1 – Como nasceu o teu Sportinguismo e quais os momentos do Sporting com que mais vibraste, ana? Descreve um deles.
Criada num agregado familiar encarnado (pais e dois irmãos benfiquistas e mãe simpatizante do Vitória de Setúbal, mas só porque era da terra onde foi criada – não ligava puto à bola), nunca consegui simpatizar com o clube das gaivotas. As minhas tendências sempre foram verdes, mas houve um primo que deu o empurrão final para me tornar “fanática”: o Vítor. O Vítor que já não está entre nós, que quis o guião da vida dele, cedo demais partiu. E tornei-me sócia graças a um outro empurrão: Zé Henriques. Doente do Sporting, colega de trabalho.

O momento com que mais vibrei foi, sem dúvida, o jogo do primeiro título na minha fase fanática, contra o Salgueiros. O jogo em si, a ida ao Marquês, o acompanhamento via TV da “caravana” sportinguista até Lisboa, com a paragem no estabelecimento do senhor de que não me lembra o nome, que há muitos anos não aumentava o preço do café e que infelizmente nunca teve a alegria de o atualizar, tendo cabido à esposa a “demarche”. Depois desse, muitos outros momentos vibrantes o Sporting me proporcionou, mas nenhum com a mesma intensidade.

2 – Como tens visto o Sporting desde que te lembras de ser Sportinguista, ou seja, qual a tua opinião sobre o passado e o presente do clube?
Sempre senti um orgulho enorme em ser sportinguista por lutarmos em campo, e só em campo, pelas vitórias. E esse é o significado que dou à frase “somos diferentes”. Não por sermos educados e bem falantes ou mais inteligentes do que os outros. Eu não sou nem a primeira nem a segunda, e aceito perfeitamente que a terceira não seja o meu forte. Posso dizer que até 2013, nunca liguei nem me interessei por politiquices. Sempre tive a ideia de que quem estava à frente do clube queria e fazia o melhor por ele. Chocava-me porem em causa a idoneidade dos dirigentes. Sempre defendi quem nos governava, desde Sousa Cintra (acho que foi o último presidente romântico, “carola”, que tivemos pré-BdC), Santana Lopes (apesar do episódio de ter de optar por que modalidades “eliminar”), Soares Franco, Bettencourt, Godinho Lopes… Verdade! Eu só ligava ao que se passava dentro de campo, e o que se passava (e ainda passa) no futebol era mau demais.

Tornei-me fanática quando a fruta e o café com leite começaram a ser servidos em barda, salpicados com uns Carlos Valentes e Fortunatos de Azevedo pelo meio. E então defendia os dirigentes por não depender deles ou dos investimentos que fizessem na aquisição de jogadores (e que grandes equipas tivemos), a bola entrar ou não entrar na baliza, ou simplesmente por os árbitros gostarem de viajar pela agência Cosmos ou de andarem nas “nights” calorentas. Sempre vi o Sporting como vítima da podridão e falta de valores, de verdade desportiva, de lisura de processos. E sempre me orgulhei por nos mantermos um clube grande, com uma massa adepta enorme relativamente ao que o clube conquistava no futebol. Comparava-nos (e ainda o faço) ao David. Cada conquista é uma pedrada no olho da besta Golias.

Comecei a prestar mais atenção às politiquices quando BdC foi eleito. Por se começar a saber o estado calamitoso que o clube atingira. Ora, quanto a Bruno de Carvalho: Uma relação admiração/antipatia, por desde o início não gostar da forma como falava, mas sempre de acordo com as ideias que defendia e com o que fazia. Vivi a primeira época completa, a de Leonardo Jardim, com um entusiasmo como há muito não sentia. Ali estava um presidente e um treinador a apostarem finalmente na prata da casa, a fazerem um brilharete com os “miúdos”, a discutirem o título com as equipas dos milhões e detentoras a meias dos “poderes ocultos”. Gostei das medidas para emagrecer os gastos do clube, das iniciativas para recuperar sócios, da ida à UEFA para falar do futebol cá do burgo, das propostas para o futebol português, da “criação” de diversas academias Sporting por esse mundo fora, das escolas Sporting. Tanta, tanta coisa de que gostei. Outras de que não gostei, como o tom do discurso, autoexcluir-se das reuniões da
liga e atacar, em vez de tentar agregar às suas causas, os clubes que não os outros dois grandes. Mais espécie ainda me faz esses ditos clubes continuarem a ser tão subservientes a Benfica e Porto. Não me esqueço de que BdC defendeu a centralização das receitas das transmissões, que só traria vantagens para todos eles e acabaria com a necessidade de serem lacaios dos “sistemas” encarnado e azul. E, erro maior, crasso, CRASSO, ir buscar Jesus.

