Valem 3 pontos dizem alguns treinadores. Valem 6, dizem os analistas. Para mim, a importância de um derby vale muito mais que pontos. Vale orgulho, história e tradição. Ganhar ou perder pontos contra a maioria das equipas ao longo de uma época, vale os pontos que estão associados ao resultado. Num derby, retiram-se e somam-se muito mais que subidas ou descidas na tabela, é a prova dos nove da grandeza das equipas, do seu carácter, da sua fibra, da sua arte, engenho e empenho em prevalecer face a alguém “do seu tamanho”.

Com a minha idade, já vi muitas dezenas de Sporting-Benfica e Benfica-Sporting e quase que me consigo lembrar da grande maioria. Lembro-me das asneiras épicas dos defesas, dos grandes passes dos meio-campistas, dos grandes golos dos avançados, são jogos que nos ficam gravados de forma diferente no “disco-rígido”. Este não fugirá a essa regra e muito menos a outra fundamental: a incerteza. Poucas vezes nos atrevemos a antecipar ou a adivinhar o resultado de um jogo desta natureza. Isso deve-se sobretudo ao grau aleatório do jogo e à paridade entre as equipas. Às vezes a bola vai ao poste e entra, às vezes vai ao poste e sai, tantas vezes a mão vai à bola e o árbitro manda seguir o jogo.

Neste momento pouco interessa quem está à frente, quem se exibe melhor. Tudo pode mudar em 90 minutos. Se o Benfica jogar melhor e vencer a partida, os seus adeptos aplaudirão a façanha e depressa se posicionarão ao lado da equipa, fechando os olhos ao grau máximo de banalidades “puxa-saco” de Rui Vitória e aos 90 gigabytes de indícios de aldrabice da direcção. Se o Sporting vencer, corta-se a última corda de paciência que mantém o “barco” lampião à tona da estabilidade directiva. Se o Benfica somar os 3 pontos, os anti-jesuítas leoninos marcarão plenário extra nas redes sociais. Se o Sporting sair da Luz com a vitória, valha-nos alguma contenção para não corrermos para Alvalade celebrar… 3 pontos.

E claro… há ainda o empate. O que neste caso quererá dizer que tudo ficará na mesma, com alguma margem de manobra para as hostes leoninas, uma vez que manterão 3 pontos de vantagem e o jogo… é fora. Ainda que isso se possa traduzir na perda de 2 pontos e na perda da liderança para o Porto, a verdade é que o empate sorrirá mais aos verde-e-brancos.

Mas, parece-me, desta vez ninguém irá entrar nas quatro linhas com esse objectivo. O Benfica “precisa” da vitória, o Sporting sente-se confiante que pode ir à Luz somar os 3 pontos. Provavelmente pelos mesmos motivos. Arredados de todas as provas, resta a ilusão do penta ao Benfica e isso atrai ansiedade e pressão extra. Tanta pressão como a provável retirada de investimento nos dias seguintes, o plantel encarnado ficará (ainda mais) desenquadrado para disputar uma única prova, a 6 pontos de 2 adversários e com muita indefinição na capacidade do treinador em dar a volta a uma época que só tem trazido…desaires.

dostluz

Além do mais, olhando para o plantel do rival, podemos ver muitos deadlines decisórios quanto à lógica de retorno de investimentos. Esta será a última época para muitos jogadores, a última oportunidade para realizar encaixes com as suas transferências e sobre muitos pesa o anátema de fazer um último bom contrato. Esperar por Maio para realizar uma boa dezena destas operações pode ser…trágico. Numa má época, é muito difícil valorizar ou sequer manter o valor de um jogador e as contas do outro lado da 2ª circular não andam propriamente “famosas”. Existe ainda outro factor de pressão. O #BenficaGate ou o Caso dos Emails é uma enorme bola de neve de desmotivação da massa adepta. Embora nunca confessada, existe de facto um acordar dos sócios benfiquistas para o que é, de todas as formas e feitios, uma verdadeira vergonha e humilhação auto-provocada.

Na maioria dos clubes de gente adulta, o que já foi revelado e embaraçosamente não desmentido, serviria para pelo menos gerar um massivo movimento de contestação à direcção. Mas, cada vez menos me parece que o Benfica seja um grupo de sócios preocupados com o bom nome e lisura da sua instituição. É sim, cada vez mais, um “Porto” travestido de águia, mafiosamente estruturado para ganhar e, de qualquer forma possível e imaginária, podre e torpe ”as it gets”, somar títulos. Os silêncios e permissividades, os medos e as vergonhas, ainda assim, só serão sofríveis enquanto se ganha e quando isso não acontece…ninguém gosta de ser o Al Capone versão Alcatraz.

Por todos estes pontos de pressão, torna-se mais que evidente que com a mínima sombra ou promessa de um mau resultado, a tal “chama imensa” da Luz pode servir para queimar os próprios e é esse o principal objectivo da nossa equipa. Criar dúvida, suscitar receio, prometer dificuldades. Se o fizermos desde o primeiro segundo de jogo, concentrados na nossa força e habilidade, retiraremos também a cada segundo, um pouco de motivação e crença na equipa adversária. E como em todos os derbies, ganha quem tiver mais foco, mais “cabeça” no jogo e nas suas nuances. Ganha quem se preocupa com a criação de oportunidades e tem a frieza das concretizar. O Sporting tem, a meu ver, alguma capacidade acrescida (nesta altura) de poder reunir estas condições, pelo menos, bem maior que o seu rival e leiam bem as minhas palavras… isso passará pouco por sermos mais ofensivos ou ter mais posse de bola. Interessa ser absolutamente mais incisivo, mais frio e…mais seguro.

Espero que JJ faça o trabalho de “conduzir” Rui Vitória ao jogo que mais nos interessa. Espero que Gelson e Acunã abram os buracos para descobrir Dost na área. Espero que William e Battaglia mandem no meio-campo. Espero que B.Fernandes seja o desequilibrador do jogo a nosso favor e que Pondence entre na 2ª parte para partir o resto da barraca. Lá atrás, só espero tranquilidade e concentração e apenas temer o Jonas dos clássicos… uma versão bastante mais contível que o Jonas de Tondelas e afins.

Espero sobretudo que tudo o que rodeia o jogo corra dentro do que é normal, ordeiro e civilizado. Isto é futebol. Apenas isso. Por maior que seja a importância de um derby… será sempre um jogo de futebol. Apenas e só um jogo de futebol.

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca