1 – Como nasceu o teu Sportinguismo quais os momentos do Sporting com que mais vibraste, Álvaro? Descreve um deles.
O meu sportinguismo nasceu com o meu pai, também ele sportinguista, o único entre 7 irmãos (o resto era benfiquista). E lembro-me do 1º jogo a que assisti, em Junho de 1963, tinha eu pouco menos de 6 anos: a final da Taça de Portugal contra o Guimarães, que nos deu acesso à Taça das Taças que viríamos a conquistar. Ganhámos por 4-0 e recordo o penalti do Lúcio “pé de canhão” Soares (que contratámos nessa época, precisamente ao Guimarães) que causou uma polémica pois o árbitro demorou a assinalar. No fim do jogo viria a explicar (na altura os árbitros podiam falar no final dos jogos; curioso que era em pleno salazarismo mas a lei da rolha da FPF veio com a democracia): tinha a noção de a bola ter entrado, mas como foi parar aos placards de publicidade atrás da baliza ficou com dúvidas; ele e o fiscal de linha foram fiscalizar a rede e estava furada, tal a violência do remate. Nessa época, mesmo muito novo assistia a quase todos os jogos em casa do Sporting porque o meu pai, oficial do Exército, estava destacado na chefia da PVT (Polícia de Viação e Trânsito de Lisboa) e tinha lugares no camarote da PSP (que havia em todos os estádios com camarotes). Vi os 16-1 ao Apoel de Limassol (o maior score de sempre em provas europeias) e os 5-0 ao Manchester United (a pior derrota europeia da História do United (na altura com Nobby Stiles, Bobby Charlton, o mago norte-irlandês George Best, o goleador escocês Dennis Law e outros). Essa foi uma grande equipa do Sporting que misturava técnica (Osvaldo Silva, Géo, Pérides, Fernando Mendes, Hilário) e raça (Morais, Mascarenhas, Figueiredo). E os jogos eram sempre empolgantes.
2 – Como tens visto o Sporting desde que te lembras de ser Sportinguista, ou seja, qual a tua opinião sobre o passado e o presente do clube?
O desiderato dos fundadores, a História secular, o Lema do Clube e os seus Valores respondem a essa pergunta. O Sporting é um Clube destinado, desde o início a se tornar um dos maiores da Europa; e esse presságio de José de Alvalade é hoje confirmado por 33 títulos europeus conquistados em 6 Modalidades e por uma História de mais de 20.000 troféus patentes no Museu Sporting; títulos só possíveis porque várias gerações de atletas cumpriram o lema Esforço, Devoção Dedicação e Glória e porque sucessivas levas de dirigentes, atletas e adeptos transportam os Valores do Ecletismo, do Desporto para Todos, da Verdade e Lealdade Desportivas, da Solidariedade Social e da Cultura Leonina. Já levo mais de 55 anos de sportinguismo, mas recordo como marcantes momentos como o do épico jogo com o Manchester, as medalhas Olímpicas de Prata de Carlos Lopes (10.000 metros) e Armando Marques (Tiro), as primeiras portuguesas. A corrida da Maratona dos Jogos Olímpicos de Los Angeles, a volta triunfal de Lopes no Estádio Olímpico e o pranto que não contive quando ouvi o Hino Português a ser entoado pela 1ª vez na maior competição desportiva do Mundo. A equipa maravilha do Hóquei em Patins. A “caminhada” épica da última Taça UEFA particularmente a “remontada” em casa contra o Newcastle (nunca vivi um ambiente tão espectacular como o do público naquela noite de Alvalade; com direito a ser aplaudidos à saída do Estádio por quase 3 000 adeptos do Newcastle). E, mais recentemente, a 1ª conquista europeia do Goalball leonino em 1918, logo na sua 1ª participação oficial na Super European Goalball League.
3- Qual a tua perspectiva de futuro do clube? Como gostarias que fosse?
Aquilo que espero/desejo do Sporting é que cumpra a negociação com a banca da revisão daa reestruturação financeira da SAD e Clube e que continue o ritmo (ou mesmo que o aumente) de conquistas europeias dos últimos 3/4 anos. Claro, desejo que se cumpra o objectivo do projecto do Futebol Feminino do Sporting de se tornar dentro 5/6/7 anos um dos melhores 8 Clubes europeus. E que o Futebol Masculino se consiga organizar e congregar de modo idêntico ao Feminino e ao das Modalidades do Clube: sem desculpas e com compromisso de vitória.
4 – Se fosses candidato quais as principais medidas que aplicavas (Financeiras-Projecto Desportivo -Futebol e Modalidades)? O que achas do sistema eleitoral ? Quais seriam as tuas bandeiras como candidato?
Financeiramente apenas procurava dar cumprimento ao que já estava pré-acordado e combinado por Bruno de Carvalho e Carlos Vieira com os Bancos credores (BCI e Novo Banco) para rever e completar a reestruturação da dívida da SAD e Clube; nas Modalidades apenas teríamos de continuar o bom trabalho já feito, com o mesmo compromisso e a mesma exigência; no Futebol Feminino (que apliquem o que proponho neste meu post de 1 de Abril); mas onde entendo que é necessária uma verdadeira “revolução” é na Comunicação, no Marketing, nos Sponsoring e no Merchandising do Clube, estendendo-os a Todo o Universo Sporting (todas as Modalidades, todos s Escalões, Todo o território nacional, Todos os Núcleos espalhados pelo País e pelo Mundo. Quando operarmos essa revolução, seremos absolutamente imparáveis! Porque somos o Clube com maior expansão de implantação orgânica. Por mais que outros falem de 14 Milhões (contar com o Viriato, o Sertório e o D. Afonso Henriques não devia valer), a nossa expansão é expressa em mais de 240 Núcleos, 100 Filiais e 14 Delegações espalhadas por todo o Mundo.
