Sim, é desta que me vou debruçar sobre a conferência de imprensa anunciada como “o um ponto de situação para os Sportinguistas que colocará um ponto final no silêncio estratégico”. E, desde logo, tenho a dizer-vos que de ponto de situação pouco ou nada serviu. Pelo menos daquele ponto de situação que eu estava à espera.

O que aconteceu, na passada sexta-feira, foi uma espécie de início de ajuste de contas com o passado. Estrategicamente, tratou-se de utilizar os canais abertos para fazer passar a mensagem ao maior número possível de Sportinguistas, nomeadamente aos que ainda idolatram Bruno de Carvalho, dando o pontapé de saída para as conclusões da auditoria que há-de ser apresentada ao pormenor numa futura AG.

No final, falou-se do passado. E, no dias seguintes, do passado de falou, com os batuques ao rubro, fazendo tal barulho que, pelo menos eu, não me recordo de uma ideia concreta a respeito do futuro.

Vamos dar os primeiros dados da auditoria, o relatório final ainda não nos foi entregue. A seguir a situação financeira, estratégia do futebol profissional e da marca Sporting“. Vamos a isso, então.

Claques
ficámos a saber que tinham direito a 865 bilhetes grátis, que podiam comprar 1000 ao preço mais barato que, recebem 50% da quotização dos sócios inscritos nas claques e que, desde 2013, a dívida passou de 115 mil euros para 746 mil, sendo quase tudo da Juve Leo.

Diria que esta foi a melhor parte da intervenção de Frederico Varandas. Há quem diga que é burro por estar a comprar esta guerra, eu digo que está a fazer o que já devia ter sido feito. Achar que “é injusto estar a criticar gajos que estão lá sempre” é ignorar, por exemplo, que um “capo” saca mil euros por cada jogo de megafone na mão. É ignorar as recentes ausências nas mais diversas modalidades. Isto não é só cantar “minha paixão é o Sporting” e, depois, quando a paixão tem que sobrepor-se aos euros, só aparecer quando apetece. Como Frederico Varandas disse, e bem, “as claques são um negócio”.

Sociedade de advogados MGRA
Diz que é a empresa onde Alexandre Godinho, à data vogal do Conselho Diretivo, trabalhava. E diz, também, que, em 2018, contrataram o ex-sogro de Bruno de Carvalho para associado. Mas o problema maior prende-se com um alegado conjunto de facturas no valor de 1,7 milhões em três anos!!!, ou seja, o Sporting terá gasto numa só empresa mais 50% do que com todas as outras em 16 anos.

O que se ficou a saber é que o nosso actual departamento jurídico não tem visibilidade sobre o trabalho que foi feito e que as facturas indicam que essa brutalidade de dinheiro se deveu a trabalhos como “assuntos da presidência, agenda reunião Sporting, preparação de reunião, vários contactos com Bruno de Carvalho, ponto de situação, correspondência com o presidente, contactos com o presidente, aconselhamento ao presidente”.

Não sei se podemos acrescentar a estes serviços os processos levantados a vários sócios, mais ou menos notáveis, mas sei que, a confirmar-se, será uma autêntica vergonha, com Bruno de Carvalho a sair completamente desfocado na fotografia e a Joana Ornelas a esfregar as mãos de contente.

Xau Lda
Ao que parece, existe um pagamento de 60 mil euros referente a brindes e ofertas e outro de 20 mil por serviços de divulgação da marca Sporting na comunidade chinesa. Também ao que parece, o departamento de merchandising não conhece esta empresa que fechou atividade após os pagamentos.

Chama-se a isto, negociatas. Terá que ser esclarecido.

Batuque FC
Um clube de Cabo Verde com quem foi celebrado um contrato conferindo o direito de preferência do Sporting sobre 7 jogadores pré-identificados. Parece que não existe qualquer relatório do clube ou de terceiros sobre jogadores daquele clube, mas sabe-se que, em janeiro de 2018, foi solicitada pela SAD ao departamento jurídico uma minuta de acordo de resolução daquele contrato. Ainda assim, cinco meses depois, foi liquidado o valor de 230 mil euros e nunca mais vimos cor ao dinheiro.

