entregue, tal foi a capacidade de liderança com todas aquelas Meninas com as quinas ao peito.
A minha Princesa Rebelde abriu as asas e o resplendor é notório.
Nunca deixes de Sonhar, Ana Capeta!”