O Sporting atual, pós-destituição, desilude-me, enfurece-me. E isso porque temos um presidente sem qualquer carisma, declaradamente testa de ferro, ou de lata, vá, que uma pessoa fala em ferro e pensa em algo forte, consistente. E este é tudo menos isso. Irrita-me, pela primeira vez sentir necessidade de atacar um presidente do meu clube. Irrita-me ter-se apresentado como candidato ainda não se sabia se iriam sequer haver eleições. Irrita-me este desprezo evidente pelos sócios. Esta constante tomada de conhecimento dos assuntos do clube através das cofinas desta vida ou de comunicados insípidos, brandos, sem qualquer chama, este “confiar na justiça” e de desistir de processos ou não reclamar de nada por nela confiar. Enfurece-me esta necessidade de “matarem” o ex-presidente. O desprezo, o ódio, o revanchismo em cada declaração que vejo (dele e dos notáveis e menos notáveis que
pululam na CS) em relação ao antecessor, que, quer queiram quer não, apresentou serviço, muito fez pelo clube. E depois temos adeptos/sócios a discutirem entre si, com total desrespeito, um clube completamente partido, que as atitudes dos “superiores” não ajuda nada a “colar”.

3- Qual a tua perspectiva de futuro do clube? Como gostarias que fosse?
Unido. Queria um clube unido como nunca tivemos. Mas com espírito crítico, claro. Queria que as direções dessem voz aos sócios com mais frequência, que auscultassem a sua opinião, que houvessem mais assembleias gerais. Gostava que quem ganhasse eleições não tivesse qualquer problema em aproveitar o que de bom tivesse sido feito pela direção anterior e até que, após as eleições, se reunissem os candidatos derrotados com o vencedor e se aproveitasse o que de bom tivesse sido proposto nas campanhas de cada um, que se aproveitassem as boas soluções de todos. Que o candidato que tivesse uma boa solução e os meios para a concretizar os pusesse à disposição de quem vencesse as eleições. Todos a quererem o melhor para o clube. Todos a darem o melhor pelo CLUBE..

4 – Se fosses candidata quais as principais medidas que aplicavas (Financeiras-Projecto Desportivo -Futebol e Modalidades)? O que achas do sistema eleitoral ? Quais seriam as tuas bandeiras como candidata?
APOSTA REAL NA FORMAÇÃO. Contínua, não só quando não há dinheiro para comprar trutas. Temos um viveiro delas. Teto salarial e prémios individuais e coletivos por objetivos. Essa coisa muito em voga nas transferências de hoje em dia, em que se vende um jogador por 10 milhões + 5 se jogar x jogos + 5 se for chamado à seleção… aplicava aos jogadores do clube. Querem ganhar mais? Façam por isso. Ganham eles e o clube.

Acabar com as comissões. Acho que as comissões deviam ser pagas pelos jogadores. Não me lixem. Nem que os clubes que os adquirem pagassem no ato da assinatura um dado valor ao jogador. Este que acertasse contas com o empresário. Mas o Sporting tem lá alguma coisa a ver com o facto de um dado jogador trabalhar com um agente que cobra 25% ou com um que cobra 5%? Eles escolhem os agentes, eles que arquem com as despesas. Os clubes deviam estar fora disso. Aliás, o futebol já existe há muitos anos, e só de há uns trinta para cá é que se começou a ouvir falar de agentes e comissões e diabo a sete. Se os jogadores tivessem um dedinho de testa, mandavam os agentes dar uma volta. São os jogadores que se valorizam em campo, com o seu trabalho, com o seu empenho, com as suas aptidões. Porque raio há de mais alguém lucrar com isso se não eles próprios e os clubes que lhes dão a oportunidade de se mostrarem? Não percebo. Ultrapassa-me. Bom, bom, seria o desaparecimento de tais figuras. Os agentes.