Onde foi parar esse dinheiro? Quem são esses jogadores? Porque raio é que se mentiu dizendo que Jovane era um deles?

Compra de jogadores
Citando o tablet do presidente: “Desde 2013 comprámos 108 jogadores. Sabem quantos jogaram mais de 1000 minutos na equipa principal? 68. Compraram-se 38 jogadores diretos para a equipa B, nenhum chegou à equipa A e a equipa desceu de divisão”.

Não é propriamente novidade. Aliás, foram várias as vezes que aqui, na Tasca, questionámos essa política que viria a descambar totalmente assim que Jorge Flop Jesus assumiu rédeas e achou por bem matar o projecto de uma equipa assente na formação. Mas já antes de JJ vinham os Rabias da vida e o Inácio davas voltas pela Roménia, celebrando parcerias em discotecas. O lado miserável do futebol a que ninguém escapa. O lado do dlim dlim, como diria o Nani.

Seja como for e neste enquadramento, gostaria de perguntar a Frederico Varandas porque raio veio David Wang fazer erasmus na nossa equipa sub-23?

Sócios
Parece que dos 170 mil sócios, apenas 84 mil têm as quotas em dia. Foi pena não ter escutado uma ideia em relação a como tencionamos inverter isto, ainda para mais numa altura que o futebol afasta cada vez mais pessoas de Alvalade.

Finanças, mercado e all ins
Zenha traçou o cenário: «Quando tomámos posse encontrámos um clube numa situação de tesouraria difícil, pela necessidade premente de um revolving da emissão de empréstimo obrigacionista que tinha vencido em maio e foi estendido para novembro. Fizemo-lo numa conjuntura adversa, tivemos apenas um par de meses. Herdámos também uma dívida a fornecedores até junho de 2019 de mais de 40 milhões, a maior parte é com clubes e agentes. Herdámos o pagamento de metade do plantel do Sporting. Sou franco: a gestão que foi feita em 2018 foi completamente irresponsável. Em janeiro de 2018 o Sporting estava a antecipar receita futura para comprar um jogador e um par de meses depois não ter dinheiro para pagar salários e ter de recorrer à conta reserva para comprar VMOC»

No fundo, disse o que já todos sabemos: estamos sem dinheiro. E acrescentou o que sabíamos que ia acrescentar: despachámos Nani e Montero para poupar nos salários e segundo a direcção, os jogadores que entraram são jovens e «permitem criação de valor a nível desportivo e financeiro». Vamos ver o que fazemos aos Gudelj desta vida e, espero, alguém há-de perguntar na AG onde é que dar um milhão pelo Renan se enquadra na política de contratar jovens com valor desportivo e financeiro.

Ah! Marcar uma conferência de imprensa para dizer “Os sócios podem confiar em nós, o caminho está trilhado. A seu tempo haverá mais novidades!”… pró caralhinho, né?

Formação, qualidade e falta dela
Voltamos ao tablet de Frederico Varandas e vou saltar aquele pormenor dos colchões que só serve para fazer piadas e acabou a provocar-me vergonha alheia: «Herdámos um plantel desequilibrado, jogadores sem minutos, mas uma massa salarial pesada. Não é esta a visão que queremos. Queremos um plantel equilibrado, em que haja grandes figuras mas em que todos possam jogar e acrescentem qualidade.
[…]
É possível fazer com competência, trabalhando na formação e tendo critério nas aquisições. Foi o que fizemos no mercado de inverno. Entraram cinco jogadores, saíram oito e o Sporting reduziu a folha salarial em 10 milhões por ano. A qualidade do plantel aumentou, pois todos os que entraram têm capacidade para jogar. Só os jogadores que entraram nas últimas semanas já jogaram mais minutos do que sete dos que saíram.
[…]
Temos um gap anormal de internacionais entre os sub-18 e os sub-23. Lá batemos nos cinco anos. Dos 38 jogadores que chegaram para B, nenhum chegou à equipa A. A própria equipa B desceu de divisão. A pirâmide está invertida: temos mais miúdos na Academia do que no polo universitário. Temos planteis demasiado grandes»

