Uma primeira parte inenarrável de tão má, uma segunda a justificar o empate e um troféu conquistado no desempate por grandes penalidades. O Sporting quebra o jejum da única forma que parece saber fazê-lo: a sofrer (mas também dizem que isso duplica das doses de felicidade)

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Ninguém esperava entrar a perder, mas foi isso que aconteceu: toda a gente a dormir, a olhar uns para os outros, Paciência a ganhar no corpo a Coates (pior jogo de sempre com a camisola do Sporting, incapaz de papar um lance ao 9 sadino), a rodar e a marcar um golo de belo efeito.

Aos 3 minutos o Sporting dava avanço ao Vitória de Setúbal e deixava os adeptos sem pinga de sangue com 15 minutos iniciais onde não se acertava a um passe, uma marcação, uma jogada e onde Patrício ainda teria que ir ao relvado buscar uma bola de golo. Surpreendidos pelo posicionamento do adversário, que pressionava alto William, Coates e Mathieu, os Leões viram-se incapazes de sair a jogar, com a agravante de Piccini não existir, de Ruben Ribero ser um zero preso à direita, de Bryan Ruiz ser um corpo inconsequente de esforço e de Bruno Fernandes estar numa sessão de mímica onde imitava Pontus Farnerud. Sobrava Dost, a pregar num deserto de ideias e de futebol que se arrastou até ao intervalo e que deixava uma enorme interrogação sobre o que faria o Sporting no segundo tempo.

Havia, no entanto, uma certeza: pior do que aquela verdadeira vergonha não poderia ser! Jesus deixou Bryan e Rúben a tomarem banho e puxou da raça argentina de Acuña e de Battaglia. E foi tudo diferente, muitas vezes com a equipa a jogar em 3-4-1-2, mas, ainda assim, com uma jogada que poderia ter matado o jogo: Paciência novamente a inventar um lance (bom ponta de lança está ali), Patrício a ir ao relvado e na recarga, com a baliza completamente escancarada, João Teixeira atirou a rasar o poste.

Foi o canto do choco, pois a partir desse momento os sadinos não mais conseguiram sair em contra ataque. Deram o berro fisicamente e foram-se encostando cada vez mais lá atrás. Coates tem a baliza completamente à mercê, mas o remate de fúria descontrolada sai em direcção ao País de Gales. Estavam decorridos 50 e qualquer coisa minutos e era a primeira real oportunidade de golo do Sporting (incrível, não é?). Um Sporting que tinha finalmente bola entre linhas, com Fredy Montero a ser o verdadeiro pivot de todo o jogo leonino entre a defesa e o meio-campo defensivo dos sadinos.

Sentia-se que o golo estava próximo, mas pareceu ficar mais distante quando o colombiano, que subia de minuto para minuto, dá o lugar a Doumbia. Foi-se a força da técnica, ficou a força da força e diz que o que tem que ser tem muita força, por isso Dost encontrou forma de arrombar o cofre: ganha de cabeça para grande defesa, na recarga Coentrão vê o redes ir buscá-la novamente e surge Dost, qual Hulk, a esmagar Doumbia para cabecear para a baliza onde, sobre a linha, um defesa corta com o braço.

Perdem-se minutos não compensados nos patéticos cinco minutos de desconto finais, mas ganha-se verdade e fica-se com a certeza de que, com VAR, este Taça teria chegado ao Museu há 9 anos! Ou, se preferirem, também ficamos com a certeza que, sem VAR, esta Taça da Liga nunca seria nossa. Mas ainda não era. Dost fez ice face e meteu-a lá dentro, mesmo que perplexo pelo facto de Tomás Podstawski apenas ter visto amarelo em vez do esperado vermelho (confesso que desconheço se o facto do redes estar atrás do médio altera a cor do cartão a mostrar, mas foram tantas as vezes que o Rui Costa se equivocou nos cartões – incrível como o trauliteiro do Issoko, por exemplo, vê amarelo nos descontos, por queimar tempo – que um gajo nem se admira).

Depois foi Bruno Fernandes, por duas vezes, a tentar evitar os penaltis. Bomba de fora da área para defesa; remate cruzado que sai ao lado, com o redes completamente batido e pregado ao relvado. E terminou, com a decisão a ficar a cargo dos artistas que avancem para a marca dos onze metros. São os mesmos?!? O Coates e o William outra vez?!? Dost marca, Bruno Fernandes marca na perfeição, Mathieu imita-o com o pé esquerdo. O tal do Podstawski, que devia ter sido expulso por ter feito penalti, atira à barra (“a karme é uma bicha”, pensou Jorge Jesus) e fica tudo nos pés dos gajos que parecem ter menos pezinhos para esta coisa das penalidades. Coates já marcou, Rui adivinhou, mas não lá chegou, e lá vem ele, o 14, ainda por cima a rir-se. E quando o gajo remata e escorrega, a bola sai direitinha para canto inferior direito onde o redes não chega e para onde a bola não iria se o gajo não tivesse escorregado quando remata.

Ele levanta-se e arranca, mão a bater no Rampante, e nós agarrados ao nosso e com menos dez anos de vida, sentindo-nos um Rui Patrício que salta à Tom Sawyer festejando para a bancada enquanto correr atrás dos companheiros. Nós respiramos fundo, sorrimos para quem nos acompanha nesta montanha russa, querendo acreditar que isto é o passo necessário para próximas conquistas e fingindo acreditar que poderá ser de forma diferente da que foi esta noite. Não será, de certo. Somos adeptos do Sporting e umas das músicas da banda sonora da nossa vida faz-nos cantarolar «I’m only happy when it rains,
I’m only happy when it’s complicated»