Gameboxes: mantia, mas com a obrigatoriedade de os detentores avisarem com 48 horas de antecedência que não iriam ao estádio para que outras pessoas pudessem comprar bilhete e ocupar os seus lugares.
Modalidades… é para manter. Está bem como está. Não mexe. Infelizmente, as assistências só serão grandes quando houver jogos importantes. Sempre foi assim, sempre assim será. Somos um país de gente futeboleira, com uns quantos que gostam de facto de ver outras modalidades e muitos mais, como eu, confesso, que gostam de ver na TV e de saber que ganharam jogos ou conquistaram títulos, porque foram vitórias do Sporting, porque contribuem para o engrandecimento do clube. Devia ter vergonha de dizer isto, os atletas das modalidades não o merecem, mas é o que sinto. É o que pratico. Posso dizer que, apesar de ter contribuído para o Pavilhão João Rocha, só lá pus os pés por motivos extrajogos. Peço desculpa aos atletas. A sério.

Um sócio, um voto. É assim que funciona na democracia, era assim que devia funcionar num clube que se diz democrático. Há muito sócio com um ou cinco anos de clube que é mais válido e participativo do que muitos com dez, vinte, cinquenta. A antiguidade é um posto, mas não é sinal de competência ou de clarividência. É que nem regalias para os mais antigos atribuiria. É uma regalia ser sócio do Sporting Clube de Portugal, ponto. Não concebo que alguém seja sócio de um clube por paixão e que exija receber algo em troca. De qualquer das maneiras, há várias parcerias com diversas entidades que dão descontos. Isso já é uma regalia para os que acham que têm direito a compensações. E não sai dos cofres do clube.

5 – O que achas dos denominados notáveis ou ilustres e o que farias em relação às claques?
Notáveis e ilustres empecilhos. Lamento. É só o que me ocorre. Claques: não imagino o clube sem elas. Obrigava era TODOS a serem sócios. Pagariam a mesma quota que o sócio “vulgar” paga, reservando o clube uma percentagem para um
departamento liderado por alguém da estrutura do futebol (o tal de oficial de ligação ao adepto, por exemplo) e os líderes de cada claque. A tal da reserva destinar-se-ia a deslocações, despesas com material de apoio e… pagamento das multas aplicadas ao clube de cada vez que cometessem excessos.

6 – Que medidas aplicarias em relação à melhoria do futebol nacional em todas as suas áreas (arbitragem -ligas -campeonato – mais ou menos clubes, no fundo organização do futebol nacional)?
Negociação dos direitos de transmissão da primeira e segunda divisões pela Liga e distribuição pelos clubes participantes.
Tabela de preços para bilhetes, mediante importância dos jogos.
Nos tempos mais próximos, até a coisa estabilizar, VARs estrangeiros.
Número de clubes: 20. Verdade, 20. Mas com a tal questão da distribuição de verbas por eles. O nosso campeonato só não é mais competitivo porque maior parte dos clubes tem orçamentos muito baixos. E se mesmo assim alguns vão
fazendo os seus brilharetezinhos, o que não seria se pudessem contratar jogadores “jeitosos”, em vez de andarem cá com jogadores emprestados a levantar o pé ou a não “calçarem” quando defrontam as equipas que os emprestam. Isso e não fazerem “favores” nas votações de questões importantes na liga. Consensos, sim, mas consensos no interesse de todo e qualquer um, não com cedências por deferência ao “grande” amigo.

7 – Qual o teu jogo mais marcante como Sportinguista? E qual o teu onze ideal, incluindo um técnico?
Como já disse lá em cima, Salgueiros-Sporting, por tudo o que representou. Não consigo dar um onze ou treinador ideais. Gostei de muitos jogadores, gostei de vários treinadores. Por exemplo, gostei muito de Boloni, de Paulo Bento, de Leonardo Jardim, pelo que conseguiram fazer com equipas com muitos “putos” da formação. Jogadores… eh pá, tantos. Não quero ser injusta..

8 – ana, supõe que estás a falar às massas Sportinguistas num momento importante. Qual seria a tua mensagem?
Olhem para situação do clube no seu todo em vez de para quem o governa, e desconfiem SEMPRE da CS. Reajam na
proporção inversa: se falarem muito bem, desconfiem; se falarem muito mal, defendam. Com unhas, dentes e com o que
quer que seja que tenham à mão e que possa criar mossa. E acima de tudo… SPORTING SEMPRE!

*às sextas, o Sonhador convida um tasqueiro para a mesa do canto e coloca-lhe uma mão cheia e meia de perguntas às quais não vale dizer talvez

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