Sim, é verdade que a nossa equipa de juniores deixa muito a desejar, tal como é verdade que há jogadores nos sub-23 que nunca chegarão à equipa principal, mas… o que vai acontecer a Diogo Brás e a Bernardo Sousa, por exemplo? Até quando Max vai andar atrás de um Renan e de um Salin? Até quando um Daniel Bragança ou um Bruno Paz vão ter que ver jogar um Gudelj ou um Petrovic? Até quando vamos comprar Dyabis e emprestar Matheus Pereira? Até que idade vamos continuar a emprestar Domingos Duarte, Ivanildo ou Guilherme Ramos, para contratar um André Pinto ou um Bruno Gaspar? Porque é que Pedro Marques e Pedro Mendes não têm hipótese de mostrar serviço, ao invés de contratarmos Castaignos ou um Luiz Phellype?

Diz Varandas, confrontado com o facto de Keizer utilizar poucos jogadores da formação, «Quando se vai ao mercado de janeiro ou de verão, compra-se um jogador feito. Na formação não se compra, forma-se e isso demora tempo. Não tenho dúvida que o treinador vai jogar com quem tiver qualidade e o futuro do Sporting tem de ser com a base da equipa com a formação, mas para isso temos de ter qualidade»

E se fosses apanhar na peida, ó Varandas?!? Max não é inferior a Renan ou a Salin; Thierry não é inferior a Bruno Gaspar; Domingos Duarte ou Ivanildo Fernandes não são inferiores a André Pinto ou ao gajo que veio passar férias (Marcelo. E já nem falo de Demiral); Bruno Paz e Daniel Bragança não são inferiores a Petrovic e a Gudelj; Francisco Geraldes é infinitamente melhor do que qualquer Misic e é opção directa a Wendel ou a Bruno Fernandes; Miguel Luís também é melhor do que os Misic ou os… Marcelo Meli desta vida; Matheus Pereira e Iuri Medeiros são melhores do que qualquer Dyabi; Elves Baldé está pronto a ser lançado às feras; tens o Jovane… Mané será sempre melhor do que qualquer Castaignos! Há tomates para assumir isto?

Este foi, aliás, o grande problema desta conferência de imprensa: olhou demasiado para o passado, quase não deu pistas para o futuro. Eu quero lá saber se tens o sonho de ter a melhor Academia do mundo em 2022 (até duvido que ainda sejas presidente nessa altura, mas isso são outros 500)! Eu quero é saber como isso vai ser feito e o que isso implica! Há coragem para assumir que precisamos de mais alguns anos para entrar definitivamente na senda de conquistas?

E tanto mais ficou por dizer, tapado por um bonito “estamos a trabalhar”.
E ao nível de bastidores, o que estamos a fazer? Relação com outros clubes, existe? Como é gerida?
E ao nível da arbitragem? Ficámos reféns das tuas declarações pós meia final da Taça da Liga? É que tem sido um fartote, incluindo nas modalidades.
Alguém explicou ao Miguel Cal que «tivemos a maior venda de gamebox de 2.ª volta», porque nos anos anteriores esgotávamos as gamebox na primeira fase de venda?
E, já que falámos da marca Sporting, está prevista alguma acção envolvendo naming?

No fundo, Frederico Varandas, foi pouco, muito pouco agendar uma press para lidar com fantasmas do passado sem praticamente dar respostas em relação ao que queremos para o futuro. Talvez porque aches que «esta direção está aqui porque a maioria dos sportinguistas quis», algo que é um equívoco. Não foste eleito pela maioria de Sportinguistas; foste eleito por essa aberração chamada percentagem de votos. É capaz de ser boa ideia perceberes isso.