Já abandonou Portugal há mais de um ano e meio, mas Marcelo Boeck está longe de ser um nome desconhecido para o adepto português e, principalmente, para o adepto sportinguista.

O guardião brasileiro, que também jogou pelo Marítimo, passou cinco temporadas e meia em Alvalade, sendo recordado por todos como um profissional exemplar e um sportinguista nato – quem não se lembra de ver o guardião, no banco, a cumprir o papel de motivador das tropas… O zerozero conversou com o atual guardião do Fortaleza, que aproveitou a deixa para recordar a passagem e a saída de Alvalade, com muitos elogios pelo meio…

Para qualquer jogador brasileiro, a possibilidade de alcançar o futebol europeu é um sonho. Marcelo não foge à regra, apesar da chegada ao Sporting não ter atingido a singularidade que o guardião reclama. «Eu tinha o grande sonho de jogar num grande clube da Europa. Eu queria permanecer e fazer bonito. Até por ser o primeiro guarda-redes brasileiro da história do Sporting…» Na verdade, o zerozero foi verificar e Marcelo foi o 3º brasileiro a defender a baliza verde e branca – Jaguaré e Aníbal Saraiva já tinham jogado.

Ainda assim, apesar do erro de pormenor, Marcelo sentiu bem o impacto de uma chegada a um clube com dimensão europeia e as primeiras impressões mantêm-se vivas desde então.

«Lembro-me do primeiro jogo, contra o Famalicão. O meu primeiro jogo de pré-época, diante da Juventus. Lembro-me do Rui Patrício, do Paulinho… Lembro de Alvalade lotado, aquilo em que todo o jogador sonha ver. A revolução com a chegada de Bruno de Carvalho. Eu devo muito ao Sporting, por me ter formado com essa cultura.»

Depois de uma época a brilhar no Marítimo, Marcelo Boeck foi contratado pelo Sporting para fazer concorrência a Rui Patrício. O internacional português já era o dono da baliza sportinguista, tendo continuado a ser mesmo depois da chegada de Boeck a Alvalade. Mesmo assim, a concorrência não impediu uma total admiração, a todos os níveis.

«Eu sabia que tinha um guarda-redes campeão europeu, referência do Sporting. Tivemos sempre um relacionamento de muito respeito, de muita amizade. O Rui Patrício é o que é pela pessoa, pelo caráter, pelos princípios que ele tem. Ele merece tudo de bom. Não joguei tanto, mas compensou pelas experiências vividas. Pessoa de família, de educação. Foi uma relação muito boa. Para mim, ele é um fora de série..»

Em Alvalade, Marcelo Boeck trabalhou com uma série de treinadores, muito devido à instabilidade que durante algum tempo se apoderou do clube. Ainda assim, para o guardião, há um que se destaca entre os demais. «Jorge Jesus foi, para mim, apesar de ter trabalhado com ele apenas oito meses, o melhor treinador que já tive. O aspeto tático, técnico dele, os mind games dele…Não é somente um treinador. Ele às vezes passa uma imagem que não é humano, que é arrogante. Não é nada disso! Em Arouca, no dia em que eu fui embora, nós tivemos uma conversa franca. Eu expliquei porque é que queria sair. Demos um abraço muito forte, até com lágrimas nos olhos. Tenho a certeza que o Sporting vai fazer história.»

Deixarmos um lugar onde passamos bons tempos nunca é fácil. Marcelo Boeck passou por um mau bocado quando teve de fazer uma escolha (difícil), ainda que as coisas tenham sido pensadas com tempo e…com razão.

«Eram seis anos de Sporting e nove de Europa, os meus filhos começaram a crescer e começaram a ficar longe da família. Eu também queria terminar a carreira no Brasil. Tinha dois anos e meio de contrato com o Sporting, mas se eu esperasse o final do contrato, regressaria ao Brasil com 34 anos… Não teria um mercado muito bom. Foi uma decisão pensada em família, não na emoção», refere Marcelo Boeck, não sem antes elogiar o comportamento dos responsáveis leoninos na condução do processo. «Queria voltar a jogar. Foram conversas leais. Tudo o que presidente prometeu, cumpriu. Hoje, devo muito ao Jesus, devo muito a Bruno de Carvalho.»

Ainda assim, o atleta brasileiro admite algumas dificuldades para gerir o processo de saída. «O único arrependimento foi no final da minha passagem pelo Sporting. Já tinha tido algumas propostas, não saí, e quando chegou a proposta da Chapecoense eu queria ir muito. A cabeça do jogador mexe um pouco. O final poderia ser mais tranquilo.»

A tragédia que assolou a Chapecoense, em novembro passado, marcará sempre a carreira e a vida de Marcelo Boeck. Para lá da tragédia, ficam as demonstrações de carinho. A do Sporting, para o guardião, perdurará na memória. «Quando aconteceu essa tragédia, o Sporting foi o primeiro clube europeu a chegar. Nós estávamos lá e o primeiro clube a chegar foi o Sporting, através do Virgílio Lopes. Fala-se muito da ajuda do Barcelona, mas o primeiro clube a aparecer foi o Sporting. Não esperava nada menos desse grande clube, dessas grandes pessoas. Só comprovou aquilo que o Sporting é…»

Antes do final, uma pequena mensagem: «Sei do carinho que a torcida tem por mim, do respeito por ter sido o capitão. Vou torcer sempre.»

 

marcelobruno