Entendo que devia, também aqui ser operada outra revolução: Um Sócio, Um Voto seria meu lema de Campanha se fosse candidato. A antiguidade devia ser premiada com o respeito e com incentivos ou recompensas materiais e NUNCA com distorções da vontade maioritária dos sócios e da vida democrática da instituição. Quanto ao resto do “programa eleitoral”, na essência, já está expresso em muito do que defendi atrás.
5 – O que achas dos denominados notáveis ou ilustres e o que farias em relação às claques?
Para mim, o Sporting Clube de Portugal são mais de 3 Milhões de adeptos igualmente notáveis. Este é outro motivo para acabar com a descriminação no número de votos/sócio. Essa distorção também contribui para distorcer a forma como se perfilam muitos dos sócios perante a instituição. Outro “elemento” de descriminação é aquele que é induzido por um certo sentimento de “linhagem” que se instalou em alguns segmentos dos associados do Clube mais ligados a uma camada dirigente que adveio do Projecto Roquette e suas “sequelas”. E aqui remeto de novo à outra revolução de que falei atrás: a da Comunicação, do Marketing, do Merchandising que tem de se voltar e fazer apelo a TODO o Universo Sporting. Este não é apenas um imperativo de sustentabilidade económica e financeira do Clube. É também e sobretudo um imperativo de POPULARIZAÇÃO do Sporting (ou, dito mais correctamente, imperativo de reconhecimento e orgulho na popularidade do Sporting).
Quanto às Claques, acho que o Clube, institucionalmente, deve definir com clareza os limites e as condições do seu apoio às mesmas, no reconhecimento da sua importância como motoras do apoio às equipas do Clube e, simultaneamente, da sua responsabilidade em veicularem os Valores e a Cultura Sporting.
6 – Que medidas aplicarias em relação à melhoria do futebol nacional em todas as suas áreas (arbitragem -ligas -campeonato – mais ou menos clubes, no fundo organização do futebol nacional)?
Aquilo que defendo no post de Balanço e Perspectivas do Projecto de Futebol Feminino, naquilo que concerne ao caderno reivindicativo que o Sporting deveria assumir, pode ser replicado para o Futebol Masculino (exceptuando o que já está instituído, como o VAR, mas incluindo as alterações que também aí proponho – uma delas foi hoje aprovada pela Football Association para a Premiere League inglesa); mas, acima de tudo defenderia uma alteração radical do Quadro competitivo, reduzindo progressivamente o número de Clubes da Primeira Liga até esta vir a ser disputada por 10 Clubes a 4 voltas. Menos jogos por fim de semana = melhores horários=melhores receitas; menos clubes a competir= maiores direitos televisivos por clube (direitos teriam de ser centralizados e redistribuídos por “mérito” consoante a classificação em cada época); 4 voltas implica que clubes como Braga, Guimarães, Rio Ave, e outros recebam 2 vezes Sporting, Benfica e Porto o que contribui para aumentar as suas receitas e reduzir distâncias materiais para os maiores clubes; todos esses factores tendem para um maior equilíbrio por cima, para melhores espectáculos para um progressivo reforço do conjunto dos plantéis aproximando-os mais das realidades dos “tubarões europeus”. Maior qualidade da competição e melhores horários tornam a Liga mais “vendável” para os grandes mercados estrangeiros.
7 – Qual o teu jogo mais marcante como Sportinguista? E qual o teu onze ideal, incluindo um técnico?
O meu onze histórico do Sporting seria (porque a “minha” história do clube só foi vivida a partir de 1963): Vitor Damas, Artur Correia, Stan Valckx, Laranjeira, Hilário, Vidigal, Luis Figo, Osvaldo Silva, Cristiano Ronaldo, Hector Yazalde, Dinis. (Claro que no banco teria, Meszaros, Pedro Gomes, André Cruz, Fernando Peres, Manuel Fernandes, Jordão e Nani).
8 – Álvaro, supõe que estás a falar às massas Sportinguistas num momento importante. Qual seria a tua mensagem?
Não consigo me colocar nessa situação. Não me vejo a falar para as massas.
*às sextas, o Sonhador convida um tasqueiro para a mesa do canto e coloca-lhe uma mão cheia e meia de perguntas às quais não vale dizer talvez
13 Abril, 2019 at 0:51
Antes de mais saudar esta iniciativa de um Sonhador.
Caro Álvaro, tal como os anteriores, que tenho lido com muito agrado, o teu contributo nesta rubrica da Tasca, fez-me acreditar que ainda é possível …
Só um pormenor , é, Esforço, Dedicação, Devoção e Glória ( por esta ordem ), Eis o Sporting Clube de Portugal.
Abraço
13 Abril, 2019 at 0:56
Óptima entrevista.
Uma das vantagens da velhice, como escreveu Shakespeare, é poder ser rezingão. Para mim, apesar de rezingão, foi ter visto jogar o enorme Osvaldo Silva.
Obrigado Álvaro pela referência a este fabuloso jogador.
13 Abril, 2019 at 0:56
Não esperava menos do que uma excelente entrevista.
Leio sempre com atenção os comentários do prezado Álvaro Antunes, tanto aqui como noutros espaços.
Comenta sempre com rigor e assertividade, complementa e enriquece a informação partilhada por outros tasqueiros. E a rubrica “O futebol não é para meninas” é excelente.
13 Abril, 2019 at 9:07
Belíssima entrevista.
Esta rubrica veio trazer uma lufada de ar fresco.
Muito interessante ir um pouco além dos nicks, essencialmente para quem não se conhece.