Posso ser acusado, porventura com alguma dose de realismo, de estar a ser bastante ingénuo ao dizer que referiria perder a acção contra o Atlético de Madrid no TAS (pela rescisão de Gélson) do que ter aceite esta negociata Mendes que ontem foi anunciada. Sinceramente, não gostei de sentir que entrámos no tambor da máquina lavar, não gostei que alguém tivesse apertado o botão do programa de 15 milhões, não gostei de perceber que nem amaciador juntaram à lavagem, tão estúpido foi termos assumido em comunicado que alguém avaliou Vietto em… quanto? Ora…15 milhões.

Detesto o modus operandi de Jorge Mendes. Detesto que seja “parceiro estratégico” no nosso maior rival e sabe se lá o quão estratégico para Vieira e os seus negócios “out of the box”. Detesto olhar para o registo desse empresário e tirar de letra que o Sporting para ele é apenas mais uma plataforma de um enorme entreposto de Wuangs e afins, sacos azuis com pernas que vão cruzando os espaços em branco na fiscalidade europeia. Detesto ainda mais que o nome do meu clube ande associado às suas desventuras e que seja descrito na imprensa como “amigo” ou indivíduo a quem é reconhecido o mérito de “ajudar” ou “colaborar”.

Para um clube que se diz sério, cumpridor e honesto, deixar Mendes passar a porta 10A significa mandar todos esses códigos de ética às malvas e aderir a um enorme clube de “dark force” – que, tenho a certeza, um dia será exposto na praça como um exemplo de bandidagem requintada, não menos – mas mais – condenável e hedionda.

Não é que não entenda o lucro de convidar Mendes para partir bolos e beber espumante. Entendo que este empresário tem acesso a bolsas com muito dinheiro, poder e influência. Entendo que para quem deseja resolver problemas de forma fácil e rápida, Mendes seja uma espécie de “Wolf” em Pulp Fiction. Ele entra, resolve e tu pagas. Mas pagas mesmo bem e com um problema acrescido – ficas na lista, assinas um pacto com a coisa no futebol mais parecida com o diabo. E ninguém vira as costas ou salta fora das brasas deste demónio.

Há nesta questão do acordo por Gelson outra questão que deve ser matéria da reflexão de todos os sportinguista. Fico eu e talvez muitos de vocês, cada vez mais agastado com a desconfiança sobre o papel de Mendes em todo este processo das rescisões. Se no ano passado pareceu o braço que “assegurou” o caminho seguro para muitos empresários arriscarem recomendarem aos seus jogadores a rescisão. Este ano pareceu a mão que ajuda Varandas e Cintra a meter as assinaturas nos acordos de desistência dos processos. Ficção? Talvez, mas todas as peças encaixam tão certinhas, que é a não validação desta teoria que parece o mais desprovido de lógica.

Faço sempre as mesmas perguntas e encontro as mesmas respostas.
Quem lucrou, directamente, mais com as rescisões? Os jogadores e os seus empresários.
Quem lucrou , indirectamente? Os nossos clubes rivais e Jorge Mendes.
Quem definitivamente não lucrou nada? O Sporting

É óbvio que toda a narrativa se submete ao pêndulo da possibilidade de o Sporting perder as acções interpostas no Tribunal suíço. Todas as análises contornam esse factor ou probabilidade como a história navega à volta de momentos de ruptura. Mas eu continua a ter exactamente o mesmo raciocínio que tinha há quase um ano atrás. Os jogadores rescindiram por motivos económicos e não por incapacidade de cumprir a sua atividade profissional. Como se veio a provar aliás, não tiveram qualquer tipo de problemas em fazê-lo. Qual o juiz que não reconhecerá estes factos, não são hipóteses ou cenários, mas factos. E qual o ponto decisório para atribuir a causa às rescisões? Factos, não “sentimentos” ou “desconfianças”, factos.

Compreendo que uma imprensa, incapaz de escrever uma linha que desafie a “dark force” não faça este tipo de análises e repita até à náusea as mesmas novelas repletas de drama e tragédia, fazendo de Alcochete uma espécie de 1755 desportivo. Eu consigo ver para lá dos adjetivos exacerbados e das tragédias de bolso e tudo o que vejo são incidentes graves, violentos e até traumatizantes para alguns (não todos) jogadores. Consigo até ver que foram em grande parte os próprios atletas os primeiros a recusar sarar as feridas e os traumas em família, junto do clube e dos seus adeptos. Consigo ver, no final de todas as contas, que a resposta às agressões que sofreram foi agredir o meu clube através das rescisões.

Continuo, como sempre, a “ler” a incapacidade de todo o futebol em entender-se a si próprio e continuar a remeter os adeptos, para um papel de tristes e ignorantes espectadores de um circo de lucros de terceiros. Mendes é o maior dos palhaços e quem a ele se associa sabe ao que vai e ao que nos fará rir ou chorar no futuro.

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*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca